Jornalista Ricardo Kotscho, ex secretário de Imprensa da Presidência da República - Foto Orlando Brito
De fato, o teólogo Leonardo Boff não fez as críticas ao
ex-presidente Lula que andam sendo atribuídas a ele nas redes sociais. O
que Boff fez foi reproduzir em seu blog um artigo
escrito pela jornalista Carla Jimenez na edição brasileira do jornal
espanhol El País. E é ela, Carla, quem faz críticas ao PT e a Lula. É
ela quem escreve, em determinado trecho do seu artigo que “Lula (…),
mais do que os crimes a que responde, feriu de golpe a esquerda do
Brasil. Ajudou a segregá-la, a estigmatizar suas bandeiras sociais e
contribuiu diretamente para o crescimento do que há de pior na direita
brasileira”. Diz mais Carla. Diz que Lula “se embebedou com o poder”.
O artigo de Carla Jimenez não é sobre Lula. Fala de um modo geral
sobre a enxurrada amazônica das delações da Odebrecht e outras na
Operação Lava-Jato que, a essa altura, atingem não apenas o PT mas
praticamente toda a classe política brasileira. Boff compartilhou o
artigo no seu blog por entender que ele era “bem informado sobre a
corrupção que tomou conta das empreiteiras”. Boff não criticava ele
mesmo Lula. Mas como compartilhava o artigo sem fazer observações, levou
muita gente, de boa e de má fé, a compreender que ele endossava as
críticas ao comandante supremo do PT. Leia também: Os que latiam, miam (Ilimar Franco)
Apesar dos reparos posteriores feitos por Boff, é preciso registrar que não é a primeira vez que o teólogo compartilha em
seu blog um texto que critica pelo viés de esquerda aspectos dos
governos petistas. Em outubro de 2016, ele publicou um texto de Frei
Betto, com o título de “Nós erramos”. É um texto que vai na linha de
outros escritos pelo escritor e religioso dominicano Carlos Alberto
Libânio Christo. Frei Betto, nesse artigo e em outros, tem dito que os
governos petistas teriam sido os melhores que o país já teve, pela
promoção social que obtiveram. Mas que erraram por não fazer as reformas
estruturais que tornariam permanentes os avanços sociais que
ofereceram. Não houve reforma agrária, não houve reforma tributária, não
houve reforma da previdência, não houve reforma política. Em diversos
momentos, convocou-se economistas da mesma linha ortodoxa da direita
para conduzir o país, algo que Frei Betto chama de “convocar os
incendiários para apagar o fogo”. Frei Leonardo Boff – Foto Orlando Brito
Semelhante é o artigo
escrito pelo jornalista Ricardo Kotscho, primeiro secretário de
Comunicação de Lula no início do seu primeiro governo. Kotscho não
consegue imaginar onde vai parar o festival de delações da Odebrecht.
Que não vão ficar só na Odebrecht, com as delações das demais
empreiteiras. Que não ficará somente em empreiteiras, mas provavelmente
atingirá empresas de outros setores e outras relações entre
financiadores e financiados, como as do sistema financeiro. “Se alguém
souber o que ainda falta acontecer e onde tudo isso vai parar, por favor
me avise”, escreve Kotscho.
O fato é que o tamanho, amplitude e a contundência das delações na
Operação Lava-Jato começam a levar aos primeiros esboços de autocrítica.
Diante de algo que pega de Aécio Neves a Lula, de José Serra a Paulinho
da Força, de Moreira Franco a Antonio Palocci, do PT ao PP, passando
pelo PMDB, PSDB, etc, chega a ser meio constrangedor o debate em torno
de quem roubou mais ou menos, de quem desviou mais ou menos ou de quem
aparece mais ou menos nos meios de comunicação. Há algo de muito
irregular na forma como os governos, os partidos e os políticos ao longo
da história brasileira – ou pelo menos da da recente história política
brasileira – foram atrás de dinheiro. É disso que se trata. É isso que
precisa mudar. E, nesse sentido, toda autocrítica – mais aguda ou mais
tímida, com idas e vindas ou não – é bem vinda.
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