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Vítima de estupro no Congo: abuso sexual é uma eficiente arma de guerra
Nos cinco minutos que você
levará para terminar de ler esta reportagem, pelo menos três mulheres
terão sido estupradas na República Democrática do Congo. A cada hora, 48
mulheres são violentadas no país, segundo um estudo publicado no American Journal of Public Health. Organizações de proteção aos direitos humanos também registram um número impressionante de vítimas masculinas.
No total, 22% dos homens e 30% das mulheres do
Congo já foram vítimas de violência sexual em ataques relacionados ao
conflito, segundo números de 2010. Tais estatísticas levaram a enviada
da ONU ao país, Margot Wallström, a classificar o país como a "capital
mundial do estupro" em um apelo para que o Conselho de Segurança tomasse
uma atitude para interromper a barbárie.
Mas se os números já são chocantes,
os depoimentos reunidos pelo jornalista Will Storr em uma investigação
exclusiva para a BBC são um grito de socorro que a comunidade
internacional não deveria ser capaz de ignorar.
Os relatos foram reunidos no documentário de rádio
An Unspeakable Act (na tradução livre algo como "Um Ato Sobre o Qual não se Pode Falar").
O próprio Storr admite que é difícil ouvi-los
até o final, mas diz que o objetivo das vítimas era justamente conseguir
que seus dramas fossem divulgados, em uma tentativa de romper o
imobilismo internacional sobre o tema.
Relatos
Uma das vítimas, por exemplo, conta como foi
estuprada por quatro homens que mataram seu marido e seus seis filhos
enquanto riam e pareciam se divertir. "Nunca vou conseguir esquecer.
Desde então, tenho uma dor na cabeça constante por causa de todos esses
pensamentos ruins. Ao lembrar tudo isso agora, parece que minha cabaça
vai explodir", diz a vítima.
Outra mulher relata como os estupradores
mutilaram sua genitália - algo frequente nos ataques, como explicam
médicos que atendem as vítimas.
Um homem disse ter sido vítima de abusos sexuais
cometidos por integrantes do Exército e descreve os ataques e suas
sequelas físicas e psicológicas. "Na primeira vez eles me amarraram, me
bateram, mataram minha mãe, meu pai e meus filhos na minha frente", diz.
"Depois voltaram e me usaram por vários dias."
Um total de 6 milhões de pessoas já foram mortas
no conflito na República Democrática do Congo desde 1996. Hoje, a média
de mortos é de 54 mil por mês.
Os estupros são cometidos tanto por milícias
quanto pelas forças oficiais. Especialistas explicam que, mais do que
atos de violência em um ambiente socialmente degradado e sem lei, esses
abusos são uma tática de guerra.
Arma de guerra

Homens também são vítimas de abusos sexuais no Congo
"A violência sexual em conflitos armados é uma
tática de uma eficiência incrível porque ela humilha, envergonha e
traumatiza a vítima", explicou Lara Stemple, diretora do programa de
Saúde e Direitos Humanos da Universidade da Califórnia.
"Em um conflito armado em que a violência está
por toda parte, o estupro é um instrumento de dominação total, de
subjugação completa."
Para Chris Dolan, diretor de um projeto que dá
assistência legal a refugiados congoleses em Uganda, os abusos sexuais
são uma arma de guerra mais eficiente do que as convencionais porque
rompem a harmonia e o tecido social de uma comunidade.
"Todas as relações entre os integrantes de uma
família, e dessa família com a vizinhança e com a sua comunidade podem
ser afetadas por um estupro."
Desde 2009, Dolan dirige uma campanha para
ampliar a conscientização sobre o fato que vítimas de violência sexual
podem ser homens além de mulheres.
Sua organização também oferece ajuda às vítimas
masculinas, que sofrem com graves sequelas físicas, além de serem
estigmatizadas em sua comunidade.
"As sequelas psicológicas de um abuso desses
também são terríveis. As pessoas descrevem essa situação como uma
tortura interna", diz William Hopkins, psiquiatra da organização
Freedom from Torture, explicando que a vítima passa a "odiar a si mesmo."
Responsabilidade
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Vítimas descrevem as sequelas psicológicas dos estupros como uma "tortura interna"
Segundo Storr, uma das questões mais difíceis de
se entender ao analisar o problema dos estupros endêmicos no Congo é
como tantos congoleses - sejam eles integrantes de milícias ou do
Exército do país - podem cometer tais atos de barbárie.
Especialistas explicam que a maioria dos
estupros são coletivos e aqueles que cometem tais abusos não se sentem
individualmente responsáveis por seus atos.
Muitos dos estupradores não têm problema em
descrever os ataques e até se sentem "orgulhosos" de fazer parte dos
grupos que cometem tais violências.
Um dos milicianos entrevistados no documentário,
por exemplo, diz que fica "feliz" depois dos estupros e se torna mais
violento quando as vítimas reclamam "mais do que deveriam".
Segundo informações apuradas pelo
documentarista, a formação militar dos milicianos e militares,
estruturada de modo a desprovê-los de sua "individualidade" e
""humanidade", também ajudaria a agravar o problema.
COPIADO : http://www.bbc.co.uk/
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