Um olhar sobre as pesquisas
Elza Fiuza/ Agência Brasil
Uma análise mais detalhada da mais recente pesquisa Datafolha, publicada em outubro, mostra que continua viva a máxima do velho craque Didi: treino é treino e jogo é jogo. Estamos ainda na fase do treino, como mostram informações desta pesquisa. A primeira e mais importante: 66% dos brasileiros não sabem em quem votar ou estão decididos votar em branco ou anular, enquanto 34% declararam ter candidato. Estes dados estão logo no início da pesquisa, quando os pesquisadores mediram a intenção de voto espontânea indagando aos 2.772 entrevistados em quem pretendiam votar para presidente no ano que vem.
Faltando um ano para a eleição, a grande maioria dos brasileiros não está pensando no assunto e isto é normal. Por isso, a pesquisa espontânea, de acordo com especialistas, costuma refletir melhor a realidade das escolhas, certezas e incertezas. Lula tem 18% das menções e Bolsonaro 9%. Isso é bom ou ruim? Muito ou pouco? Para um candidato que disputou cinco eleições, venceu duas, governou o país por oito anos e nunca saiu da mídia, os 18% de Lula não representam tanto. Já os 9% de Bolsonaro representam muito, porque ele sempre foi deputado, não tem a simpatia da grande mídia e tem feito campanha pelas redes sociais e com grupos de voluntários. Ambos representam ainda os extremos desta disputa.
Na parte das perguntas estimuladas, onde Lula aparece com 35% das intenções de voto e os que não votariam ou não sabem são 18%, algumas coisas chamam atenção. A primeira: o Datafolha trabalhou com oito cenários diferentes quando pediu aos eleitores que indicassem em quem votariam. Do universo pesquisado, 70% são brasileiros das classes C, D e E com menor nível de escolaridade e de renda. Isso exige dos pesquisadores muito treino para impedir que o entrevistado comece a responder “no automático”. A segunda: foram feitas 19 perguntas para os eleitores, tornando o questionário longo e cansativo para grande parte dos entrevistados, mas 12 delas não foram divulgadas no relatório final.
A pergunta 19 da pesquisa Datafolha é sobre quais são os aspectos mais importantes que o eleitor leva em conta hora de escolher um candidato. O perfil surgido desta pergunta mostra que os brasileiros querem alguém que nunca tenha se envolvido em casos de corrupção (87%), tenha experiência administrativa (79%) e tenha um passado político conhecido (65%). Estes são os três mais relevantes. Indicam que o eleitorado cansou do mesmo e pretende escolher – ou neste momento sonha escolher – alguém que não tenha relação com a velha política. Querem algo novo, “descontaminado” e o candidato que conseguir encarnar isso vencerá, como aconteceu com Collor em 1989.
Há ainda outro aspecto que não foi captado pela pesquisa Datafolha. O peso das redes sociais na política e sua influência na escolha dos candidatos. O melhor exemplo deste fenômeno é justamente Bolsonaro, que consegue arrancar 9% de intenções espontâneas trabalhando basicamente com as redes sociais. Não se sabe o efeito negativo ou positivo das redes sociais em outras candidaturas como a do próprio Lula. Quem mergulha nos números da pesquisa Datafolha a concluiu que o jogo ainda não começou. Só agora, no último minuto, o Congresso definiu as regras da eleição de 2018 e como as campanhas serão financiadas. Portanto, que ninguém se impressione com os resultados das pesquisas até aqui,, porque revelam mais incertezas do que certezas.
Saúde suprema
Num país onde a saúde pública é sabidamente precária e o atendimento particular escorchante, a mais alta Corte do país, responsável inclusive por julgar abusos do setor privado, vive na redoma de um sistema à prova de sustos: um plano de saúde exclusivo, o STF Med (Plano de Assistência à Saúde e Benefícios Sociais do STF), que possui nada menos que 4,1 mil beneficiários. Um privilégio atípico para os padrões a que se acostumou a viver – e adoecer – o resto da população brasileira. É que, além de garantir a cobertura de todos os ministros, os 11 ativos e os aposentados, o plano estende os benefícios a seus parentes, diretos e indiretos, dependentes econômicos e agregados, além de servidores ativos e inativos do quadro permanente. Mais ocupantes de cargo em comissão, servidores cedidos e aqueles em exercício provisório.
Como se trata de um plano de auto-gestão, a chamada Secretaria de Gestão do STF-Med controla tudo – e não informa, por exemplo, quanto gasta, por mês, em média, cada ministro, “por se tratar de tema relativo à intimidade”. Segundo o STF, o Conselho Deliberativo, presidido pela ministra Rosa Weber, monitora a gestão do plano. É possível saber, no entanto, que entre janeiro e outubro deste ano, o total de despesas dos 11 ministros ativos, 19 ministros inativos e 21 dependentes – portanto, 51 pessoas – somou R$ 400 mil reais. No total, o plano custou, no período, R$ 24,4 milhões. As despesas são tão elevadas que algumas vezes até superam as receitas anuais. Detalhe: o STF-Med não é mantido apenas pelas contribuições dos beneficiários, mas também por dinheiro público. A dependência aos recursos da União é expressiva, em torno de 40% das receitas totais do plano. Os gestores do plano dizem que estão “empreendendo esforços” para conduzir o plano à “dependência cada vez menor dos recursos orçamentários”.
As contribuições são mais do que razoáveis – variam, dependendo da idade, entre R$ 80,63 e R$ 436,37 para titulares e dependentes econômicos. Já entre beneficiários agregados, o valor varia de R$ 341,52 a R$ 1.147,87. Os recursos públicos custeiam despesas médicas e odontológicas realizadas por titulares e dependentes, com pagamentos diretos aos prestadores. Em algumas situações, é feito o ressarcimento das despesas aos servidores.
Têm acesso ao plano ministros em atividade e aposentados, servidores em atividade e aposentados, ocupantes de cargo em comissão sem vínculo efetivo com a Administração Pública, servidores cedidos ao STF e aqueles em exercício provisório no STF, além de pensionistas estatutários. E cônjuges ou companheiros, filhos, enteados, menores tutelados ou sob guarda judicial até 21 anos, pais e mães ou adotantes, bem como padrastos e madrastas e dependentes econômicos do beneficiário titular.
Em favor do STF, reconheça-se que, exceto pelos gastos dos ministros, não divulgados para preservá-los, apesar da função pública, informaram o que lhes foi pedido. O site do STF-Med também não pode ser acusado de pouca transparência. Numa comparação com alguns dos principais planos privados, é generoso em números. Se não é uma caixa preta, pode-se dizer, pelo menos, que o plano merece a vigilância da sociedade, que em sua maioria não conta com os benefícios acoplados a uma repartição pública que, em última instância, existe em função de 11 profissionais da Justiça.
Em 2013, O Globo publicou que o STF inflou a quantidade de beneficiários do plano de saúde do órgão para receber um repasse maior de recursos da União. Entre 2010 e 2013 – quando o STF-Med recebeu R$ 15 milhões por ano da União, em média -, a instância máxima do Judiciário informou à Secretaria de Orçamento Federal (SOF) que o STF-Med tinha entre 6,1 mil e 6,7 mil titulares, dependentes e agregados. Tinha, na verdade, os cerca de 4 mil que tem agora. A informação sobre o número de beneficiários é determinante para a previsão de recursos no Orçamento da União. O número real foi informado para o Orçamento de 2014, mas um acordo entre o STF e a SOF garantiu a mesma previsão de recursos de 2013: R$ 14,5 milhões.
O STF, vale lembrar, é o responsável por coibir abusos dos planos de saúde pagos pelos demais mortais. Até o fim deste mês, a Corte analisará, entre outras, a ação direta de inconstitucionalidade, proposta pela Confederação Nacional de Saúde, para questionar dispositivos da lei que dispõe sobre planos de saúde. O STF, em 2003, estabeleceu que continuam a depender de prévia anuência da Agência Nacional de Saúde (ANS) os reajustes de contratos firmados a partir dessa norma, com redação dada pela medida provisória. Pode rever isso agora. Em outro julgamento se discutirá se é constitucional a cobrança relativa ao ressarcimento pelos planos privados ao Sistema Único de Saúde – SUS, tendo em vista o atendimento prestado pela rede pública aos beneficiários de planos privados. Nada mal. É essencial evitar abusos de quem fatura tanto com a saúde. Resta saber se também não é preciso fazer melhor o dever de casa.
copiado https://osdivergentes.com.br
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