O general e vice-presidente da República Hamilton Mourão (PRTB) afirmou em entrevista ao jornal francês Le Monde que a ditadura militar que vigorou no Brasil por mais de vinte anos "matou muito poucas pessoas".
Em outra declaração ao jornal, Mourão repetiu o argumento de entusiastas do regime de que os militares impediram o "Brasil de ter caído na ditadura do proletariado".
Na reportagem, Mourão também comentou os recentes atritos com parte da ala bolsonarista, incluindo um dos filhos do presidente Jair (PSL), Carlos Bolsonaro (PSC).
"Carlos não me conhece, ele nunca sentou comigo para conversar (...) Jair Bolsonaro tem seu estilo, um estilo particular, uma maneira de se comunicar que algumas pessoas não gostam. Mas eu não tenho um papel importante, sou um auxiliar", disse Mourão.
Além do filho do meio de Bolsonaro, Mourão está submerso em uma série de desavenças com o guru bolsonarista Olavo de Carvalho, o qual já classificou o vice-presidente de "inimigo e competidor" do presidente. Questionado pela reportagem do jornal francês se seria um contraponto ao governo, Mourão disse que isso "seria antiético e desleal".
Em relação aos entraves que o governo tem enfrentado em pouco mais de 100 dias de gestão, Mourão amenizou os questionamentos. "A situação não é assim negativa. São problemas, é verdade, mas a maioria das pessoas que critica Bolsonaro não se dá conta que ele teve problemas de saúde seríssimos. Essas coisas ligadas ao Twitter, a seus filhos, são de menor importância, fazem parte da aclimatação do governo."
Na abertura da reportagem, o jornal traz à tona uma "atmosfera estranha" que ronda os palácios de Brasília e reforça uma pecha de "traidor" atribuída ao general. O termo foi utilizado várias vezes pelo deputado Marco Feliciano (PODE), defensor de Bolsonaro, e que entrou com um malsucedido pedido de impeachment contra o vice-presidente.
"Desde o dia anterior o general Mourão, 65 anos, tornou-se para alguns dos 'bolsonaristas' mais radicais um traidor no poder.", escreveu a correspondente e autora da reportagem, Claire Gatinois.
434 mortos, genocídio indígena e milhares de torturados
A fala de Mourão sobre a ditadura militar diverge dos dados oficiais disponíveis sobre o regime. De acordo com a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, órgão vinculado ao Ministério Público Federal, 434 pessoas foram assassinadas ou desapareceram compulsoriamente.
O regime também foi responsável por um genocídio dos povos indígenas do país: mais de 8 mil foram assassinados pelos militares. O MPF informa ainda que entre 30 e 50 mil pessoas foram presas ilegalmente e torturadas durante a ditadura.
A PFDC esclarece ainda que as políticas de execução sumária, tortura, desaparecimento forçado e genocídio dos povos indígenas não foram pontuais ou desenvolvidas paralelamente, e sim políticas institucionalizadas pelo Estado.
"Não foram excessos ou abusos cometidos por alguns insubordinados, mas sim uma política de governo, decidida nos mais altos escalões militares, inclusive com a participação dos presidentes da República", diz uma nota do MPF sobre o golpe militar.
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