Partido de Medvedev pode perder maioria absoluta no parlamento Rússia testa seus todo-poderosos em eleição deste domingo

Partido de Medvedev pode perder maioria absoluta no parlamento

Rússia testa seus todo-poderosos em eleição deste domingo

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Campanha do partido de Putin e Medvedev para as eleições parlamentares Foto: Reuters
Campanha do partido de Putin e Medvedev para as eleições parlamentares Reuters
BRASÍLIA - Antes das eleições presidenciais marcadas para março, nas quais Vladimir Putin aparece como o principal candidato, o atual premier russo vai enfrentar um outro teste nas urnas: o país elege hoje os novos parlamentares que vão ocupar os 450 assentos da Duma, como é chamada a Câmara Baixa do Parlamento. E os russos possivelmente não darão ao governo a confortável maioria de dois terços com a qual o Executivo — leia-se Putin e o presidente Dmitri Medvedev, do partido Rússia Unida — está acostumado para comandar o país. O percentual necessário para se aprovar mudanças na Constituição é de dois terços, o que pode ser útil num momento em que a Rússia promete reformas e se prepara para lutar contra os efeitos da crise econômica e a estagnação.
Putin e Medvedev, provável futuro premier russo assim que Putin assumir novamente a Presidência, são poderosos e populares; mas começam a dar sinais de desgaste de imagem amargando taxas de aprovação cada vez mais baixas, para antigos padrões, hoje em 61% e 57%, respectivamente.
— A troca de cargos anunciada entre Putin e Medvedev frustrou muitos russos, que queriam ver a competição entre os dois. Isso também reforçou a ideia de Putin governar por mais 12 anos (caso conquiste dois mandatos consecutivos) e se tornar o líder russo mais longevo no poder desde o comunismo — avalia Denis Volkov, do centro de pesquisas de opinião independente Iuri Levada.
Há duas semanas, diante da plateia de parlamentares da Duma, Putin afirmou que o país não podia permitir que a oposição ou os desentendimentos prejudicassem "a estabilidade, a soberania, e o bem-estar da população". Ele pediu união aos deputados para que "o barco não vire". Apesar de o governo ter a maioria dos assentos na Duma (315), não passou despercebida a frieza de alguns parlamentares dos rivais Partido Comunista e do Rússia Justa, que sequer teriam se levantado diante do primeiro-ministro.
O episódio aconteceu poucos dias depois de Putin receber uma quase inédita vaia do público que assistia a uma luta de artes marciais. O vídeo percorreu a internet e teve milhares de acessos no YouTube.
Os especialistas ouvidos pelo GLOBO não esperam novidades e sabem que o partido criado com a ajuda do Kremlin em 2001 sairá vitorioso das urnas, possivelmente com cerca de 50% dos votos. Mesmo assim, isso significa uma perda importante em relação às eleições passadas. Por esta razão, esta eleição está sendo considerada o maior teste de fogo para o Rússia Unida desde a sua criação.
Desgastado e associado à corrupção, segundo pesquisas de opinião, o partido tem desagradado a população, frustrada com a falta de perspectivas. Analistas mais pessimistas acreditam que o partido pode não só perder a maioria da Duma como obter menos de 50% dos votos. Se isso acontecer, Medvedev ficaria ainda mais fragilizado depois de aceitar trocar de posto com o atual primeiro-ministro.
Eleitores querem escolher prefeitos
Desde a ascensão de Putin ao poder, a cena política russa vem mudando. Há no país hoje sete partidos, dos quais apenas quatro estão representados na Duma. De acordo com a analista política Maria Lipman, do Centro Carnegie de Moscou, não há partidos fortes, e o sistema político é 100% controlado.
— O Kremlin optou por uma eleição chata, chata, chata. Quis um arranjo mais manejável, quem sabe, por ter em vista a situação nas grandes cidades, sobretudo Moscou, São Petersburgo e Kaliningrado, onde há um clima de insatisfação. Mas optou-se por não fazer "experimentalismos", não agora. Se foi pela insatisfação das pessoas? É preciso pôr isso em perspectiva. Aqui não é o Norte da África, não quer dizer que a insatisfação tenha chegado a um ponto que vai levar as pessoas para as ruas — afirmou Lipman.
Não está claro quem vai conseguir ultrapassar a barreira dos 7% dos votos nas eleições de hoje para garantir assentos no Parlamento. Tudo indica que as vagas do Rússia Unida e do Partido dos Comunistas estão garantidas. O Partido Democrático Liberal (LPDR), próximo do Kremlin, também deve chegar lá.
Os oposicionistas que mais incomodavam a situação — e que talvez pudessem ter chances de ganhar voz neste pleito — acabaram ficando para trás. As duras regras para o registro dos partidos manteve sob controle todos aqueles supostamente indesejados. O último partido novo a se registrar no país foi o Causa Justa, em 2009. Vários pedidos foram ignorados por apresentar problemas de toda a natureza.
— Esta é a lógica do sistema: manejável e compreensível. Não é nada do tipo teoria da conspiração, é tudo pensado de antemão para ser feito assim. Mas é bem verdade que tudo é decidido por um grupo muito pequeno — afirma Volkov.
Segundo ele, os russos gostariam de ter a opção de escolher. Cerca de 77% gostariam de escolher seus prefeitos e mais de 60%, seus governadores. Durante o governo Putin acabaram as eleições para os governantes regionais.
— Ao mesmo tempo, as pessoas aceitam o que está aí: 80% dos russos dizem que não têm qualquer influência sobre o sistema — salienta Volkov.
Putin abusa da mídia para manter a fama de forte que agrada aos russos
Mesmo com a queda recente de popularidade aos níveis mais baixos dos últimos dez anos, Vladimir Putin continua a ser um dos homens mais poderosos da Rússia. Sua receita de popularidade é uma mistura de fartas doses de exposição na mídia, espírito aventureiro e pulso firme, algo entre o Rambo de Silvester Stallone e os implacáveis personagens de faroeste de Clint Eastwood.
Os russos gostam de líderes fortes, que tomem decisões em seu nome. Putin caiu nas graças da população com o rigor usado para garantir a estabilidade econômica após a crise de 1990 e também com o discurso mais enérgico em relação ao Ocidente.
Mas para o político a presença no imaginário popular é um investimento constante. Com um perfil marqueteiro, não há dia em que não apareça em ação diante das TVs nas mais variadas situações: firme, decidido, atlético ou heroico, de terno e gravata, casaco de couro, quimono ou uniforme camuflado. Em 2007, de férias na república de Tuva, na Sibéria, onde pescava com o príncipe Alberto II, de Mônaco, apareceu sem camisa, com calça camuflada, facão na bainha e coturnos, em passeio pelo rio Khemchik.
Em setembro de 2008, pouco depois da guerra contra a Geórgia, protagonizou uma cena de heroísmo na Reserva Natural de Ussurijsky, habitat dos últimos 450 tigres de Ussuri (ou de Amur) da Rússia. Era aguardado por jornalistas em plena floresta, quando uma das feras se soltou.
A situação foi dominada graças à destreza do ex-presidente, que, rápido no gatilho, disparou um dardo tranquilizante no momento certo. De uniforme camuflado, Putin ajudou a tirar as medidas do felino e a colocar-lhe um GPS no pescoço. Ao final, deu um beijo no tigre desmaiado e disse adeus.
No aniversário de 56 anos, em 2008, lançou um DVD onde ensina judô. Ele é faixa preta e aparece derrubando adversários, dando cambalhotas e falando sobre autoconfiança no filme "Aprendendo judô com Vladimir Putin", distribuído em 12 países.
Faz sucesso a imagem do premier atlético, que não bebe nem fuma, que mandou construir uma academia de ginástica no Kremlin. Em 2009, a bordo da sonda MIR-1, partiu em missão ao fundo do Baikal — o lago mais profundo do mundo — de onde, a 1.395 metros, concedeu entrevista pelo rádio.
Horas após o início dos confrontos na Geórgia, Putin aparece no acampamento do Ministério das Emergências para apoiar vítimas refugiadas na Ossétia do Norte. Sério, com um casaco esporte sobre camisa preta. Em plena crise, Putin apareceu na TV obrigando um dos maiores bilionários do país, Oleg Deripaska, a assinar documento em que se compromete a não demitir funcionários.
Esse perfil onipresente ajuda a explicar o fato de que dez entre dez russos dão como certa a vitória de Putin na eleição presidencial de março de 2012. Na semana passada, ele anunciou oficialmente sua candidatura para o terceiro mandato. Ex-presidente por dois mandatos seguidos, ele deixou oficialmente o comando do país em 2008 porque a Constituição não permitia um terceiro período. Mesmo com a maioria no Parlamento — o que possibilitaria uma eventual mudança de leis — ele preferiu seguir as regras do jogo e elegeu como sucessor o fiel escudeiro Dmitri Medvedev. Rapidamente, Putin foi indicado para o cargo de primeiro-ministro. Na prática, para os russos, Putin saiu sem nunca ter deixado o poder.
Mas ele já foi um burocrata desconhecido. Só veio a ser figura pública no fim do governo do presidente Bóris Yeltsin, que o escolheu para premier em agosto de 1999 e o apresentou mais tarde como sucessor. À época, apenas 6% dos russos sabiam de quem se tratava. Comandou o Serviço Federal de Segurança (como se chama a antiga KGB) entre julho de 1998 e agosto de 1999, quando foi escolhido para ser um dos três vice-primeiros-ministros. Tornou-se presidente interino em 31 de dezembro de 1999, quando Yeltsin renunciou. Elegeu-se o segundo presidente da Rússia pós-soviética em maio de 2000 com a ajuda da sua atuação nos conflitos na Chechênia. (V.O.)

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