A vitória do governo Temer com a PEC 241 Com uma base parlamentar bem alimentada por cargos e ciente de que pode perdê-los, o governo Temer obtém uma vitória significativa com a PEC dos gastos

O Presidente Michel Temer,na semana passada.Ele afagou parlamentares para vencer na PEC dos gatos (Foto: Bria Webb / Reuters)Tempo

A vitória do governo Temer com a PEC 241

Com uma base parlamentar bem alimentada por cargos e ciente de que pode perdê-los, o governo Temer obtém uma vitória significativa com a PEC dos gastos

BRUNO BOGHOSSIAN, COM TALITA FERNANDES
21/10/2016 - 15h23 - Atualizado 21/10/2016 20h43
O Presidente Michel Temer,na semana passada.Ele afagou parlamentares para vencer na PEC dos gatos (Foto: Bria Webb / Reuters)
O presidente Michel Temer brincou com Eliseu Padilha quando o painel da Câmara exibiu 366 votos a favor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que estabelece um teto de gastos para o governo durante os próximos 20 anos. “Você continua bom de números”, disse ao ministro da Casa Civil, que havia garantido uma margem de 360 a 380 deputados a favor da proposta. Não era futurologia. A vitória era esperada. Os principais partidos aliados entregaram 90% de seus votos à PEC, a medida de uma base de sustentação controlada.
>> PEC 241: Tudo sobre o teto de gastos
Temer assistira à votação pela TV no gabinete presidencial, ao lado de Padilha, do ministro Geddel Vieira Lima, da Secretaria de Governo, e de outros auxiliares. Assim que a vitória foi confirmada, Geddel se levantou e foi até um canto do gabinete telefonar. Temer estalou os dedos duas vezes para interrompê-lo. Geddel pediu um minuto ao interlocutor, cobriu o celular com uma das mãos e explicou: “Estou agradecendo aos líderes”. Temer retrucou: “Sim, mas eu quero falar com eles”. Assim o fez. Temer pegou o telefone, teceu elogios ao desempenho de uma dezena de aliados, desde Baleia Rossi, que lidera os 67 deputados do PMDB, até Junior Marreca, do diminuto Partido Ecológico Nacional, chefe de uma bancada que caberia no banco traseiro de um táxi.
Temer ficou no gabinete até a 1h30 da manhã para acompanhar a votação. Durante o dia, ele e seus auxiliares mantiveram um monitoramento direto dos deputados da base. Em certos momentos trataram de convencer alguns que ameaçavam votar contra o governo. O deputado Jair Bolsonaro e o filho Eduardo, do PSC, estavam rebeldes. Foram ao Planalto reclamar a Padilha que a PEC prejudicava o orçamento das Forças Armadas, base eleitoral da família, e se sentiam impelidos a não apoiar a proposta. O ministro levou a dupla imediatamente ao gabinete presidencial para uma conversa com Temer. Horas depois, os dois votaram “sim”. Padilha também chamou ao Planalto, por volta do meio-dia, o deputado Marcos Rogério, do Democratas de Rondônia, depois de perceber que ele estava em Brasília, mas não registrara presença no plenário. Posaram para fotos em uma reunião que discutia investimentos no setor portuário, que Rogério publicaria em seu site no dia seguinte. O parlamentar votou a favor da PEC.
>> PEC do teto de gasto é indispensável, mas insuficiente para sairmos da crise
Além de afagar, com a tradicional doação de prestígio de Temer a alguns poucos como os Bolsonaros, o governo fez ameaças. Transmitiu aos partidos aliados a mensagem de que o apoio será recompensado com a consolidação dos espaços – cargos – já ocupados no governo, enquanto as traições serão punidas. “Quem participa do governo tem de apoiar o governo. Quem quiser ficar só com o bônus não pode participar do governo”, diz Geddel. “O que nós queremos é corresponsabilidade. Para isso faremos uma discussão exaustiva das matérias que serão votadas.” Geddel não enxerga nisso um bicho comum na política, chamado fisiologismo. “A ocupação de cargos é absolutamente natural e democrática, vamos furar esse tumor”, diz. “O que eu não admito é que alguém chegue aqui com a faca no pescoço.” Em outras palavras, Geddel quer evitar os agressivos que fazem exigências quando o governo está em maus lençóis. Quando montou seu ministério, em maio, Temer pensou, de início, em uma equipe de notáveis. Perguntou ao PP, por exemplo, se aceitaria apadrinhar a indicação do cirurgião paulista Raul Cutait ao valioso Ministério da Saúde. O PP ofereceu o deputado Ricardo Barros. Muitos fizeram o mesmo. Temer decidiu lotear a Esplanada entre a base, em busca de supremacia no Congresso. No caso do PP, desde então as conversas entre o Planalto e a bancada sobre votos e cargos passaram a ser cristalinas. O PP deu 41 votos a favor da PEC e apenas dois contrários.
O ministro Geddel Vieira Lima em seu gabinete (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress)
Uma das cotadas para sofrer punições por não cumprir o combinado deverá ser a deputada Professora Dorinha, do Democratas do Tocantins, única parlamentar do partido a votar contra a PEC. Temer quer dar uma punição “educativa” e exonerar seus apadrinhados no governo federal. No dia seguinte à votação, o ministro Fernando Filho, de Minas e Energia, foi chamado ao Palácio para uma conversa com Geddel. Os dois discutiram o destravamento de indicações políticas para estatais do setor elétrico, que irritava o PSB. O partido havia negado dez de seus 32 votos à aprovação da PEC. Temer ainda conversou na quarta-feira por telefone com o governador de Pernambuco, Paulo Câmara, do mesmo partido. Não era segredo que o governador orientara os pernambucanos a votar contra.
Apesar de a vitória na votação da PEC refletir um sucesso significativo do novo governo, Temer precisará equilibrar a forte reação negativa à medida por parte das corporações, como o Ministério Público Federal, que antes da votação considerou a PEC inconstitucional. O documento não foi assinado pelo procurador-geral, Rodrigo Janot, mas pelo secretário de Relações Institucionais do órgão, Peterson de Paula Pereira. No Palácio, foi lido como uma defesa meramente corporativista, e o silêncio de Janot sobre o assunto interpretado como apoio velado. Assessores de Temer se queixaram. Um emissário do MP disse que nem toda a categoria concordava. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, que antagonizou recentemente com o MP por causa da Operação Lava Jato, repetiu a postura. “Foge ao meu alcance, talvez seja [uma opinião] muito elevada para a minha inteligência. [A União] deve se endividar para pagar os ricos procuradores da República? Ou significa que uma área pode sofrer cortes e outras não?”, ironizou.
O momento simbólico da vitória de Temer foi o jantar de domingo no Palácio da Alvorada. Antes da refeição, os economistas Armando Castelar e José Márcio Camargo fizeram uma exposição didática sobre a PEC 241 – a mostrar que a medida não é um coelho tirado da cartola, mas praticamente um consenso na academia brasileira. Agora Temer pretende ser uma cola personalíssima da coalizão governista a tentar formar um legado de seu curto governo, de olho na sobrevivência e, eventualmente, se tudo certo, até em sua sucessão. “Ainda estamos longe de 2018, mas, se o governo for um sucesso, a próxima candidatura presidencial vitoriosa sairá dessa base aliada”, diz o ministro Geddel. “E o apoio do atual presidente será importantíssimo.” A empolgação é normal. Mas a PEC ainda precisa ser votada novamente na Câmara e duas vezes no Senado, um caminho que só deverá se encerrar perto do fim do ano. Ainda falta muito para o governo ter confiança para submeter a base a testes de maior estresse, com a reforma da Previdência. Um tema tão espinhoso precisará de mais do que o sistema que combina fidelidade fisiológica com punição a eventuais traidores no plenário.
copiado http://epoca.globo.com/tempo/noticia

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Postagem em destaque

Ao Planalto, deputados criticam proposta de Guedes e veem drible no teto com mudança no Fundeb Governo quer que parte do aumento na participação da União no Fundeb seja destinada à transferência direta de renda para famílias pobres

Para ajudar a educação, Políticos e quem recebe salários altos irão doar 30% do soldo que recebem mensalmente, até o Governo Federal ter f...