Jair Bolsonaro sustenta o governo de Michel Temer. Este é o título em letras garrafais, depois que o capitão-candidato disse ao país e a seus seguidores que a posição mais adequada, neste momento, a 120 dias das eleições, é deixar o tempo correr. “Se faltasse um ano e meio, dois, três anos, tudo bem, pô”, declarou à Folha de S. Paulo em seu canhestro critério democrático. Na realidade, derrubar o presidente agora seria criar uma situação tão perigosa que poderia sepultar as excelentes possibilidades eleitorais do candidato. Deixem o governo sangrando. Os militares voltam ao poder pelo voto, é sua mensagem.
Michel Temer chefia um governo fraco, mas não se pode dizer que esteja em retirada. Com tudo o que enfrentou, como os grandes cardeais do Judiciário, as estridências da oposição no Congresso, as cacetadas da grande mídia, pode-se assegurar que só na fritura ele não sai. Resistirá. Ele ainda tem munição no polvorinho. É preciso não esquecer que a Constituição prevê o Estado de Sítio, um instrumento que dá ao presidente todos os poderes da República: além do Executivo, o Judiciário e o Legislativo. Ditador por tempo limitado.
Não parece ser o caso agora, mas, no passado, muitos presidentes conseguiram, do Congresso, a autorização para mandar e desmandar. Com isto, botaram os adversários na defesa. Não se fala nisto. Ainda.
Até o momento, com o instrumento de Garantia da Lei e da Ordem (o GLO) o governo já pode acionar alguns dispositivos de exceção, como a requisição legal de caminhões, por exemplo, obrigando seus proprietários a entregar o veículo às autoridades. Com Estado de Sítio pode prender e arrebentar. Aí é dureza.
De acordo com a Constituição, o presidente da República pode solicitar ao Congresso autorização para decretar o Estado de Sítio quando houver comoção nacional grave, quando o estado de defesa não for suficiente ou quando houver declaração de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira. Ainda não se chegou lá.
Esse dispositivo legal existe pelo mundo afora. No Brasil já foi usado ao longo da vida republicana, a começar pelos dois primeiros presidentes da nascente república.
Foram eles os alagoanos Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto. Governaram em meio a uma derrocada de regime, o fim do Império, com levante das Forças Armadas, caos do abastecimento (Floriano mandou prender os comerciantes atacadistas). Lima Barreto escreveu sobre essa repressão sua obra prima “O Triste Fim de Policarpo Quaresma”.
Já no Século XX, o presidente Hermes da Fonseca, gaúcho e também marechal do Exército,tão logo assumiu recorreu ao Estado de Sítio para enfrentar a Revolta da Chibata, uma espécie de greve de marinheiros, liderada pelo também gaúcho Antônio Cândido. O mineiro Arthur Bernardes governou durante quatro anos, de 1922 a 26, com o Estado do Sítio em vigor. Motivo: reprimir a revolta de jovens oficiais, predominantemente das armas de Engenharia e Artilharia do Exército e da guarnição do encouraçado São Paulo, da Marinha. Este movimento ficou na História como “tenentismo” e, oito anos depois, os rebeldes chegaram ao poder na Revolução de 1930, com Getúlio Vargas.
Outro a se valer do Estado de Sitio foi o presidente interino Nereu Ramos, de Santa Catarina, para assegurar a posse de seu correligionário do PSD, Juscelino Kubitschek, em 1957, ameaçada por um golpe militar.
Jango Goulart chegou a pedir ao Congresso a autorização legislativa para implantar o Estado de Sítio, a pedido de seus ministros militares. Entretanto lhe foi negada a franquia legal e ele acabou deposto. Não só por isto, mas bem demonstra a fraqueza de seu governo, que não conseguiu apoio político para enfrentar a desestabilização.
Temer assegura nas suas aparições públicas, nestes dias, que seu limite de ação é a legislação em vigor. No entanto, não deve se deixar derrubar antes de oferecer todas as resistências. Esta parece ser sua índole de paulista decidido e de filho de imigrante árabe cristão do Líbano. Não se cutuca onça com vara curta, diz a sabedoria do caipira.
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