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Entre as muitas barbaridades pronunciadas irresponsavelmente pelo presidente
nos primeiros sete meses de seu Governo, que Eliane Brum qualifica neste mesmo jornal de perversas em seu magnifico artigo Doente de Brasil, há uma que, talvez por ser estrangeiro, ofendeu-me de modo especial. É quando ele afirma: “Temos uma profunda repulsa por quem não é brasileiro”.
A afirmação, no plural, daria a entender que não só ele, mas também todos os outros brasileiros, alimentam essa repulsa contra aqueles que não são, o que é uma injúria com milhões que sempre acolheram os estrangeiros com admirável gentileza, respeito e até carinho. Porque, além do mais, nas veias dos brasileiros pulsa o sangue de tantos povos vindos de todo o mundo. Basta pensar que só em São Paulo convivem em paz, sentindo-se brasileiros e sendo aceitos como tal, pessoas de 90 países diferentes.
Embora estejamos acostumados às palavras de desprezo do presidente de ultradireita por tudo que não sejam suas ordens autoritárias e seus horizontes mesquinhos de civilização, afirmar que sente repulsa por quem não é brasileiro é algo grave em quem deveria ser o defensor de todos e de cada um daqueles que habitam este grande continente, o quinto maior país do mundo. Todos, de algum modo, somos brasileiros. Aqui não há estrangeiros.
Segundo o dicionário Michaelis, repulsa é sinônimo de “repugnância, asco, aversão, revolta”. Se é isso que ele pensa daqueles que, como eu, escolheram livremente este país para viver e o sentem como seu, está fazendo uma tremenda injustiça que o define melhor do que todas as suas bravatas. Mais uma vez, com rejeição e repulsa em relação àqueles que não são brasileiros, o presidente revela que nele predominam os sentimentos negativos, suas pulsões de morte, sua atração por tudo que significa destruição e desqualificação do próximo.
Significa, acima de tudo, uma injúria e uma ofensa ao melhor deste país, que, apesar de todos os seus defeitos, tem uma virtude indiscutível, a acolhida aos estrangeiros. Estou aqui há 20 anos e posso dizer que me sinto mais querido do que em minha própria terra.
Bolsonaro despreza e até persegue o melhor dos brasileiros, a rica pluralidade de suas diferenças étnicas, culturais, humanas e religiosas. Quando eu ainda estava fora do Brasil, pude observar em minhas viagens pelo mundo que a palavra “Brasil” despertava principalmente simpatia e vontade de conhecer o país. Em um mundo no qual está sempre à espreita o perigo das guerras, o Brasil, apesar de sua carga de violência institucional e de suas grandes injustiças sociais, era visto como um povo que deseja viver em paz e que não lembra quando teve sua última guerra.
Agora, pela primeira vez em muito tempo, o Brasil vive sob um Governo que fala mais de guerra do que de paz, de matar do que de dar vida, que assassina a cultura e despreza as diferenças, o que significa renegar a alma deste país, que até ontem era visto pelos sociólogos europeus como um caldeirão de experiências positivas em sua convivência pacífica com os estrangeiros, aos quais poderia oferecer o sonho de um futuro com espaço e liberdade para todas as experiências em um clima de paz e desejo de felicidade.
Talvez seja este o maior pecado do novo presidente, o de estar criando um clima de guerra entre os brasileiros, incitando seus sentimentos de ódio e desprezo por tudo o que significa buscar caminhos novos de convivência e liberdade para experimentar novas formas de viver a existência sem que ninguém os ameace ou assuste.
Bolsonaro, que se apresenta como cristão, parece ter esquecido que os tempos do “olho por olho, dente por dente” morreram há mais de 2.000 anos e que foram os primeiros cristãos aqueles que pregaram: “Agora já não há judeu nem gentio, escravo nem livre, porque todos são um em Cristo”. Semear, como o presidente faz, sementes de morte e divisão, de desprezo e até de ameaças a todos aqueles que não se ajoelhem diante de sua visão autoritária e estreita do mundo, é ofender este país e segregá-lo do mundo moderno sem fronteiras, querendo impor novos muros que nos separem uns dos outros.
É precisamente essa a missão de satanás, dividir e semear ódios para impedir as pessoas de ser felizes, de ser como elas querem e não como pretende um Governo que parece apreciar mais as armas do que a paz, a discórdia do que a concórdia. Isso, na verdade, é assassinar o país em vez de abrir novos horizontes para ele em um mundo que está com dores de parto e tudo de que precisa é que o ajudem a criar uma nova vida, em vez de se deixar arrastar pelos demônios que tentam destruir seus sonhos.
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