Músicas da Ditadura Militar
A música popular brasileira foi um dos principais instrumentos da arte utilizados para contestar a ditadura militar que vigorou por 21 anos no País. As letras dos compositores indicavam a insatisfação com o regime e quem tentou burlar foi alvo de censura e perseguição.
Apontando insatisfação direta ou usando metáforas, a maioria dos artistas buscou refúgio no exterior. O autoexílio foi a medida tomada para evitar as sucessivas convocações para depoimentos e a possibilidade de prisão.
Entre os compositores de maior destaque no período ditatorial estão:
- Chico Buarque
- Geraldo Vandré
- Aldir Blanc, em companhia de João Bosco
- Gilberto Gil
- Caetano Veloso
- Roberto Carlos e Erasmo Carlos
Chico Buarque
O compositor, cantor, dramaturgo e escritor carioca tem uma das maiores produções voltadas para a crítica à ditadura militar. Seu trabalho recebe influências do samba e do lirismo do cotidiano. Ao fim da década de 60, foi criticado por não se posicionar politicamente. Quando o fez, precisou buscar o autoexílio em Roma em 1968, e só retornou ao Brasil em 1970.
No mesmo ano, lança o disco "Apesar de Você", com letras de embate direto ao regime. Vigiado mais de perto pela ditadura, Chico Buarque é obrigado a criar um heterônimo, "Julinho de Adelaide". A manobra dura até 1975. Nesse período, consegue lançar outras músicas também com letras diretamente indicativas da insatisfação popular com o regime.
As letras de Chico foram interpretadas pela maioria dos cantores da época, entre eles Elis Regina (1945 - 1982), Gal Gosta e Caetano Veloso.
"Apesar de Você" (Composição: Chico Buarque, 1970)
Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão
(.....)
Falou, tá falado
Não tem discussão
(.....)
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Amanhã há de ser
Outro dia
Geraldo Vandré
É do paraibano Geraldo Vandré uma das músicas mais entoadas nas passeatas que criticaram o regime ditatorial. A canção conclamava a população a reagir contra os atos dos militares, venceu o festival de 1967, mas foi censurada.
Geraldo Vandré fugiu do Brasil naquele ano e só voltaria em 1973. Ele abandonou o cenário artístico.
"Pra não dizer que não falei das flores" (Composição: Geraldo Vandré, 1967)
Pelos campos há fome
Em grandes plantações
Pelas ruas marchando
Indecisos cordões
Ainda fazem da flor
Seu mais forte refrão
E acreditam nas flores
Vencendo o canhão
Em grandes plantações
Pelas ruas marchando
Indecisos cordões
Ainda fazem da flor
Seu mais forte refrão
E acreditam nas flores
Vencendo o canhão
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer
Aldir Blanc e João Bosco
Os parceiros criativos Aldir Blanc e João Bosco apresentaram diversas canções em protesto à ditadura. A mais marcante, ainda hoje é "O bêbado e o equilibrista", interpretado pela gaúcha Elis Regina.
A canção resume o sentimento daqueles que clamavam pela anistia a quem perdeu os direitos políticos. Foi gravada em 1979, no mesmo ano em que é assinada a Lei da Anistia.
"O bêbado e o equilibrista" (Compositores: Aldir Blanc e João Bosco, 1975)
E nuvens lá no mata-borrão do céu
Chupavam manchas torturadas
Que sufoco!
Louco!
O bêbado com chapéu-coco
Fazia irreverências mil
Pra noite do Brasil
Chupavam manchas torturadas
Que sufoco!
Louco!
O bêbado com chapéu-coco
Fazia irreverências mil
Pra noite do Brasil
Meu Brasil!
Que sonha com a volta do irmão do Henfil
Com tanta gente que partiu
Num rabo de foguete
Que sonha com a volta do irmão do Henfil
Com tanta gente que partiu
Num rabo de foguete
Chora
A nossa Pátria mãe gentil
Choram Marias e Clarisses
No solo do Brasil
A nossa Pátria mãe gentil
Choram Marias e Clarisses
No solo do Brasil
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Gilberto Gil
O cantor e compositor Gilberto Gil escreveu em parceria com Chico Buarque uma das mais marcantes canções em oposição ao período da ditadura. "Cálice" foi escrita em 1973, mas só foi liberada pela censura em 1975.
A canção é uma metáfora ao momento de súplica de Jesus Cristo que pede, consciente de que será morto, que o Pai afaste dele o cálice (sina). A letra induz, contudo, que seja afastado do povo o "cale-se" imposto pelos ditadores.
Na história bíblica, Jesus Cristo sabe que será torturado e que a morte será marcada por sangue. Da mesma maneira, a canção denuncia o sangue derramado pelos torturados nos porões da ditadura.
Cálice (Compositores: Gilberto Gil e Chico Buarque, 1973)
Como beber dessa bebida amarga
Tragar a dor, engolir a labuta
Mesmo calada a boca, resta o peito
Silêncio na cidade não se escuta
De que me vale ser filho da santa
Melhor seria ser filho da outra
Outra realidade menos morta
Tanta mentira, tanta força bruta
Tragar a dor, engolir a labuta
Mesmo calada a boca, resta o peito
Silêncio na cidade não se escuta
De que me vale ser filho da santa
Melhor seria ser filho da outra
Outra realidade menos morta
Tanta mentira, tanta força bruta
Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Caetano Veloso
As canções do baiano Caetano Veloso também marcaram a crítica contra a ditadura. Caetano permaneceu em autoexílio entre 1969 e 1971, em Londres. Entre as mais importantes está "Alegria, alegria", que inaugura o movimento tropicalismo no Brasil.
A música critica diretamente a direita seduzida pela cultura norte-americana (coca-cola e Brigitte Bardot). Demonstra alguém sem responsabilidade (sem lenço e sem documento), indiferente à pressão militar.
"Alegria, alegria" (Composição: Caetano Veloso, 1967)
Ela pensa em casamento
E eu nunca mais fui à escola
Sem lenço, sem documento
Eu vou
E eu nunca mais fui à escola
Sem lenço, sem documento
Eu vou
Eu tomo uma coca-cola
Ela pensa em casamento
E uma canção consola
Eu vou
Ela pensa em casamento
E uma canção consola
Eu vou
Por entre fotos e nomes
Sem livros e sem fuzil
Sem fome sem telefone
No coração do Brasil
Sem livros e sem fuzil
Sem fome sem telefone
No coração do Brasil
Roberto Carlos
Ícone da música romântica, Roberto Carlos comportou-se com simpatia à ditadura militar. Essa condição aparece em relatórios militares. Era uma forma de colaboração em que não contestava o regime.
O rei, como foi batizado pelos fãs, encontra uma brecha e consegue lançar uma das músicas de maior sucesso, "Debaixo dos caracóis dos seus cabelos". A música escrita em parceria com Erasmo Carlos é uma clara homenagem a Caetano Veloso, exilado em Londres.
O protesto não foi notado pelos ditadores, acostumados às letras que tratavam amor e paixão de maneira rocambolesca.
"Debaixo dos caracóis de seus cabelos" (Compositores: Roberto Carlos e Erasmo Carlos, 1971)
Uma história pra contar
De um mundo tão distante
Debaixo dos caracóis dos seus cabelos
Um soluço e a vontade
De ficar mais um instante
De um mundo tão distante
Debaixo dos caracóis dos seus cabelos
Um soluço e a vontade
De ficar mais um instante
Você anda pela tarde
E o seu olhar tristonho
Deixa sangrar no peito
Uma saudade, um sonho
E o seu olhar tristonho
Deixa sangrar no peito
Uma saudade, um sonho
Um dia vou ver você
Chegando num sorriso
Pisando a areia branca
Que é seu paraíso
Chegando num sorriso
Pisando a areia branca
Que é seu paraíso
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