Ao responder a Bachelet, Bolsonaro canta as glórias de um regime homicida O presidente Jair Bolsonaro atacou nesta quarta (4) o pai de Michelle Bachelet, alta comissária da ONU para direitos humanos e ex-presidente do Chile. Ele foi morto pela ditadura militar de Augusto Pinochet. A crítica veio após Bachelet dizer em uma entrevista que o Brasil sofre uma "redução do espaço democrático", especialmente com ataques contra defensores da natureza e dos direitos humanos.

Alberto Bachelet, pai de Michelle: Bolsonaro canta as glórias do regime que o torturou e matou (Foto: Foto: Museu de la Memória (Argentina) / BBC News Brasil)
Reinaldo Azevedo
04/09/2019 17h12
Ao responder a Bachelet, Bolsonaro canta as glórias de um regime homicida
O presidente Jair Bolsonaro está se especializando no chamado "argumentum ad hominem", o estratagema nº 16 apontando por Schopenhauer no livro "Como Vencer um Debate sem Precisar Ter Razão". Ele lista 38 táticas para isso. Há uma edição brasileira com introdução e notas de Olavo de Carvalho, o ministro espiritual do governo.
O "argumentum ad hominem" consiste no ataque pessoal àquele que se tem como oponente, ignorando o objeto da eventual dissensão. É uma tática para distrair a atenção do público para, então, recorrer ao estratagema nº 14, que é "proclamar vitória". Leio na Folha:
O presidente Jair Bolsonaro atacou nesta quarta (4) o pai de Michelle Bachelet, alta comissária da ONU para direitos humanos e ex-presidente do Chile. Ele foi morto pela ditadura militar de Augusto Pinochet.
A crítica veio após Bachelet dizer em uma entrevista que o Brasil sofre uma "redução do espaço democrático", especialmente com ataques contra defensores da natureza e dos direitos humanos.
"Michelle Bachelet, seguindo a linha do [presidente francês Emmanuel] Macron em se intrometer nos assuntos internos e na soberania brasileira, investe contra o Brasil na agenda de direitos humanos (de bandidos), atacando nossos valorosos policiais civis e militares", escreveu o presidente em uma rede social.
"Diz ainda que o Brasil perde espaço democrático, mas se esquece que seu país só não é uma Cuba graças aos que tiveram a coragem de dar um basta à esquerda em 1973, entre esses comunistas o seu pai brigadeiro à época", prosseguiu Bolsonaro, que publicou também uma foto de Bachelet, quando presidente, ao lado das ex-presidentes Dilma Rousseff (Brasil) e Cristina Kirchner (Argentina).
Alberto Bachelet, pai de Michelle, era general de brigada da Força Aérea e se opôs ao golpe militar dado por Augusto Pinochet em setembro de 1973. Ele foi preso e torturado pelo regime e morreu sob custódia, em fevereiro de 1974.
A própria ex-presidente também foi presa e torturada por agentes de Pinochet em 1975.
Na manhã desta quarta-feira, ao sair do Palácio da Alvorada para cumprir uma agenda em Anápolis (GO), Bolsonaro voltou a criticar Bachelet e a atacar seu pai.
O presidente disse que a alta comissária da ONU "defende direitos humanos de vagabundos". "[Michelle Bachelet] está acusando que eu não estou punindo policiais, que estão matando muita gente no Brasil. Essa é acusação dela. Ela está defendendo direitos humanos de vagabundos", afirmou.
"Senhora Michelle Bachelet, se não fosse o pessoal do Pinochet derrotar a esquerda em 1973, entre eles o teu pai, hoje o Chile seria uma Cuba. Eu acho que não preciso falar mais nada para ela. Quando tem gente que não tem o que fazer, vai lá para a cadeira de Direitos Humanos da ONU"acrescentou o presidente.
RETOMO
Mais uma "lacrada" para a sua turma na Internet.
Se o presidente do país acha que uma comissária da ONU — organização cuja natureza é mesmo ser multilateral, com abrangência mundial — opera com dados equivocados, que explicite seus motivos. A fala de uma comissária da ONU não é a voz de Deus.
O problema está na história que Bolsonaro evoca como exemplar, nos termos a que recorre, nos valores. O pai de Michelle, um militar de alta patente, nem esquerdista era. Ainda que fosse, não poderia ter o destino que teve: morreu sob tortura, na prisão — tortura de que a filha, depois, viria a ser vítima.
Isso diz um tanto sobre o regime de Pinochet, responsável pela morte ou desparecimento de pelo menos três mil pessoas.
Para se ter uma ideia da brutalidade do regime: trazendo os dados a números presentes, considerando os 18 milhões de chilenos e os 210 milhões de brasileiros, seria como se a ditadura brasileira, que responde pela morte ou desaparecimento de 434 pessoas, tivesse eliminado 35.000 indivíduos. Em padrões argentinos, teriam sido 140 mil.
O que o Brasil ganha com essa fala de Bolsonaro? Nada! Como país, descemos um pouco mais na escala da decência e do respeito aos direitos humanos.
A fala de governantes tem a força do exemplo. O consolo, se é que se pode falar assim, é saber que é crescente a repulsa a falas como essa, o que não quer dizer, e aqui vai o dado melancólico, que não contem com milhões de admiradores, ainda que componham uma minoria.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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