Brasil
A prisão do génio que elegeu sete presidentes
João Santana, mais do que publicitário, era um dos raros conselheiros de Dilma. Foi detido esta semana na operação Lava-Jato
A prisão do génio que elegeu sete presidentes
João Santana, mais do que publicitário, era um dos raros conselheiros de Dilma. Foi detido esta semana na operação Lava-Jato
Acusado
de evasão fiscal e de lavagem de dinheiro, o infalível publicitário de
Lula de Silva e do Partido dos Trabalhadores (PT) chorou durante o
depoimento de dez horas à polícia. O caso não era para menos: após
décadas de ganhos milionários, caiu em desgraça ao ser engolido pelo
gigantesco escândalo de corrupção do momento no Brasil.
O
caso relatado no parágrafo acima deu-se em 2005: o escândalo era o
Mensalão e o publicitário em causa Duda Mendonça, o homem que em 1994
contratou o então jornalista João Santana para a sua empresa de
marketing político. Até ver, a história repetiu-se: o infalível e
milionário Santana, "marqueteiro" oficial do PT, foi atropelado esta
semana pelo Petrolão. Não se sabe se vai chorar perante as autoridades,
mas é provável que tenha, como o ex--chefe, a carreira destruída.
Mais
do que um publicitário de sucesso, Santana era também um dos raros
conselheiros a quem Dilma Rousseff, uma das sete presidentes que ajudou a
eleger (e reeleger) no Brasil e no estrangeiro, dava ouvidos. "Ela, com
justa fama de ouvir pouco ou quase nada os seus auxiliares, sempre
levava em conta os conselhos dele", escreveu o colunista de O Globo
Ricardo Noblat, que foi chefe de Santana, quando este ainda era
jornalista.
Com a prisão, a presidente
não perde apenas um conselheiro: perde também argumentos na ação, movida
pela oposição, sobre supostas irregularidades no financiamento da
campanha de 2014, e que, no limite, pode levar à perda do seu mandato.
Daí a comoção que a última detenção mediática da operação Lava-Jato
causou no Palácio do Planalto.
João
Cerqueira de Santana Filho nasceu, ironicamente, numa cidade baiana
chamada Tucano, o animal-símbolo do Partido da Social Democracia
Brasileira (PSDB), maior força da oposição, a 5 de janeiro de 1953, sob o
signo de Capricórnio. E o zodíaco para ele nãoé irrelevante.
Espiritual, tem "uma relação misteriosa e quotidiana", segundo o
próprio, com Ettore Majorana, um físico italiano desaparecido em 1938,
aos 32 anos. É dele também uma profecia esotérica revelada em 2013 à
revista Época: "Gosto muito da definição espiritual de que o Brasil é o
laboratório do Espírito Santo, aqui ocorrerão as grandes tramas
neopolíticas, neoestéticas e ciberétnicas neste século." Na juventude
estudou hipnotismo e quiromancia.
Nessa
fase, já com a alcunha de Patinhas por ser zeloso com o dinheiro, foi
membro da banda Bendegó, cruzou-se com os também baianos Caetano Veloso e
Gilberto Gil, consumiu maconha e outras drogas. Viciou-se apenas em
nicotina - quatro maços - antes de trocar a música pelo jornalismo.
Passou por títulos como Veja, Jornal do Brasil e O Globo até coassinar
na revista Isto É uma história de capa em 1992 que levaria ao
impeachment de Collor de Mello. Dois anos depois, foi convidado a
juntar-se a Duda Mendonça já como "marqueteiro".
Foi
ele quem insistiu, perante Mendonça e a cúpula do PT, em manter Lula
como candidato do partido em 2002, depois de três derrotas consecutivas
do ex-sindicalista. E com Mendonça fora de combate por estar envolvido
no Mensalão, Santana assumiu o marketing do PT a tempo de reeleger Lula
um ano depois de rebentar o escândalo. Passou a "génio" no partido,
reputação que só aumentou com as duas vitórias de Dilma, na primeira uma
desconhecida e na segunda sob forte contestação.
Agressivo,
redigiu a tática que fez de Marina Silva uma aliada dos banqueiros e
tornou Aécio Neves um boémio, ambos concorrentes de Dilma nas eleições
de 2014. Em 2008 já sugerira que um rival era gay, em eleição (nesse
caso perdida) para a prefeitura de São Paulo.
Elegeu
ainda presidentes em mais quatro países: Maurício Funes (El Salvador,
2009), Danilo Medina (República Dominicana, 2012), José Eduardo dos
Santos (Angola, 2012) e Nicolás Maduro (Venezuela, 2012). Ficou rico.
Tem seis imóveis espalhados pelo Brasil e fortuna de 50 milhões de
dólares, segundo avaliação, por baixo, de um amigo.
No
meio da agitada vida profissional, casou-se sete vezes, a última das
quais com a sócia Monica Moura, responsável pelas questões terrenas da
vida do marido - clientes, fornecedores, imprensa e até o contacto com
os dois filhos dele, Suriá Luirí e Aylê Axê, os quatro netos e as seis
ex-mulheres. Santana janta fora todas as noites com Monica - "a mulher
da minha vida". Ela escolhe os vinhos, ele os mariscos.
Amante de literatura
Em
2012, o publicitário teve ainda tempo de escrever o seu único romance,
Aquele Sol Negro Azulado, no qual, diz quem leu, divide o órgão sexual
feminino em 14 tipos diferentes. Amante, portanto, de literatura, foi
desafiado pela revista Época a revelar os seus autores preferidos -
surpreendeu ao enviar uma lista de 56 escritores. E a seguir uma dos 80
músicos favoritos, incluindo um cantor brega brasileiro e um compositor
erudito da Estónia.
Preso, ao lado de
Monica, pelo juiz Sérgio Moro, Santana pode ser a última estrela do
lulismo a tombar no meio dos escândalos, depois de ex-braços direitos do
presidente, de ex-príncipes da alta finança, de ex-tesoureiros do
partido e do seu ex-chefe, o ex-génio do marketing Duda Mendonça.
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