PCC criou células de inteligência para matar agentes penitenciários federais

A partir da esq., o agente do presídio federal de Catanduvas (PR) Alex Belarmino Almeida Silva, o agente do presídio federal de Mossoró (RN) Henry Charles Gama Filho e a psicóloga Melissa de Almeida Araújo, mortos a mando do PCC

PCC criou células de inteligência para matar agentes penitenciários federais

Flávio Costa
Do UOL, em São Paulo
  • A partir da esq., o agente do presídio federal de Catanduvas (PR) Alex Belarmino Almeida Silva, o agente do presídio federal de Mossoró (RN) Henry Charles Gama Filho e a psicóloga Melissa de Almeida Araújo, mortos a mando do PCC
O PCC (Primeiro Comando da Capital) montou células de inteligência para matar três agentes penitenciários federais. Baseadas inicialmente em São Paulo, Estado de origem da maior facção criminosa do país de acordo com a PF (Polícia Federal), essas células são chamadas de "sintonia restrita" e possuíam uma lista de servidores do sistema penitenciário federal com seus respectivos endereços.
O nome "restrito" vem do fato de que, quando o membro do PCC recebe esta tarefa, fica escalado exclusivamente para ela. São pessoas que, quando participam destas missões, tentam não falar pelo celular, para evitar rastreamento.
"Para obter as informações e alcançar seus objetivos, a facção também conta com uma rede de infiltrados no sistema estatal", afirma um agente da PF.
Esta rede de infiltrados é formada por policiais, funcionários do Poder Executivo e até membros de entidades de direitos humanos
Desbaratar esses grupos tornou-se uma prioridade para os órgãos de segurança pública, apurou o UOL, que entrevistou seis pessoas que atuam no esclarecimento das mortes dos agentes, sob a condição de sigilo.
Para cada assassinato, é criada uma célula específica para executar o plano, informou um membro do MPF (Ministério Público Federal). A atividade é respaldada e gerenciada por líderes da facção que estão detidos em presídios paulistas. 
A sintonia restrita é um grupo criado recentemente pelo PCC, subordinado diretamente à cúpula da facção. Seus integrantes se desvinculam da chamada "sintonia geral" e ficam subordinados à "sintonia geral fora do ar", o que indica que deixaram de exercer as atividades normais do PCC, a exemplo do tráfico de drogas. Eles não precisam pagar a "cebola", a mensalidade obrigatória para membros da facção. "Eles não falam com qualquer um da organização. Por isso é tão difícil localizá-los", afirma uma fonte ligada às investigações.

PF DESARTICULA PLANO PARA MATAR AGENTES FEDERAIS

O que é a sintonia restrita?

"Sintonias" são como chamadas os diversos comandos do PCC.
"A sintonia restrita é um escalão entre a cúpula e os executores. Em geral, os executores falam com a sintonia restrita [para receber ordens]. É quem aparece como mandante nas investigações, pela dificuldade de se chegar aos líderes", afirma o membro do MPF.
A sintonia 'restrita' é, digamos, uma área de inteligência
Membro do MPF ouvido pela reportagem
O assassinato de um servidor público, quando decidido pela cúpula do PCC, é considerado como "uma missão para aqueles que foram escolhidos a executar". O membro da facção é afastado de outras atividades criminosas até que esta missão esteja cumprida.
Além de São Paulo, há sintonias restritas em Paraná e no Ceará, apurou a reportagem.
Um dos papéis deste grupo é analisar e indicar os alvos mais fáceis de serem alcançados, através de um acompanhamento da rotina dos agentes
Agente da PF ouvido pela reportagem
"Cabe ao grupo também organizar toda a logística do atentado, como alugar casas na região em que será cometido o crime e estabelecer rotas de fugas", diz um funcionário federal.
Durante os preparativos para a morte de um dos agentes penitenciários federais, um dos membros da sintonia restrita conseguiu acesso direto às informações de caráter reservado às forças da segurança pública, por meio de uma senha de um funcionário público. "Ele entrou no sistema da polícia para checar placas de carros e outras informações", disse outra fonte ligada às investigações.
Além de levantamento de endereços de agentes, os membros responsáveis pelo planejamento das mortes tentaram se aproximar de seus alvos, em pelo menos uma ocasião. "Antes da primeira morte, eles alugaram uma casa ao lado de outro agente e chegaram a conversar com ele, tentando uma aproximação. Esse agente só não foi morto porque viajou na época em que o crime seria cometido", acrescenta.
O Gaeco do MP paulista (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado do Ministério Público de São Paulo) deflagrou em dezembro passado uma operação que prendeu quatro membros do PCC que formavam uma dessas células de inteligência. Essa sintonia tinha como alvo policiais militares e civis, bem como agentes penitenciários do Estado de São Paulo. 

PCC quer intimidar e desestabilizar

UOL revelou no último dia 30 de junho que o PCC cometeu os homicídios, de acordo com parecer do MPF no Paraná, com o objetivo de "intimidar e desestabilizar" os servidores que trabalham nas quatro unidades federais do país: Catanduvas (PR), Campo Grande (MS), Mossoró (RN) e Porto Velho (RO).

AGENTE ALEX BELARMINO FOI MORTO EM SETEMBRO DE 2016

O parecer do MPF afirma ainda que o regime aplicado nestas penitenciárias é considerado "opressor" pelo PCC, pois os agentes costumam barrar o acesso dos presos dessas unidades a "regalias ilícitas", como a posse de telefones celulares dentro das celas.
Os três agentes foram mortos a tiros em ações da facção que demandaram meses de preparação:

Operação Força e União

No último dia 19 de julho, a PF prendeu duas pessoas como resultado da Operação Força e União, deflagrada em resposta ao assassinato do agente Henry Charles. Segundo a PF, os dois suspeitos presos, um em Mossoró e outro em Presidente Prudente (SP), atuavam como informantes da cúpula do PCC e estavam envolvidos na execução de agentes penitenciários federais ordenada pela facção.
Outros dois detentos da penitenciária estadual de Presidente Venceslau, em São Paulo, também foram alvos de mandados de prisão. Eles seriam responsáveis por chefiar o planejamento da morte do agente.
Divulgação/Folhapress
Cúpula do PCC, de acordo em documento do Ministério Público de São Paulo

Soriano, o Tiriça

A respeito do homicídio de Alex Belarmino, já tramita uma ação penal na 4ª Vara Federal de Cascavel (PR), onde são acusadas 15 pessoas pelos crimes de homicídio qualificado e formação de organização criminosa. Procuradores da República responsáveis pela denúncia chegaram a discutir a possibilidade de acusá-los também com base na Lei de Antiterrorismo 13.260/2016.
UOL revelou que durante o planejamento do assassinato de Belarmino, o PCC alugou uma casa vizinha ao agente para executar o plano de assassiná-lo.
A PF descobriu que a ordem para o assassinato foi dada pelo então detento de Catanduvas Roberto Soriano, conhecido no mundo do crime, entre outros apelidos, por "Tiriça". A defesa do detento nega que ele tenha participação no crime.
Ele é membro da "sintonia final geral", nome dado à cúpula do PCC, formada por oito pessoas, sob a liderança de Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola --o chefe maior do PCC cumpre pena no presídio de segurança máxima de Presidente Bernardes (SP), administrado pelo governo de SP.
Divulgação/SSP-SP
Roberto Soriano, conhecido como "Tiriça", um dos chefes do PCC
"Roberto Soriano é o integrante de maior hierarquia da organização criminosa PCC envolvido no caso e se encontra recolhido no Sistema Penitenciário Federal, tendo funcionado como mandante do crime", lê-se na denúncia do MPF.
As investigações apontam que Tiriça utilizou-se de visitas íntimas a outros presos para repassar suas ordens a membros do PCC.
Após a morte de Belarmino, Tiriça foi transferido para o presídio de Porto Velho (RO), onde chegou a ameaçar um dos agentes, durante uma discussão no horário de almoço. "Se me tratarem bem, eu trato bem, se me tratarem mal, também vou tratar mal", disse Tiriça.
Tiriça foi colocado no RDD (Regime Disciplinar Diferenciado), a mais rigorosa sanção aplicada dentro das penitenciárias

Protesto de agentes

Desde o dia 29 de maio, quatro dias após o assassinato de Melissa, o Depen (Departamento Penitenciário Nacional), órgão do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, suspendeu nas unidades federais as visitas íntimas e sociais, quando há contato físico entre os presos e seus visitantes.
Divulgação
Agentes protestam contra mortes de colegas em presídio federal de Catanduvas (PR)
Na quinta-feira passada (20), agentes penitenciários federais homenagearam os colegas mortos em protestos realizados nos quatros presídios federais do país e em Brasília, onde fica a sede do Depen. Eles defendem que as visitas íntimas sejam proibidas de maneira permanente, pois líderes das facções estariam passando ordens por meio desse contato.
A medida de suspensão das visitas íntimas e sociais vale até o dia 28 de julho. Na manhã de sexta-feira (21), mulheres e filhos de presos protestaram em Catanduvas pelo direito às visitas íntimas e sociais.
"Estamos lutando uma guerra assimétrica. As facções estão agindo de maneira semelhante às organizações terroristas", disse o presidente do sindicato dos agentes penitenciários federais no Paraná, Carlos Augusto Machado.

VÍDEO DO DEPEN HOMENAGEIA AGENTE MELISSA ALMEIDA

Um dos objetivos da criação de presídios federais é o de isolar líderes das facções criminosas e diminuir seu poder de influência nos sistemas penitenciários de origem. Dados do Depen revelam que, atualmente, 570 pessoas estão presas nas quatro penitenciárias federais que oferecem um total de 832 vagas.
Com 161 integrantes detidos nestas unidades prisionais, o PCC é a facção criminosa com mais presos no sistema penitenciário federal. O número corresponde a 28,24% do total de detidos. Em seguida, aparece o Comando Vermelho, com 105 integrantes presos (18,42%), e, em terceiro lugar, está a FDN (Família do Norte), com 40 integrantes presos (7%).
copiado https://noticias.uol.com.br/

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