*Igor Tadeu Camilo Rocha
Desde o "furo", publicado há duas semanas pela jornalista Eliane Cantanhêde em seu Twitter, desmentido horas depois pelo presidente Jair Bolsonaro, já havia uma expectativa da demissão de Ricardo Vélez Rodríguez do Ministério da Educação (MEC). Nesta segunda-feira, dia 8 de abril, o esperado desligamento foi concretizado, em anúncio também feito em rede social pelo presidente.
Para seu lugar, foi anunciado Abraham Weintraub, professor da Unifesp, no curso de Ciências Contábeis. Cabe aqui fazer alguns breves apontamentos sobre a trajetória do novo ministro e, depois disso, uma pequena reflexão a respeito do que pode se esperar da condução dessa importante pasta nos próximos meses do governo.
Abraham Weintraub fez uma carreira de 18 anos no Banco Votorantim, começando no cargo de office-boy e chegando ao de economista-chefe, indo trabalhar, após sua demissão, na Quest Corretora, segundo o InfoMoney.
No site Escavador, que coleta informações de pesquisadores publicadas pelos mesmos na Plataforma Lattes, há informações detalhadas sobre sua trajetória acadêmica. Formado em 1994 em Economia pela Universidade de São Paulo – USP, obteve o título de mestre ao defender a dissertação de título The Performance of Open-end Brazilian Fixed Income Mutual Funds for Retail Clients, no ano de 2013, pela Fundação Getulio Vargas.
A partir de 2014, tornou-se professor da Universidade Federal de São Paulo – Unifesp, e seu interesse por temas como previdência complementar, planos de saúde, seguros e resseguros (palavras-chave de sua dissertação, segundo a mesma plataforma citada) certamente se conectam ao fato de Weintraub ter iniciado, em 2015, na mencionada universidade, o Centro de Estudos em Seguridade.
Foi também membro do comitê de trading da BM&F Bovespa e um resumo de seu currículo também pode ser acessado em seu perfil no LinkedIn. O dito centro de pesquisa, ligado à Unifesp, possui um site, aparentemente não atualizado desde 2016, definindo-se como "uma associação civil sem fins lucrativos", fundada "por professores dos cursos de Atuária e Contabilidade" da mesma universidade paulista. Sua missão seria a "excelência científica e técnica em Seguridade", promovendo pesquisas, cursos e eventos relacionados a esta temática. Weintraub deu uma entrevista, em 2016, fazendo duras críticas à proposta de reforma previdenciária feita pelo governo Michel Temer. Cogitou-se, no fim de 2018, que Abraham Weintraub assumisse a articulação pela reforma da Previdência.
Na sua formação e trajetória políticas não constam quaisquer informações de atuação no campo educacional. Assim como seu irmão Arthur, Abraham Weintraub apoiou a campanha de Marina Silva (Rede) em 2014, aproximando-se de Bolsonaro através do ministro Onyx Lorenzoni depois de seminário realizado em 2017 sobre a Previdência.
Em entrevista por e-mail ao jornal O Estado de S. Paulo, alguns pontos dessa aproximação com o atual presidente são detalhados, tais como uma resistência inicial seguida de um apoio desde o lançamento de sua pré-candidatura, passando por conflitos com estudantes depois de ter declarado fazer parte da campanha do então candidato do PSL, além de um marcado teor ideológico que evidencia algumas de suas falas sobre sua mudança de apoio de Marina Silva para Bolsonaro.
Em termos ideológicos, Abraham Weintraub aproxima-se muito da postura de Vélez Rodríguez, seu antecessor. Adepto do pensamento olavista, teve a sua indicação chancelada pelo próprio escritor e ideólogo de extrema direita, o qual, segundo a coluna Painel, da Folha, ainda cobrou a realocação de seus alunos no ministério.
O novo ministro compartilha, por exemplo, da teoria conspiratória de que as universidades estariam tomadas pelo "marxismo cultural", conceito de existência contestada quase unanimemente pela academia, e fala ainda sobre os riscos do "Foro de São Paulo", embora o mesmo se trate de um agrupamento de partidos de tamanho e influência limitadas, entre outros pontos.
Levando em conta que a educação é um front dos mais importantes da guerra cultural empreendida pela extrema-direita, a escolha de Abraham Weintraub vem como uma sequência dela no governo Bolsonaro. Mais que em qualquer outra pasta, é no MEC que se vê a maior penetração do olavismo.
Imagina-se que Weintraub, com sua inserção no mercado financeiro, cause expectativas diversas nos especialistas em políticas educacionais. Daniel Cara, coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, foi categórico ao declarar ao portal G1, em entrevista, que a escolha do professor da Unifesp seria combinar o olavismo com uma agenda privatista do ensino.
Tales Faria, blogueiro do UOL, define o novo ministro como uma mistura de Paulo Guedes com Olavo de Carvalho, evidenciando seu perfil político-ideológico que articula a agenda neoliberal do primeiro com o anti-intelectualismo e anti-esquerdismo conspiratório do segundo. Essa linha, segundo quatro especialistas ouvidos pelo InfoMoney, pode indicar uma demonstração de força da base de Bolsonaro, derrubando especulações de uma indicação partidária – que iria de encontro ao seu discurso de "nova política" – e também um aceno a bases mais ideologizadas do bolsonarismo.
Em termos de articulação política, é difícil traçar qualquer prognóstico quanto à indicação do novo ministro. A princípio, ao menos se espera alguma pacificação no clima ruim que marcou o MEC em termos de repercussão pública durante os dias em que lá esteve Vélez Rodríguez, período em que a pasta ficou marcada por enorme imobilismo e polêmicas ligadas à feição ideológica de sua condução – que, ao que tudo indica, pode também ser característica da gestão de Weintraub.
*Igor Tadeu Camilo Rocha é mestre e doutorando em História pela Universidade Federal de Minas Gerais.
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