Brasil polarizado: o que pensam os eleitores de Bolsonaro e Haddad?. Três décadas da vitória do 'não' no Chile, quando a 'alegria' derrotou Pinochet.

Brasil polarizado: o que pensam os eleitores de Bolsonaro e Haddad?

AFP / Miguel SCHINCARIOL
O Brasil viverá neste domingo as eleições mais polarizadas das últimas décadas, entre o deputado de extrema direita Jair Bolsonaro e o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, indicado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT, esquerda).
O que pensam aqueles que votam em um nostálgico da ditadura (1964-1985), do porte de armas e da "família tradicional"?
E aqueles que preferem Haddad, cuja referência é a era Lula (2003-2010), quando uma economia dinâmica permitiu promover programas de distribuição de renda que tiraram milhões de pessoas da pobreza extrema?
Lula cumpre desde abril uma pena de 12 anos e um mês de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro. O líder, que era favorito nas pesquisas, afirma inocência e denuncia uma conspiração para impedir que a esquerda retorne ao poder.
A AFP conversou com os eleitores de ambos os lados e estes são seus testemunhos.
- Bolsonaro: Deus, segurança, 'antichavismo' -
"Eu acredito que o salvador da pátria é Deus. Não é que [Bolsonaro] seja o salvador da pátria, mas acho que ele é a pessoa melhor encaminhada, a pessoa mais correta para liderar o nosso país, porque é uma pessoa rígida. Neste momento, precisamos de uma pessoa que tenha atitudes radicais.
Eu apoio Bolsonaro porque ele é a favor de castrar os estupradores, de militarizar as escolas, de que o os professores sejam respeitados e de não ser atacado dentro da sala de aula".
- Carlos Alberto da Silva, 50 anos, motorista de táxi no Rio de Janeiro
"Os brasileiros realmente estão cansados dessa violência e eu, como policial militar, sei muito bem disso. São incontáveis as perdas aqui no estado (do Rio de Janeiro). Perdi as contas de quantos enterros eu fui, de amigos, de colegas".
- Ericky Tostes, subtenente da Polícia Militar do estado do Rio de Janeiro
"Eu acredito que ele veio para somar, não para dividir. Quer governar o país de maneira que tenha um pouco mais de decência, um pouco mais de transparência, e eu acredito que ele vai conseguir".
- Mônica Mantelli, 46 anos, advogada em São Paulo
"Se você for analizar os políticos atuais, só resta o Bolsonaro. Para você ter uma ideia, o Lula, em quem sempre votei, hoje tem um discurso chavista, um discurso alinhado com nossos vizinhos (venezuelanos) que acabaram se dando muito mal com a situação política, e o Lula apoia totalmente".
- Marcelino Oliveira Pontes, 46 anos, vendedor de eletrônicos em uma feira no estado de Roraima
- Haddad... é Lula! -
"Para mim e para os estudantes que, como eu, entraram em programas sociais que nos deram acesso à universidade, os oito anos do governo Lula foram os melhores na história do país".
- Artur Sampaio, 25 anos, estudante de Políticas Públicas para o desenvolvimento econômico e social do Rio de Janeiro
"As pessoas das classes média e baixa não tinham condições de vida. Vivíamos de restos e fomos reconhecidos como cidadãos. Pudemos estudar, ter um emprego, se aposentar".
- Malvina Joana de Lima, aposentada
AFP / Arthur de Souza (22 set) Ato eleitoral de Haddad no centro do Recife
"Agora temos (à frente) um processo de reconstrução do país, porque estes dois anos de golpe [impeachment de Dilma Rousseff e do governo de Michel Temer] causaram estragos, transformaram o país em uma terra arrasada, pior do que quando Lula chegou à presidência".
- João Martins, 53 anos, funcionário público do interior de São Paulo
"Lula foi condenado, mas não havia provas contra ele, eu o considero um prisioneiro político".
- Mônica, 49 anos, assistente administrativa

Três décadas da vitória do 'não' no Chile, quando a 'alegria' derrotou Pinochet

AFP / Martin BERNETTI Cartaz da campanha do plebiscito de 1988 contra o ditador chileno Augusto Pinochet, exposto na loja do Museu da Memória de Santiago, em 3 de outubro de 2018
Há 30 anos, os chilenos disseram "não" à ditadura de Augusto Pinochet. Em 5 de outubro de 1988, após uma ousada campanha que apostou no otimismo para vencer o medo, os chilenos votaram contra o ditador, abrindo as portas para a democracia no país.
No papel, a decisão parecia simples. O "sim" significava estender a ditadura por mais oito anos, enquanto o "não" liberava o caminho para a eleição presidencial um ano depois.
Pinochet chegou ao referendo, convocado por ele mesmo e que estava previsto na Constituição promulgada em 1980 em meio a denúncias de fraude, com uma crescente pressão internacional e o desgaste de 15 anos no poder. Nesse período, espalhou o terror, com assassinato e desaparecimento de opositores e uma censura ferrenha.
Não era fácil para a oposição - reunida em uma extensa Concertação de partidos políticos - abordar os temores da população. Diante de uma arriscada campanha, porém, decidiu apostar na alegria e na esperança por um futuro melhor sem Pinochet.
"Chile, a alegria já vem..." foi o principal slogan de uma campanha pioneira em política e que ainda é estudada em escolas de publicidade por sua audácia.
No mês anterior à votação, a peça publicitária foi transmitida todos os dias antes do principal telejornal no horário de propaganda eleitoral com 15 minutos para cada lado.
"Foi muito acertado da parte da equipe de criação pôr o que vinha como positivo, que o que vinha era melhor", lembra à AFP Cristian Dupré, um dos que se animaram a atuar nos curtos spots publicitários do "não".
Com humor, música e dança, a mensagem superou uma propaganda rival que continuava apostando no medo, com grosseiras encenações de atentados explosivos e outros atos de violência.
Colocar o rosto diante das câmeras, desafiando Pinochet, era, porém, um grande risco.
"Como ia sair na televisão, se tinham matado gente por muito menos? Mas não pude me negar a protagonizar algo que podia pôr fim a uma ditadura criminosa", disse Patricio Bolaños, locutor e principal rosto da campanha, em recente entrevista ao jornal "La Tercera".
Dupré, militante de esquerda, admite que recebeu ameaças, mas que foram compensadas pelo apoio da população.
"Me estimulavam muito. Me protegiam nas ruas", relata.
- Códigos publicitários –
Dar todo o mérito da vitória à propaganda seria um erro, assim como desconhecer seu valor.
"A vitória se deveu a todas essas pessoas que se opuseram à ditadura, a todo o trabalho de resistência, aos movimentos de trabalhadores, estudantes, mulheres, às pessoas que enfrentaram os tanques (…) Tudo isso foi um motor que permitiu a vitória do 'não'", disse à AFP o produtor de televisão Juan Forch, que trabalhava para a oposição.
AFP / Martin BERNETTI Lembranças da campanha de 1988 pelo 'não' à ditadura de Pinochet, no Museu da Memória em Santiago, em 3 de outubro de 2018
O produtor lembra a emoção que sentiu quando o primeiro programa foi ao ar. Para dezenas de produtores audiovisuais e artistas que trabalharam sem receber, era a coroação de anos de censura, durante os quais, para sobreviverem, foram se entrincheirar em agências de publicidade.
Escritores, poetas e diretores tiveram de aprender na marra o ofício de fazer pequenas mensagens muito efetivas. Foi esse nicho, para o qual Pinochet os empurrou, que colaborou para poder derrubá-lo, analisa o produtor.
Nem o comando político, nem os demais participantes da campanha tinham um plano B. Perder não era uma opção.
No dia do plebiscito as pessoas venceram o medo, e os centros de votação lotaram. As horas seguintes ao fechamento das urnas foram vividas como uma via-crúcis. As primeiras informações oficiais davam uma clara vantagem para o "sim", ainda que as pesquisas realizadas pelo comando opositor previssem a derrota do ditador.
As horas passavam, e Pinochet brilhava por sua ausência. A apuração oficial demorava, enquanto a televisão transmitia desenhos animados. A tensa espera terminou apenas de madrugada. Diante dos jornalistas na entrada do Palácio de Governo, um membro da junta militar, o comandante da Força Aérea, Fernando Matthei, reconheceu que o "não" havia vencido.
De acordo com os números oficiais, o "não" venceu por 56%.
- Resistência pinochetista -
Um ano depois, foi realizada a eleição presidencial e, em 11 de março de 1990, o democrata-cristão Patricio Aylwin assumiu o poder. Pinochet ainda se manteve por mais oito anos à frente do Exército, de onde continuou demonstrando sua força, ao levar os tanques várias vezes às ruas.
Depois de deixar o Exército, assumiu como senador vitalício e, finalmente, faleceu em 2006, aos 91 anos, encurralado pela Justiça. Nunca foi condenado, porém, por nenhuma das mais de 3.200 vítimas de seu regime, entre mortos e desaparecidos.
Seis governos democráticos se passaram desde o fim da ditadura chilena.
"O que se avançou foi muita coisa, embora haja uma tarefa pendente (…) A alegria não chega, ainda está pendente", reflete Forch.

 copiado  https://www.afp.com/pt

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Postagem em destaque

Ao Planalto, deputados criticam proposta de Guedes e veem drible no teto com mudança no Fundeb Governo quer que parte do aumento na participação da União no Fundeb seja destinada à transferência direta de renda para famílias pobres

Para ajudar a educação, Políticos e quem recebe salários altos irão doar 30% do soldo que recebem mensalmente, até o Governo Federal ter f...