Após derrotas em série e um pé no Supremo, Moro tenta salvar sua principal bandeira
Avanço do pacote anticrime, hoje parado na Câmara, é considerado um fôlego para ministro
Após sucessivas derrotas, a mais recente envolvendo o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), o ministro Sergio Moro (Justiça) intensificou a agenda política para tentar acelerar a tramitação no Congresso daquela que é considerada sua principal iniciativa, o pacote anticrime.
Na manhã de quinta-feira (16), Moro foi à residência oficial do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para pedir o apoio do parlamentar ao avanço do projeto na Casa.
Alvo da resistência de vários políticos por personificar a Lava Jato, a operação que dizimou integrantes de diversas legendas nos últimos anos, o ex-juiz federal tem buscado auxílio de Maia para tentar vencer esses obstáculos.
O ministro chegou à casa do presidente da Câmara, no Lago Sul de Brasília, no momento em que dezenas de deputados, grande parte de partidos do chamado centrão, discutiam com Maia a agenda de votações desta semana.
A conversa girava em torno da votação da medida provisória da reestruturação do governo. Eles defendiam que Maia só colocasse o texto em votação no plenário se o Palácio do Planalto e seus aliados não forçarem a derrubada do trecho que tira o Coaf das mãos de Moro.
O ministro cumprimentou os deputados —muitos deles protagonistas da batalha para transferir o órgão para o guarda-chuva de Paulo Guedes (Economia)— e seguiu com Maia para uma ala reservada.
A conversa não durou mais do que 15 minutos. Entre outros pontos, o ministro queria saber se havia disposição na Câmara para suprimir uma das etapas de tramitação da proposta —o que levaria o texto mais rapidamente ao plenário.
Ouviu que tudo depende de diálogo com os partidos e da convergência do grupo de trabalho que analisa o projeto.
O centrão é um grupo informal de partidos formado por DEM, PSD, PTB, PP, PR, entre outros, e liderou a derrota aplicada ao ministro.
Tendo vários filiados implicados nas investigações da Lava Jato, esse partidos resistem a dar mais poder a Moro. E são refratários também a muitas das propostas do pacote anticrime do ministro. Para vários desses parlamentares, o ex-juiz representa a ponta de lança do movimento que nos últimos anos buscou, segundo eles, criminalizar a política.
Embora aliados do presidente da Câmara afirmem que Maia e Moro superaram os atritos e hoje mantêm bom diálogo, o avanço do pacote na Casa depende da disposição do ministro em abrir mão de trechos considerados polêmicos pelos parlamentares.
Moro já foi avisado de que, se quiser ver seu pacote avançar, terá que abrir mão do trecho que trata da prisão em segunda instância. Parlamentares dizem que, como a discussão está no STF (Supremo Tribunal Federal), não faz sentido o Congresso debatê-la agora.
O ministro também foi alertado por um senador alinhado à sua agenda que o açodamento tende a ser útil à ala do Congresso que trabalha para desidratar o pacote.
Esse mesmo político lembrou que a desarticulação do governo e a falta de amparo do Planalto também pesam contra a agenda do ex-juiz.
Moro tem dito que, se dependesse de sua vontade, a proposta seria aprovada pelo Congresso ainda neste semestre. Mas, apesar de já admitir que a política tem seu próprio ritmo, o ministro escalou auxiliares para pedir apoio de parlamentares.
A estratégia, por enquanto, é buscar deputados e senadores que trabalharam para manter o Coaf com Moro.
Segundo aliados do ministro, o avanço do projeto que altera a legislação criminal é um fôlego para Moro permanecer no governo.
De acordo com os relatos, o ex-juiz já teria pensado em renunciar ao cargo mais de uma vez. Uma delas teria sido em meio ao desgaste na batalha do Coaf. O aceno do presidente Jair Bolsonaro com a possibilidade de indicá-lo a uma vaga no STF teria sido um gesto para acalmar o aliado.
A manobra, no entanto, teve o efeito contrário. Reavivou a polêmica sobre os termos do convite de Bolsonaro ao ex-juiz da Lava Jato.
No Congresso e no Judiciário, a declaração do presidente de que havia firmado compromisso para indicar Moro ao Supremo passou a ser tratada como moeda de troca.
A fala de Bolsonaro expôs Moro a um desgaste antecipado no Congresso, já que a indicação do presidente para o Supremo precisa ser aprovada pelo Senado.
Em entrevista à GloboNews, na última semana, Moro afirmou que jamais estabeleceu a vaga no Supremo como condição para aceitar o posto de ministro. “Eu acho que o presidente, tendo em vista essa situação, se sentiu com esse compromisso de oferecer essa vaga quando surgir no futuro.”
Até apoiadores de Bolsonaro criticaram o gesto. Disseram que o presidente, que tem dado tiros no próprio pé, dessa vez acertou o aliado.
Na quinta-feira, voltou atrás e disse que não houve nenhum acordocom o ministro da Justiça para que ele assumisse uma vaga no STF.
“Quem me acompanhou ao longo de quatro anos, sabe que eu falava que precisamos de alguém no Supremo com o perfil de Moro. Não teve nenhum acordo, nada, ninguém nunca me viu com Moro [antes da eleição]”, afirmou o presidente durante transmissão ao vivo em suas redes sociais.
O convite formal de Bolsonaro a Moro foi feito em 1º de novembro de 2018, quando eles se encontraram pela primeira vez, no Rio de Janeiro.
Aliados do presidente afirmam que, durante a conversa, o então candidato fez um aceno a Moro sobre a possibilidade de indicá-lo a uma vaga no Supremo caso ele aceitasse fazer parte de seu governo.
Quem participou do encontro disse que a fala de Bolsonaro foi “apenas mais um atrativo” para convencer Moro.
O juiz federal abandonou 22 anos de magistratura e, agora, completa seus primeiros meses como político. Alguns de seus novos colegas dizem ver ainda muita ingenuidade e falta de visão geral de como funciona Brasília.
Procurado, Moro não quis falar com a reportagem.
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