Torcida LGBT troca de nome após ameaça e segue Inter no estádio
Coletivo Orgulho Vermelho revelou a homofobia de parte da própria torcida colorada
10.ago.2019 às 20h00
PORTO ALEGRE
O gol marcado pelo jogador colorado fez a torcida no estádio Beira-Rio vibrar: uns gritaram, outros trocaram tapas nas costas, se abraçaram e casais se beijaram. “Comemoramos com um selinho", relembra Graziela Azevedo, 26, sobre a partida que assistiu com a então namorada, em 2006.
Ao lado delas, três homens olharam e disseram que eles e o casal poderiam ir juntos embora para casa.
“Não é só violência que ocorre contra lésbicas, mas também o assédio. Não é só homofobia, é também machismo. Desde então, nunca mais demonstrei nada no estádio”, disse à Folha a universitária de Taquara, cidade a 60km de Porto Alegre.
Ela é uma das 50 integrantes do grupo Orgulho Vermelho, coletivo LGBT formado por torcedores do Internacional em maio, após mobilização, inicialmente virtual, liderada por Thiago Vargas, 21.
O coletivo reúne torcedores de diversas partes do Rio Grande do Sul e não se identifica como uma torcida organizada. O grupo também participa do movimento antirracista e antifascista da torcida do Internacional. Os dois se identificam como bissexuais, a letra “b” da sigla LGBT, considerada por muitos a que mais sofre invisibilidade.
A advogada Luísa Stern, 53, também integra o grupo.
“Na condição de mulher trans eu nunca sofri preconceito diretamente, mas é porque não sou lida como trans. Quando comecei minha transição, fiquei sete anos sem frequentar o Beira-Rio por medo de sofrer preconceito. Depois que voltei, felizmente nunca aconteceu nada”, relata.
Inicialmente, o coletivo se chamava Coloridos. A expressão é uma mistura das palavras “colorado” e “colorido”, uma alusão à bandeira com as cores do arco-íris, que representa os movimentos LGBT. Depois das primeiras aparições na mídia local com o nome, o coletivo passou a receber ameaças de violência.
O termo foi considerado uma dupla ofensa. Além de ter revelado a homofobia de parte significativa da própria torcida colorada, mostrou que nem a luta contra o preconceito está livre da rivalidade entre Grêmio e Inter.
“Colorido é também o xingamento homofóbico que a torcida gremista usa para ofender os colorados. Mas a ideia era justamente ressignificar o termo”, explica Vargas. Sem acolhimento, o coletivo decidiu trocar de nome.
“Como já tem tanta gente contra a causa, achamos melhor não perder o apoio de quem está do lado do coletivo, mas não gostou do antigo nome. Orgulho Vermelho é tanto uma referência ao ‘orgulho LGBT’ como ao orgulho do Internacional”, explica Azevedo.
As ameaças virtuais também partiram dos colorados que não toleraram comparações iniciais de Vargas com a Coligay, a torcida homossexual do Grêmio criada em 1977.
“Foi a primeira a colocar a cara a tapa no Brasil. Era um contexto muito pior, durante a ditadura militar”, justifica.
Por isso, 42 anos depois do surgimento da Coligay, a primeira e principal acolhida ao coletivo colorado não foi dos homens, mas das mulheres. Os integrantes foram chamados a assistir às partidas com a Força Feminina Colorada, torcida organizada com banda própria.
“Foi nosso primeiro apoio. ‘Se forem para cima de vocês, estaremos ali do lado’, elas nos disseram”, conta Azevedo. O coletivo não frequenta o Beira-Rio identificado como Orgulho Vermelho por temer represálias.
“Não comparecermos aos jogos identificados como grupo LGBT e sim como torcedores comuns, misturados aos outros, como a gente já fazia antes”, explica Stern.
Enquanto o grupo se fortalece, assistem juntos aos jogos da equipe feminina do Inter, onde são bem recebidos enquanto coletivo.
“Já sofremos tanta violência na rua, em casa. A gente não quer sofrer no estádio, nossa segunda casa. A gente quer um lugar seguro para torcer como todos os outros”, defende Azevedo. Ela acrescenta: “Nossa bandeira sempre será vermelha”.
copiado https://www1.folha.uol.com.br/
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