AFP / Anella RETA, Gustavo IZUSInfográfico sobre os protagonistas da crise política na Venezuela
Em seu momento mais decadente depois de dominar a política venezuelana por 18 anos, o chavismo busca um salva-vidas, segundo analistas, ao tentar mudar a Constituição para governar sem limites.
Protestos para tirá-lo do poder que deixam 113 mortos, uma economia devastada, sanções dos Estados Unidos, sua popularidade no chão: com a tempestade perfeita, o presidente Nicolás Maduro joga a sua melhor carta, a Assembleia Constituinte.
O que pretende? Como pode impactar na crise?
- A decadência -
Sem a liderança e os dólares do petróleo nos quais o seu antecessor, Hugo Chávez, mergulhou, Maduro governa em convulsão desde que assumiu em 2013.
Um setor opositor questionou a sua vitória e o preço do petróleo caiu mais de 50%, em um país historicamente dependente da renda petroleira e das importações.
Após uma onda de protestos em 2014 que deixou 43 mortos, a crise se acelerou em 2015 com a escassez de alimentos e remédios e a vitória esmagadora da oposição nas parlamentares, que acabou com a hegemonia chavista.
Essa virada desatou um confronto de poderes no qual o Legislativo ficou de mãos atadas pelo Poder Judiciário -acusado de servir ao governo- com sentenças que desencadearam as manifestações atuais.
A aprovação de Maduro chega a somente 20,8%, segundo a empresa Datanálisis, distante dos 71,5% alcançados por Chávez em 2006, no ponto alto de uma popularidade baseada na distribuição da renda do petróleo, bonança manchada pela corrupção.
- Salva-vidas -
Maduro culpa a oposição de se unir aos Estados Unidos para asfixiar o país com violência e uma "guerra econômica", e, assim, derrubá-lo.
Com essa tese e a promessa de paz e de estabilidade econômica, justifica a Constituinte.
Essa Assembleia será eleita no domingo sem candidatos da oposição, que a considera uma "fraude" e exige eleições gerais.
A iniciativa é rechaçada por 70% dos venezuelanos, segundo a Datanálisis.
Seria o "seu salva-vidas para evitar uma eleição que perderia e para governar sem os limites que envolvem ter instituições autônomas" como o Parlamento ou o Ministério Público, disse o analista Beningno Alarcón.
As presidenciais devem ser realizadas em 2018, mas a oposição teme que a Constituinte, ao ser um "suprapoder", mude as regras.
"Isso foi montado para se manter no poder. O chavismo é um fenômeno sectário que não admite competição", assinalou o cientista político Luis Salamanca.
Apesar do retrocesso, este especialista considera que o governo ainda tem "importantes parcelas".
Maduro conta com o apoio dos militares, sua principal sustentação e a quem deu grande poder político e econômico. Sua influência se estende à Justiça e ao Poder Eleitoral, fundamental nesta conjuntura, afirma a oposição.
- Carta de negociação -
O presidente socialista também pretenderia melhorar a sua prejudicada capacidade de negociação, quando for instalada a Constituinte na próxima quarta-feira.
"Não descarto que o governo queira aproveitar este projeto autocrático tão extremo para negociar melhores termos de saída à crise", comentou Michael Shifter, presidente do Diálogo Interamericano, com sede em Washington.
Governo e oposição realizaram no fim de 2016 um diálogo frustrado promovido pelo Vaticano.
Maduro se diz disposto a dialogar, mas seus oponentes afirmam que qualquer negociação deve ter as eleições antecipadas como ponto de partida.
"A Constituinte é uma carta de força política. Após a sua instalação, pode ser que o governo comece a negociar", indicou a psicóloga social Colette Capriles.
- Futuro incerto -
A dissidência chavista, que cresceu com a convocação à Constituinte, assegura que é um projeto ilegal e uma traição ao fundador da "revolução bolivariana", que promulgou a atual Carta Magna.
"É a segunda morte de Chávez", assinalou o ex-ministro Héctor Navarro, que reprova Maduro não ter consultado em referendo o chamado à Constituinte.
Benigno Alarcón aponta para "grandes conflitos internos", que poderiam fissurar mais o governo.
Entretanto, "será muito difícil sepultar o chavismo, por isso esclarecemos", sustenta Ana Elisa Osorio, outra ex-ministra de Chávez.
A extrema verticalidade é vista como uma ameaça a mais pelo deputado Germán Ferrer, marido da procuradora-geral Luisa Ortega, ambos dissidentes. O partido de situação, declara, é hoje "uma estrutura militar onde as linhas políticas são ordens".
Shifter assegura que a "revolução bolivariana acabou", pois sempre dependeu dos altos preços do petróleo sem desenvolver uma estrutura produtiva que a sustentasse em longo prazo.
"A Constituinte é a expressão política radical de um fracasso econômico total", afirma.
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