Bandeira
venezuelana gigante num protesto de opositores contra as
presidenciais
| EPA /CRISTIAN
HERNANDEZ
Sem hipótese contra Maduro, oposição aposta na abstenção
Presidente é o grande favorito à vitória nas eleições de hoje,
apesar de 75% dos venezuelanos dizerem querer mudanças
Com os principais adversários presos, inabilitados ou exilados e o
maior bloco da oposição, a Mesa de Unidade Democrática (MUD), a
apelar à abstenção por não confiar no processo eleitoral, Nicolás
Maduro apresenta-se hoje às presidenciais com a porta aberta para
conseguir a reeleição. Isto apesar de, segundo uma sondagem
Datanálisis, a popularidade do presidente estar entre os 20% e os
25% e 75% dos inquiridos quererem uma mudança no governo.
"Ficaria surpreendido se houvesse surpresas. Lamentavelmente não
se pode esperar nada mais do que o resultado esperado", afirmou
ao DN o venezuelano Benigno Alarcón, diretor do Centro de Estudos
Políticos da Universidade Católica Andrés Bello. "Foram umas
eleições desenhadas e convocadas para ser ganhas pelo governo,
aproveitando um momento de muita debilidade e fragilidade da
oposição. Não podemos esperar nada diferente do previsível",
acrescentou.
Em abril de 2013, um mês após a morte do carismático Hugo Chávez
que o elegera seu herdeiro político, Maduro ganhou as presidenciais
pela margem mínima. Em 2015, pela primeira vez em mais de uma
década, a oposição venceu as eleições legislativas, assumindo o
controlo da Assembleia Nacional. Seguiram-se meses de protestos, que
deixaram mais de 60 mortos, com o presidente a responder à pressão
política com a eleição de uma Assembleia Nacional Constituinte.
Entretanto, a oposição dividiu-se entre participar ou não no
diálogo com Maduro ou participar nas eleições regionais do ano
passado.
Entretanto, a situação económica e social foi-se deteriorando. A
Venezuela enfrenta a recessão pelo quinto ano consecutivo, a
inflação é a maior do mundo - o Fundo Monetário Internacional
estima que no final de 2018 será de 13 000% - e o salário mínimo
não chega para nada. Faltam alimentos e medicamentos e milhares de
venezuelanos deixaram o país. Maduro culpa a "guerra económica"
empreendida pelos EUA, que apertam com as sanções ao entorno
presidencial mas ainda não cruzaram o limite de as implementar em
relação à indústria petrolífera. 92% dos venezuelanos consideram
que o seu país está mal.
Razões para o boicote
Num debate organizado em Nova Iorque pela Americas Society/ /Council
of the Americas, o ex-autarca David Smolansky, que fugiu da Venezuela
para não ser detido, enumerou as razões para a ausência da
"verdadeira oposição" das eleições. Primeiro, disse que
o Conselho Nacional Eleitoral "carece de autonomia".
Depois, lembrou que "os candidatos que poderiam ganhar estão
presos, inabilitados ou no exílio" (referindo-se a Leopoldo
López, Henrique Capriles ou Antonio Ledezma, respetivamente) e a
maioria dos partidos foram ilegalizados.
Além disso, referiu Smolansky, há um milhão e meio de eleitores
que não podem votar no estrangeiro, tendo havido recentemente um
êxodo de venezuelanos (que seriam alegadamente pró-oposição). O
ex-autarca, que vive exilado em Washington, lamenta ainda a falta de
observadores internacionais, à exceção da Aliança Bolivariana,
apoiantes de Maduro. Por último, recorda que as eleições foram
convocadas pela Assembleia Nacional Constituinte, cuja legalidade não
foi reconhecida em vários países.
Ao DN, Alarcón dá ainda outras razões, como o facto de as eleições
estarem originalmente previstas para o final do ano e terem sido
convocadas com apenas dois meses de antecedência (inicialmente
seriam em abril, só depois foram adiadas), impedindo a oposição de
preparar uma campanha ou escolher um candidato através de primárias.
"Somando o facto de terem tirado tempo que seria normal numa
campanha à deterioração das condições eleitorais - que foram
muito claras durante as últimas eleições -, a oposição estava
numa posição muito má. A de ir a votos como se fosse a uma batalha
sem exército, sem armas, sem nada", afirmou.
Adversários
Apesar dos apelos ao boicote eleitoral por parte da MUD, Maduro não
vai sozinho às urnas. No boletim de voto haverá outros três nomes.
O ex-governador do estado de Lara, Henri Falcón, que se desvinculou
do ex-presidente Hugo Chávez em 2010, é o mais sonante. Se já era
considerado traidor pelos chavistas, agora é considerado traidor
também pela oposição. "O papel de Falcón, se não tiver
sucesso nestas eleição e reconhecer um resultado favorável ao
governo, é ter contribuído com a sua presença para fraturar a
oposição e fortalecer a posição de governo", disse Alarcón.
Mas Falcón não é o único opositor, e o ex-pastor evangélico
Javier Bertucci tem vindo a ganhar força. "À medida que a
participação sobe, as probabilidades de Falcón ganhar aumentam,
porque a abstenção se concentra do lado da oposição. 90% dos
eleitores do governo vão votar. Mas Falcón tropeça noutro
candidato, Bertucci, um outsider", explicou o analista político.
Assim, "pode tirar dois milhões de votos a Falcón" e
tornar impossível a sua vitória. Bertucci recusou abdicar da
candidatura a favor do adversário: "Se tivesse certeza que ele
ia ganhar, fá--lo-ia. Mas não é o cenário", disse.
O último candidato é Reinaldo Quijada, que também é acusado de
legitimar as eleições com a sua participação. Chegou a ser
porta-voz regional do Partido Socialista Unido da Venezuela, que
abandonou após a morte de Chávez, em 2013.
Cenários pós-eleitorais
Segundo Alarcón, o mais provável é o Conselho Eleitoral declarar a
vitória de Maduro sem problemas. Seguem-se dois cenários, sendo
mais uma vez o mais provável o de os candidatos que se opõem ao
presidente reconhecerem o resultado. "Outro é um deles não
reconhecer e aí seria de esperar algum nível de conflitualidade ou
mobilização nas ruas, mas honestamente não acho que vá muito
longe", disse. No primeiro caso, em que a vitória é
reconhecida, "o governo dá mais um passo na direção do
autocratismo e de fechar mais o regime".
A hipótese menos provável é ser declarada a vitória de um dos
opositores e aí, afirmou Alarcón, será porque houve negociações
prévias das quais não se soube nada. "Nesse caso, abre-se um
período de sete meses até à tomada de posse em que se negoceiam as
condições de saída do governo", concluiu.
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