Em artigo publicado neste domingo, os procuradores Deltan Dallagnol e
Orlando Martello, integrantes da Lava Jato, condenaram a iniciativa de
deputados e senadores que pretendem anistiar o crime de caixa dois, no
momento em que a delação da Odebrecht ameaça vários políticos, como José
Serra, que recebeu R$ 23 milhões na Suíça; "Prepara-se o terreno para,
em evidente desvio de finalidade, aprovar projetos de abuso de
autoridade, de obstáculos à colaboração premiada, de alterações na
leniência e de anistia ao caixa dois", dizem eles; "Se forem aprovados
projetos como os mencionados, seguiremos o caminho da Itália, que lutou
contra a corrupção, mas perdeu"
Dallagnol condena anistia ao caixa dois político
Em artigo publicado neste domingo, os procuradores Deltan Dallagnol e Orlando Martello, integrantes da Lava Jato, condenaram a iniciativa de deputados e senadores que pretendem anistiar o crime de caixa dois, no momento em que a delação da Odebrecht ameaça vários políticos, como José Serra, que recebeu R$ 23 milhões na Suíça; "Prepara-se o terreno para, em evidente desvio de finalidade, aprovar projetos de abuso de autoridade, de obstáculos à colaboração premiada, de alterações na leniência e de anistia ao caixa dois", dizem eles; "Se forem aprovados projetos como os mencionados, seguiremos o caminho da Itália, que lutou contra a corrupção, mas perdeu"
247 – Em
artigo publicado neste domingo, os procuradores Deltan Dallagnol e
Orlando Martello, integrantes da Lava Jato, condenaram a iniciativa de
deputados e senadores que pretendem anistiar o crime de caixa dois, no
momento em que a delação da Odebrecht ameaça vários políticos, como José
Serra, que recebeu R$ 23 milhões na Suíça.
Leia abaixo:
Lava Jato, de onde veio e para onde vamos
Por Deltan Dallagnol e Orlando Martello
A equipe da Lava Jato
formou-se para o combate a crimes financeiros e de lavagem de dinheiro
praticados por doleiros como Alberto Youssef. Jamais se imaginou,
inicialmente, topar com um esquema de corrupção.
Foi uma surpresa quando
se reuniram provas da lavagem de cerca de R$ 26 milhões ligados a um
contrato da refinaria Abreu e Lima. Meses depois, quando Paulo Roberto
Costa decidiu colaborar, sua narrativa foi estarrecedora: a confissão
foi muito além daquele contrato.
Propinas eram pagas nos
grandes negócios da Petrobras. Estávamos falando, como descobriríamos
mais tarde, de R$ 6,2 bilhões só de subornos, valor que seria
reconhecido pela estatal.
Mas as investigações -e o prejuízo aos cofres públicos- não pararam por aí.
Como observou o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, "onde você destampa tem alguma coisa errada".
Removidas as tampas,
emergiram propinas nas diretorias da Petrobras, nos ministérios do
Planejamento e da Saúde, na Caixa Econômica Federal e na Eletronuclear.
A sistemática era a
mesma. Dirigentes eram escolhidos por partidos e políticos com o
compromisso de arrecadar propinas. Currículos e critérios técnicos
ficaram em segundo plano.
Nesse esquema,
empresários pagavam agentes públicos (dirigentes e políticos) por meio
de operadores financeiros, que faziam o dinheiro sujo chegar com
aparência limpa aos destinatários.
Até o momento, em
primeira instância, as investigações levaram a 52 acusações contra 241
pessoas, por crimes como corrupção, lavagem e organização criminosa.
Dentre elas, 110 foram
condenadas a penas que ultrapassam mil anos de prisão. O ressarcimento
soma mais de R$ 3,6 bilhões -antes da Lava Jato, virtualmente nenhum
caso recuperou mais de R$ 100 milhões, e a regra é não reaver um tostão
sequer.
No entanto, talvez o
maior impacto da Lava Jato tenha sido a responsabilização igualitária
dos criminosos, pouco importando cargo ou bolso. Perseguiu-se a "grande
corrupção", aquela que deslegitima as instituições e até então era imune
ao Judiciário.
A corrupção de que
tratamos afeta a eficiência da gestão pública, drena recursos de
serviços essenciais, desequilibra o processo democrático e violenta os
princípios republicanos.
É a corrupção que mata
pela fila do SUS, pela falta de manutenção das estradas, que nutre a
violência pela ausência de políticas públicas e que atrasa o país pela
deficiência da infraestrutura.
Como o mensalão, a Lava
Jato tem se mostrado excepcionalmente diferente em relação à impunidade.
É a exceção que confirma a regra.
Precisamos reconhecer que
o relativo sucesso é fruto de uma multidão de fatores, que incluem um
trabalho coordenado, inovador e profissional de vários órgãos, o
amadurecimento de leis e instituições e... muitos lances de sorte. Foi
valioso ainda o apoio da sociedade.
O avanço se deu sobre um tripé formado por colaborações premiadas, cooperações internacionais e transparência.
As delações -sempre ponto
de partida, jamais de chegada- permitiram a expansão exponencial da
investigação. Embasaram buscas e apreensões, colheita de depoimentos e
quebras de sigilo fiscal, bancário e telefônico; as transações bancárias
rastreadas somam mais de R$ 1 trilhão.
As cooperações
internacionais -mais de 120 intercâmbios com 34 países- permitiram
alcançar documentos de contas secretas no exterior usadas há décadas.
Por fim, a realização de
entrevistas coletivas, o lançamento do primeiro website de um caso
criminal do país, a assistência de assessores de comunicação e a
publicidade dos processos eletrônicos garantiram o que Albert Meijer
denominou transparência virtual, facilitando o acesso à informação, o
acompanhamento da investigação e, principalmente, propiciando o controle
social.
O debate transcendeu o meio jurídico e, para nossa sorte, ganhou o gosto popular.
O acervo probatório
produzido é imenso. Como a usual tática dos investigados de negar os
fatos já não funcionava, passaram a difundir a falsa ideia de abusos na
Lava Jato.
Tal noção não se
sustenta. Foram feitas somente prisões excepcionalmente necessárias.
Apenas 9% dos acusados estão presos -e só 3% estão encarcerados sem
condenação.
Diante da inusitada
perspectiva de punição, a colaboração passou a ser a melhor estratégia
de defesa: 70% delas foram feitas com réus soltos, e diariamente
recusam-se novos acordos por não se vislumbrar ganho efetivo.
Observe-se ainda que, se
"abusos" ou "excessos" existissem, os tribunais os corrigiriam. Mesmo
contestados por grandes bancas advocatícias em três cortes, os atos do
juiz Sergio Moro foram confirmados em mais de 95% dos casos.
Alega-se também que as
investigações são partidárias. Outro disparate! Além de as equipes de
procuradores, delegados e auditores terem sido formadas, em grande
parte, antes de se descobrirem os crimes na Petrobras, trata-se de
dezenas de profissionais de perfil técnico, sem histórico de vínculo
político.
A alegada perseguição é o mantra da defesa política quando a defesa jurídica não prospera.
Verdade que os partidos
mais atingidos na Lava Jato são PT, PP e PMDB. No Supremo, dentre os 17
políticos acusados, 9 são do PP, 4 do PMDB, 3 do PT e 1 do PTC.
Contudo, isso não ocorre
por escolha dos investigadores, e sim porque as indicações de dirigentes
de órgãos federais se dão pelo partido no poder ou sua base aliada.
Assim, os cargos de diretoria da Petrobras foram ocupados por essas
legendas, e não pela oposição ao governo petista.
O ataque mendaz à
credibilidade da Lava Jato e dos investigadores tem um propósito.
Prepara-se o terreno para, em evidente desvio de finalidade, aprovar
projetos de abuso de autoridade, de obstáculos à colaboração premiada,
de alterações na leniência e de anistia ao caixa dois.
O Brasil, quarta nação mais corrupta do mundo segundo ranking do Fórum Econômico Mundial, está numa encruzilhada.
Se forem aprovados
projetos como os mencionados, seguiremos o caminho da Itália, que, nas
palavras de um procurador da Mãos Limpas -operação da década de 90
semelhante à Lava Jato-, lutou contra a corrupção, mas perdeu.
O Brasil, porém, pode
seguir os passos de Hong Kong, nos anos 1960 considerado o lugar mais
corrupto do mundo. Após um escândalo na década seguinte, realizaram-se
reformas e, hoje, é o 18º país mais honesto no ranking da Transparência
Internacional (o Brasil está na 76ª posição).
A história do Brasil é
também uma história de fracassos na luta contra a corrupção. Casos como
Anões do Orçamento, Marka Fonte-Cindam, Propinoduto, Banestado, Maluf,
Castelo de Areia, Boi Barrica e tantos outros caíram na vala comum da
impunidade.
A corrupção tem alto custo ao país. Temos de fechar essas brechas por onde escapam os ladrões e o dinheiro público.
Alterações legislativas,
como a reforma política e as dez medidas contra a corrupção, sanam
problemas estruturais e podem nos pôr no rumo de Hong Kong, o que
recomenda seu debate, aperfeiçoamento e aprovação pelo Congresso.
É importante, ainda, incentivar controles sociais e que os cidadãos, bem informados, repilam os políticos desonestos pelo voto.
É impossível reduzir o
nível de corrupção a zero, mas estamos no polo oposto. A grande
corrupção tem de ser extirpada para surgir um Brasil competitivo,
inovador, igualitário, democrático, republicano e, sobretudo, orgulhoso
de si.
A sociedade tem de
reagir. Parafraseando Martin Luther King, estamos rodeados da
perversidade dos maus, mas o que mais tememos é o silêncio dos bons.
Dallagnol e Martello são procuradores e integrantes da Lava Jato
copiado http://www.brasil247.com/pt/24
Nenhum comentário:
Postar um comentário