Jornalismo é chamar as coisas pelo nome que as coisas têm
Lição básica do jornalismo é chamar as coisas pelo nome que as coisas têm.
Residência é casa ou apartamento; hospital não é nosocômio, morrer não é “passamento” nem falecer.
O Le Monde deste domingo, que já está nas bancas francesas , pratica um jornalismo que os jornais brasileiros não têm coragem de praticar.
“A extrema-direita chega ao poder”, manchete de “fora a fora”, ou de oito colunas, no tempo que os jornais as tinham como medida.
Não porque brasileiros considerem a expressão “ultrapassada”, antijornalística: a usariam se fosse Marine Le Pen quem estivesse assumindo a presidência da França.
Mas o vento que venta cá não pode ter o nome do que ameaçou ventar por lá.
O jornalismo, se é que conserva este nome, passou a ser por aqui a arte do não dizer, do esticar, puxar, endurecer ou amaciar, conforme o freguês.
Sim, é isso, em uma linha: a extrema direita chega ao poder no Brasil.
Talvez ainda de forma provisória, com limitações formais – e cada vez menos – do estado de direito, com um personagem tosco, caricato ante ao mundo.
Mas quem deixa de ver que outro, mais sofisticado, está se articulando, vindo de Curitiba?
A luta pelo poder não está no horizonte da esquerda, mas entre as personagens desta tragédia nacional.
Entre outras razões, porque o jornalismo brasileiro, faz tempo, deixou de tratar as coisas pelo nome que as coisas têm.
Dr. Moro, o senhor exibiria este vídeo de seu chefe?
Josias de Souza, no UOL, chama a atenção para o vídeo que – ontem, dois antes da posse do pai como Presidente – o filho “02”, Carlos Bolsonaro, orgulhosamente distribui pelo Twitter.
Como o próprio Jair Bolsonaro diz que o filho é a sua voz nas mídias, é o próprio quem faz questão de mostrar-se.
Nem mesmo, fazendo como fazem os gatos, enterrando estes “momentos edificantes” de quem, depois de amanhã, estará com a faixa presidencial.
Portanto, sugere-se que o Dr. Sérgio Moro, na próxima palestra em que vá se exibir em Harvard, promova uma sessão para a platéia. Já está até legendado, para correr mundo.
Quem sabe os juristas de todo o mundo aplaudam o “direitos humanos é o cacete”… Ou o “vá queimar sua rosca”…Ou tem de “matar 200 mil vagabundos”…
Não foi ninguém da “esquerdalha”, como diz o filhote do ex-capitão, que está propagando isso e, se o faz, é porque esse é o seu, digamos assim, pensamento.
Quem sabe o exibam num telão, no plenário da Assembleia Geral da ONU, que a Bolsonaro, seguindo a tradição, caberá abrir?
Sugira a ele isso, Dr. Moro.
E aproveite e mostre para seus filhos, para mostrar quem é e o que pensa o chefe do “papai”.
Nada substitui a vergonha na cara
Vejo muita gente boa reclamando da ausência do PT, PCdoB e PSOL na posse de Jair Bolsonaro.
Alguns, até, contraditoriamente, sugerem que se deveria ir com cartazes de protesto.
Francamente, isso seria portar-se da mesma forma que estes chatíssimos trolls fazem nos blogs de esquerda, fazendo provocação e facilitando conflitos, desejados ou não.
Aliás, pelo exagero até com mísseis colocados em volta da Esplanada, parece que tudo o que desejam é que confusões façam com que se acredite em tramas terroristas contra o “Mito”.
Dia 1° a festa é deles, da extrema-direita, da intolerância, do ódio.
Ou devemos ir celebrar a chegada ao poder de quem, não tem três meses, prometeu “fuzilar a petralhada” e a nós outros, de esquerda, mandar para a cadeia, a “ponta da praia” – apelido do lugar opositores da ditadura militar eram executados, na Restinga de Marambaia – ou para o exílio?
Esqueçam-se, porém, as ofensas pessoais.
Merece aplausos e celebrações que promete arrebentar com os direitos trabalhistas, franquear o acesso a armas, oprimir os professores, desmantelar o Estado?
Democracia é respeitar o resultado eleitoral – coisa que, aliás, o PSDB não fez, quatro anos atrás, sem merecer tais críticas – e não, como dizia minha avó, ir “mostrar as canjicas” para o adversário que, desde sempre, fez questão de mostrar que nos era inimigo mortal.
Além do mais, a obrigação de engolir sapos e até brejos inteiros é de quem ocupa cargos executivos, nos quais se tem o dever de representação de todos e não de parte. Os cargos legislativos, os mandatos parlamentares, os partidos (como o nome indica) são de parte e não da totalidade.
Não estamos num situação de normalidade democrática. O favorito às eleições foi arrancado delas e mantido preso com uma condenação judicial escandalosamente dirigida e, com mais escândalo, mantido mudo, tanto que até uma mera entrevista jornalística, apesar de autorizada judicialmente, é-lhe negada há meses.
Na política, quando se perde a vergonha na cara, o relativismo passa a servir para a indignidade.
copiado http://www.tijolaco.net/blog/