Brasil
Trump brasileiro e bispo da IURD ganham São Paulo e Rio
Partido dos Trabalhadores, de Dilma Rousseff e Lula da Silva, perdeu 60% dos prefeitos nas municipais deste domingo
É
empresário, é milionário, pinta o cabelo e apresentou o reality show O
Aprendiz. Não se pode deixar de pensar em Donald Trump quando se fala de
João Doria, o novo prefeito de São Paulo, que ganhou, pela primeira vez
na história, na primeira volta a eleição na cidade nas municipais de
domingo no Brasil, sustentado no discurso "eu não sou político, sou um
gestor". Na segunda cidade do país, o Rio de Janeiro, o vencedor da
primeira volta foi o bispo da Igreja Universal (IURD) Marcelo Crivella,
que vai defrontar dentro de 26 dias o candidato da extrema-esquerda
Marcelo Freixo. O PT, dos ex-presidentes Dilma Rousseff e Lula da Silva,
perdeu as eleições.
Doria, que
declarou uma fortuna de 200 milhões de reais (cerca de 55 milhões de
euros), lidera uma influente organização de empresários, um grupo de
comunicação e uma editora, que publica, entre outras, a revista Caviar
Lifestyle, além de, em 2010 e 2011, ter apresentado na TV Record a
versão brasileira de The Apprentice, que popularizou Trump. A vitória da
sua candidatura é, sobretudo, a vitória de Geraldo Alckmin, governador
do estado de São Paulo e pré-candidato à presidência em 2018 pelo PSDB,
que apostou nele contra a vontade de Fernando Henrique Cardoso e de José
Serra, barões do partido na cidade, consciente de que, numa fase em que
a população paulistana (e brasileira) rejeita os políticos
profissionais, um homem fora do sistema funcionaria - Doria obteve uns
notáveis 53%, número em que Alckmin espera surfar rumo ao Planalto.
Mas
Doria, que repetiu sem parar o lema "sou um empresário", é acusado
pelos rivais de ser tão político quanto eles. "Faz alianças, faz
orçamentos, logo é político", disse em entrevista ao DN Fernando Haddad
(PT), prefeito cessante que acabou num inútil segundo lugar.
"Não
faltaram vozes no interior do PSDB a profetizar que Alckmin ficara
maluco ao escolher um político desconhecido e difícil de fazer aceitar
na periferia por ser coxinha (equivalente a betinho, em Portugal),
escreveu a colunista do jornal O Estado de S. Paulo Vera Magalhães. "Mas
o "não sou político" de Doria colou: foi o mais votado em 56 das 58
zonas eleitorais", notou o especialista em sondagens José Roberto de
Toledo. No Rio, Marcelo Crivella, cantor gospel, bispo da IURD e
militante do Partido Republicano Brasileiro (PRB), braço político dos
evangélicos, vai defrontar Marcelo Freixo, do trotskista PSOL, deixando
para trás os candidatos apoiados pelos gigantes PSDB e PT e, mais
importante, o concorrente do Partido do Movimento da Democracia
Brasileira (PMDB), de Michel Temer, que vinha gerindo a cidade e o
estado do Rio.
Num total de quase seis
mil municípios, no entanto, o PMDB continua a ser a principal força
autárquica com 951 prefeituras, mais do que as 758 do PSDB e muitas mais
do que as 204 do PT, ultrapassado por seis partidos na eleição de
ontem, embora estes números estejam sujeitos a alterações após as
segundas voltas. "Quanto mais ódio se estimula contra mim, mais amor se
cria a meu favor", disse Lula, ao votar, perto de São Paulo. Ainda em
São Paulo, Michel Temer antecipou-se aos repórteres e votou quase
incógnito. Em Porto Alegre, a votação de Dilma foi marcada por tumultos.
O juiz da Lava-Jato Sergio Moro, em Curitiba, foi escoltado até à urna
por agentes da polícia.
VENCEDORES
Geraldo Alckmin
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Quando apostou em Doria contra a vontade dos barões do PSDB paulistano
José Serra e Fernando Henrique Cardoso, que preferiam o tradicional
Andrea Matarazzo, chamaram-lhe kamikaze. Pois o governador de São Paulo
arriscou mas ganhou: Doria foi eleito à primeira volta e o PSDB passeou
noutras cidades do mais rico e populoso estado do país que, pelos
vistos, Alckmin controla como ninguém.
PSOL
›
QContinua um micropartido com três prefeitos eleitos no país todo, mas o
segundo lugar de Marcelo Freixo no Rio, afastando da corrida o
candidato do partido no poder a nível local e nacional, o PMDB, foi
simbólico. "Fora Temer", "abaixo o partido golpista", disse Freixo após
os resultados, roubando os holofotes e o discurso que pertenceriam ao
PT. Com um grupo parlamentar ativo e bem avaliado, forte implantação na
classe média das principais cidades - defendendo causas LGBT ou
liberalização de drogas leves - o PSOL pode ser um protagonista à
esquerda em 2018.
VENCIDOS
Partido dos Trabalhadores
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Terceira força nas eleições de 2012, com 638 prefeitos eleitos, passou a
10ª, com meros 204 (números provisórios). Venceu à primeira volta em
apenas uma das 26 capitais estaduais - Rio Branco - e está na segunda
noutra - Recife. Em São Paulo, o segundo lugar de Haddad não serviu
porque Doria passou dos 50%. No Rio, viu o candidato do PSOL passar à
segunda volta a empunhar a bandeira da esquerda. No Nordeste, onde Lula é
venerado, o PT quase desapareceu.
Michel Temer
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Nas cidades cujos argumentos municipais mais se confundem com os
nacionais, São Paulo e Rio, o PMDB de Temer perdeu. Na primeira, Marta
Suplicy, aposta pessoal do presidente, ficou em quarto lugar. Na
segunda, o candidato da continuidade, Pedro Paulo, ficou em terceiro.
Com agenda impopular - austeridade, reforma na Segurança Social - e sem a
legitimidade do voto, Temer andou escondido na primeira volta e assim
continuará na segunda.
Em São Paulo
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