Crise financeira Queda de receita já atinge pagamento do funcionalismo em nove Estados O que explica a quebradeira nas contas dos Estados em 2016? Para especialistas, erros de gestão contribuíram para crise nos Estados

Crise financeira Queda de receita já atinge pagamento
do funcionalismo em nove Estados

  • Para especialistas, erros de gestão contribuíram para crise nos Estados
    Carlos Madeiro
    Colaboração para o UOL, em Maceió

    • COELHO/FRAMEPHOTO/FRAMEPHOTO/ESTADÃO CONTEÚDO
      No Rio, o governo havia quitado, até o último dia 18, apenas o pagamento de outubro de 85% dos servidores
      No Rio, o governo havia quitado, até o último dia 18, apenas o pagamento de outubro de 85% dos servidores
    A crise financeira que afeta os Estados levou os governos a adotar medidas que afetaram o pagamento de servidores em pelo menos nove unidades da federação. Entre as medidas estão as demissões de funcionários; atraso, escalonamento ou parcelamento nos salários; redução de vencimentos do primeiro escalão e a falta de reposição anual da inflação.
    Nos casos mais graves até agora, os governos de Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul tomaram medidas drásticas e decretaram estado de calamidade pública, após cortes de gastos e atrasos em salários. Ambos alegam que estão falidos e pedem socorro federal.
    No Rio, o governo havia quitado, até a sexta-feira (18), apenas o pagamento de outubro de 85% dos servidores. O salário está sendo pago em sete parcelas.  Até o dia 5 de dezembro, o Estado promete fazer outros quatro depósitos quitando os débitos, desde que não haja bloqueio das contas.

    No Rio Grande do Sul, além de problemas em pagar salários, o governo diz que não há perspectiva de depositar o 13º do funcionalismo.
     O governo também anunciou um pacote de medidas que preveem a privatizações, extinção de órgãos e demissão de servidores.
    Os Estados da Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Espírito Santo, Tocantins, Paraná, Pará, Alagoas, Amazonas, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Piauí, Rondônia, Acre, São Paulo e Pernambuco, além do Distrito Federal, mantiveram o calendário de pagamento, embora alguns deles enfrentem alguma dificuldade ou tenham implementado medidas de controle de gastos.

    Salários divididos ou escalonados

    A crise levou o governo de Minas Gerais a mudar a tabela de pagamento. O novo calendário --anunciado em outubro-- criou o parcelamento dos salários de quem ganha mais de R$ 3 mil em três vezes. Em dezembro, por exemplo, os pagamentos serão feitos entre os dias 12 e 23. Já os servidores que ganham até R$ 3 mil vão receber o salário no oitavo dia útil em dezembro (dia 12). O pagamento do 13º e calendário para 2017 ainda serão definidos.
    Segundo o governo, a folha custa R$ 3 bilhões ao mês, e por conta da crise, não foi possível conceder reajustes -- a data-base dos servidores era 1º de outubro. "Estamos tentando de todas as maneiras superar essa fase mais difícil das finanças do Estado, afetando o mínimo possível a vida dos servidores. Essa escala é a forma que encontramos para penalizar menos quem ganha menos", afirmou o secretário de Planejamento e Gestão, Helvécio Magalhães.
    No Rio Grande do Norte, o governo também está pagando os salários de forma fracionada, com intervalos também extensos. Os servidores da educação e dos órgãos que possuem receita própria são os únicos que recebem dentro do mês trabalhado. Até o dia 11 do mês subsequente, são pagos os demais que recebem até R$ 4 mil. Já os servidores das faixas maiores estão recebendo em datas não fixas, sempre no fim de cada mês. "A mudança na tabela de pagamento ocorre em virtude dos efeitos da crise econômica que continua atingindo fortemente as finanças do Rio Grande do Norte. A frustração acumulada de receitas até 30 de setembro chegou a R$ 367 milhões se comparada ao previsto no orçamento para 2016", afirma o governo.
    No Amapá, os servidores recebem o salário em duas parcelas desde março. Em novembro, por exemplo, 40% dos vencimentos finais dos servidores foram pagos no dia 10. O Tribunal de Justiça julgou no mesmo dia uma ação do MP (Ministério Público Estadual) e decretou ilegal a divisão dos salários e determinou pagamento integral. O governo justificou a divisão dos salários por conta das perdas de quase R$ 600 milhões em 2016 e disse que iria procurar reverter a decisão. "Os repasses do FPE [Fundo de Participação dos Estados] têm sido insuficientes para cobrir o valor da folha de pagamento estadual e honrar as dívidas", informou.
    Em Roraima também há salários pagos de forma escalonada entre os servidores e, em nos casos dos maiores vencimentos, o valor ainda é repartido. A divisão dos valores atingiu os que ganham entre R$ 1.251,00 e R$ 5.999,00 --que no mês passado receberam os salários nos dias 11 e 30. Os que ganham até R$ 1.250 receberam em uma só parcela. Já os servidores que recebem a partir de R$ 6.000 receberam apenas em novembro os salários referentes a setembro.
    "O Estado sofreu perda de mais de R$ 107 milhões de FPE. Esse déficit aumenta com o repasse do duodécimo aos Poderes, cujo valor de R$ 52 milhões, é fixo e não sofre a variação de queda do FPE. Com isso, o caixa do Tesouro tem frustração acima de R$ 150 milhões, o que compromete o andamento da máquina, com pagamentos de despesas e investimentos, afetando, agora, a folha de pagamento dos servidores", informou o Estado.
    Em Sergipe, os salários --que eram pagos dentro do mês trabalhado-- começaram a ter pagamento mais tardio. Este mês, por exemplo, os vencimentos dos servidores foram depositados de forma escalonada entre categorias, com conclusão no dia 11.
    Em Goiás, o governo também está pagando os servidores em duas etapas: até o último dia do mês trabalhado recebem os que ganham até R$ 3,5 mil. Até o décimo dia do mês seguinte, são pagos os servidores que recebem acima desse valor.
    No Mato Grosso, o governo adotou pagamento de forma escalonada desde abril. Em outubro, apenas os funcionários com remuneração líquida de até R$ 3 mil receberam no último dia do mês. Os demais, receberam no último dia 10. O percentual de servidores que demoraram a receber o salário aumentou, já que para folha de setembro o escalonamento atingiu apenas o que recebiam mais de até R$ 6 mil.

    Problemas, mas sem mudar calendário

    Em Alagoas, o pagamento de servidores não mudou na atual gestão, mas os salários são pagos em duas faixas: a primeira, que inclui os menores vencimentos, no último dia útil do mês; enquanto os salários acima de R$ 2.500 são pagos no dia 11. O Estado também não concedeu o reajuste anual, previsto por lei para maio, a nenhuma categoria.
    No Acre também não houve atraso. Mas, em julho, o governador Tião Viana (PT) reduziu o seu salário e o dos secretários em 20%. No ano passado, o número de cargos comissionados foi cortado em 30%. Segundo Viana, o Estado perdeu mais de R$ 300 milhões em receita este ano em repasses do governo federal.
    Em Rondônia, os servidores receberam o salário de outubro no dia 27, porém, em 2016, não houve reajuste. "No cenário econômico atual não vislumbra crescimento na receita e, portanto, inviabiliza qualquer medida que aumente os gastos públicos", informou, em junho.
    No Tocantins, o governo anunciou, no último dia 10, a demissão de aproximadamente 2.000 servidores, entre comissionados e contratados --o que deve dar uma economia de R$ 136,6 milhões nos próximos dois anos. No mesmo dia, um outro decreto, reduziu a jornada dos servidores de oito para seis horas até o dia 30 de abril de 2017.

    O que explica a quebradeira nas contas dos Estados em 2016?

    Carlos Madeiro
    Colaboração para o UOL, em Maceió

    • Mauro Pimentel/Folhapress
      Servidores protestam no Rio, um dos Estados que enfrenta problemas financeiros Servidores protestam no Rio, um dos Estados que enfrenta problemas financeiros
    Professores consultados pelo UOL afirmam que a crise financeira dos Estados é fruto de uma soma de erros cometidos pelos gestores associados à queda de receita verificada nos últimos três anos por conta da recessão nacional. A combinação tornou uma espécie de "tempestade perfeita" para a área econômica de unidades da Federação.
    Segundo o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e professor do Instituto Brasiliense de Direito Público, José Roberto Afonso, a crise é multifatorial e muito grave. "Na conjuntura, é a pior recessão da história, com crise de crédito; isso arrasa a arrecadação pública, e a inflação baixa impede um ajuste de gasto", diz.
    Para ele, todas as esferas de governo sofrem, mas os Estados são mais afetados por questões estruturais. "Do lado da receita, o ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços] virou um imposto obsoleto e o FPE [Fundo de Participação dos Estados] partilha uma base cada vez mais fraca; do lado do gasto, a Previdência dos servidores é uma bomba relógio com prazo mais curto para explodir que a do regime geral (INSS); e do lado da dívida, os estados se endividaram além da possibilidade de pagar, sempre sob bençãos do Tesouro Nacional", afirma.
    Nessa conjuntura, Afonso afirma que o atraso de salários é inevitável. "Só governo federal escapa porque ele pode emitir moeda, títulos e medida provisória. Estados e prefeituras, quando não podem se financiar em bancos, o fazem atrasando pagamentos, de fornecedores até servidores", diz
    Para o professor, a saída passa por vários fatores que estariam ligados a fazer o dever de casa, e não esperar recursos federais. "Tem de mudar tudo que fizeram até aqui, ajustar e reestruturar. É preciso agir em conjunto, a crise é de todos. Falta um 'check up' da saúde fiscal dos governos, as contas públicas viraram um faz de conta. Será preciso coragem e estímulo para se promover um ajuste vigoroso e longo. Também será preciso reformar o sistema tributário, a administração pública, a Previdência... É uma ilusão achar que uma única e genérica medica seja suficiente para enfrentar crise tão grande", alega.
    Alexandre Chaia, professor do Insper, acredita que, em regra, a queda de receita foi a gota d'água para a crise. "Os Estados estavam numa ascendente de receita, com comércio em alta, e desde 2013 a economia desacelerou. A quantidade de vendas do varejo caiu, a chegada de novas indústrias foi diminuindo. Isso ocorreu em todos os Estados", diz.
    Entretanto, para o especialista, as apostas e investimentos acima da capacidade levaram alguns Estados a terem mais prejuízos. "Alguns Estados expandiram demais os gastos, além de inchar demais a folha; tudo achando que o crescimento era contínuo. Sem dúvida houve um erro de gestão. O primeiro erro foi achar que a receita era contínua. É preciso consolidar receita, mas anteciparam as contratações. O segundo erro foi a desoneração que o governo Dilma incentivou, em vez de fazer o ajuste fiscal", explica.
    Ainda de acordo com Chaia, entre os Estados em crise severa, a melhor perspectiva está no Rio de Janeiro. "Ele tem mais facilidade pela recuperação possível da Petrobras. Se em 2017 a empresa voltar a ter um crescimento um pouco mais sustentável, o Rio terá uma melhora. Diferente de Rio Grande do Sul e Minas Gerais, por exemplo, que não há evento de curto prazo para recuperação", sentencia.
    copiado  http://noticias.uol.com.br/politica/

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