AFP / YASUYOSHI CHIBAFlores são depositadas em buracos de bala na fachada de uma loja do Complexo da Maré, durante uma manifestação contra a violência
Com o olhar fixo e o passo determinado, Ana Paula Oliveira lidera uma passeata, carregando um cartaz com a foto de seu filho Jonathan, morto há três anos durante uma operação policial no Rio de Janeiro.
"Chega de chacina, polícia assassina!", gritaram os cerca de 800 manifestantes que protestaram nesta quarta-feira (24) no Complexo da Maré, um conjunto de favelas onde já ocorreram 18 mortes violentas desde o início do ano.
Segundo o fórum "Basta de Violência, outra Maré é possível", que organizou o protesto, o número de mortes já supera o total registrado em 2016 nesta zona, que reúne 140 mil habitantes, geralmente reféns da guerra entre traficantes de drogas na disputa de território.
"Meu filho morreu com um tiro nas costas. Tinha 19 anos. Quem matou ele continua solto. Disseram que agiram em legítima defesa, é sempre assim", denuncia Ana Paula.
"Não é por que a gente é pobre, preto e vive na favela que a nossa vida não vale nada", desabafa.
Diante de Ana Paula, três manifestantes carregam um enorme balão rosa com as palavras "Maré" e "Amor". Às vezes, é preciso abaixar para evitar que o balão entre em contato com os fios que cruzam as ruas em cada esquina.
Algumas casas têm a fachada repleta de buracos de bala, testemunhos da violência diária. Pequenas flores foram fixadas nos buracos de uma vitrine de uma loja de colchões.
- 'Um único corpo' -
A poucos metros de distância, próximo a um bar, Rejanne de Souza Barreto chora, antes de encontrar consolo nos braços de outros manifestantes.
Há três meses, foi atingida por uma bala no peito quando tomava café da manhã no bar com sua filha. Sobreviveu, mas permanece de luto pelo marido, morto há 17 anos na Maré.
Outro local altamente simbólico é a ponte perto da qual Davison Lucas da Silva, de 15 anos, morreu em janeiro.
Um grupo de artistas vestidos de branco e com cartazes com a palavra "paz" se encontra no local da tragédia, enquanto é fotografado por um drone.
"Devemos demonstrar que somos apenas um corpo, que leva uma mensagem de união e de paz", diz a atriz Patricia Pillar.
A atriz e seus colegas foram à favela para mostrar sua solidariedade, respondendo ao chamado das associações locais.
- Crianças sem escola -
Em uma praça, um grupo de idosos joga baralho, imperturbável, mostrando algum incômodo com o barulho, mas aceitando quando um militante cola adesivos em suas camisas.
"A gente tem que entender que precisa parar de correr sangue", insiste Thais de Jesus, da associação Redes da Maré.
"Minha casa foi atingida por tiros várias vezes. Da última, quase acertam minha irmã pequena. Minha mãe mora aqui há 48 anos, mas agora pensa em mudar", revela a jovem economista de 27 anos que exibe orgulhosamente seu corte afro.
"Aqui se vive dia a dia. Não sabemos se poderemos seguir com o programa escolar amanhã. Então, aproveitamos cada hora de curso", explica a professora Natacha Carvalho, rodeada por cerca de 100 alunos.
Natacha perdeu a conta de quantas vezes teve de pedir a seus alunos que se escondessem debaixo da mesa durante tiroteios.
Segundo a Anistia Internacional, o número de mortos ligados às operações da polícia no Rio de Janeiro saltou de 416, em 2013, para 920, em 2016.
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