A Alemanha foi um dos países que o ministro grego visitou na última semana. Ao longo do périplo, foi colocando
posts
na sua conta de Twitter, que tem, atualmente, mais de 200 mil
seguidores. Pelas ruas da capital grega é cumprimentado como se fosse um
herói dos videojogos da empresa norte-americana - Valve Corporation -
de que durante algum tempo foi consultor. À porta do Ministério das
Finanças, como ontem aconteceu, os jornalistas esperam-no para mais uma
declaração e ele lá vai falando, enquanto caminha, de mochila às costas,
em direção ao seu gabinete. "Uma camisa apropriada para o Wetherspoon e
um casaco próprio de um traficante de droga Madchester dos anos 1990",
escreveu, no
The Guardian, a consultora de moda Imogen Fox,
referindo-se primeiro à rede de bares com aquele nome no Reino Unido e
depois ao movimento de rock alternativo de Manchester.
Mas quem
conhece bem o governante grego não se surpreende minimamente com o seu
estilo: "Há uma coisa que ninguém sabe, que pode surpreender, é que
Yanis era o secretário da associação de estudantes negros", contou ao
The Independent
Monojit Chatterjee, que supervisionou a tese de doutoramento em
Economia de Varoufakis na Universidade de Essex e ficou amigo dele.
"Quando lhe perguntaram o que é que ele fazia ali, respondeu que negro
era um termo político e que, como grego, em termos de etnicidade, ele
tinha tantos motivos para estar ali como qualquer outra pessoa."
Vassilis Goulandris, um amigo da escola primária de Varoufakis, ouvido
pelo mesmo jornal, esclareceu que o ministro se veste "igual a si
próprio", admitindo, porém, que "essa é a sua maneira de desafiar os
outros e confrontá-los com os seus argumentos". Goulandris conta que o
antigo colega "se envolve de forma apaixonada em tudo o que consegue
fazer ao longo do dia, seja jogar voleibol, andar de bicicleta, tocar um
instrumento de teclas num grupo de música, fazer um discurso sobre
música contemporânea ou mesmo sobre política". A mesma energia é
relatada àquele diário por Nicholas Theodorakis, professor e economista
grego, com quem o ministro e a sua segunda mulher, a artista plástica
Danae Stratou, costumam passar férias. "Depois de um mergulho na
piscina, quando todos iam dormir uma sesta, o Yanis ia escrever algumas
palavras para um jornal ou para um
site, dar uma entrevista
pelo Skype, depois preparar um seminário ou um livro. Tentar acompanhar a
agenda dele faz-nos sentir exaustos", confessa, revelando que
Varoufakis gosta de ir ao ginásio, jogar basquetebol, cozinhar comida
tailandesa. E garante Theocarakis: "Ele gosta de improvisar. Não se
limita a seguir uma receita."
O ministro do Syriza conheceu a
atual mulher há dez anos, altura em que sofria pelo facto de a primeira
companheira, de origem australiana, ter levado a filha pequena para a
Austrália. "A minha pequena filha Xenia foi viver para a Austrália. Por
razões, que agora vejo serem legítimas, a mãe resolveu levá-la para
Sydney, onde vive, desde então, o que garante a minha relação com esta
cidade", escreveu no seu blogue Varoufakis, que pelo menos duas vezes
por ano viaja até à Austrália e tem dupla nacionalidade grega e
australiana. A artista Danae Stratou, de 50 anos, já tinha dois filhos
de uma relação anterior e é filha da conhecida artista grega Eleni
Potaga-Stratou. Já expôs em vários países e representou a Grécia na 48.ª
Bienal de Veneza. Com Varoufakis, criou em 2010 a plataforma Vital
Space e, antes disso, visitaram juntos sete das fronteiras mais
conflituosas do mundo - Palestina, Etiópia-Eritreia, Belfast, Chipre,
Caxemira e México - tendo a viagem resultado posteriormente na obra
CUT: 7 Dividing Lines.
Nos textos que escreve, o governante grego cruza, com à-vontade, as
teorias económicas de nomes como Karl Marx, John Maynard Keynes, David
Ricardo, Paul Samuelson, Adam Smith, com os enredos de livros como
A Guerra dos Mundos de H. G. Wells (1898) ou de filmes como
Matrix dos irmãos Wachowski (1999).
Autor de
O Minotauro Global: América, as Verdadeiras Origens da Crise Financeira e o Futuro da Economia Global ou
Uma Proposta Modesta para Resolver a Crise da Zona Euro, de 2011 e 2010,
Varoufakis foi, em março do ano passado, uma das personalidades
estrangeiras que subscreveram o manifesto pela reestruturação da dívida
portuguesa. Conselheiro económico do ex-primeiro-ministro grego George
Papandreou, do Pasok, com quem se incompatibilizou em 2006, o ministro
das Finanças grego escreveu
Uma Proposta Modesta com James K.
Galbraith e Stuart Holland. Este último é professor convidado da
Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, tendo sido conselheiro
de políticos como Andreas Papandreou, António Guterres ou Jacques
Delors.
O título da obra remete para alguma ironia ao ir buscar o
nome à sátira que Jonathan Swift escreveu em 1729 no âmbito da crise
económica irlandesa. Em
Uma Proposta Modesta para Impedir Que os
Filhos das Pessoas Pobres da Irlanda Sejam Um Fardo para os Seus
Progenitores ou para o País e para Torná-los Proveitosos ao Interesse
Público, Swift propõe, entre outras coisas, que os irlandeses
pobres vendam os seus filhos como comida aos cavalheiros e às senhoras
ricas. No seu documento, Varoufakis, Galbraith e Holland propõem um New
Deal para a Europa, que não requer a criação de novas instituições nem a
alteração das leis e dos tratados existentes na UE, não pressupõe
defaults nem uniões bancárias complexas ou o ficar à espera que, um dia, chegue o federalismo.
Sob pena de "uma
implosão da zona euro destruir a UE em tudo exceto no nome", os autores
pedem um New Deal europeu financiado pelo Banco Europeu de Investimento e
Fundo Europeu de Investimento, querem que o Mecanismo Europeu de
Estabilidade financie preferencialmente os bancos, que seja adotado um
mecanismo que coloque o rácio da dívida no limite de 60% do PIB
permitido pelo Tratado de Maastricht e que, caso um país tenha um valor
superior, como é o caso da Grécia, que esse diferencial seja convertido
em obrigações do Banco Central Europeu. O objetivo seria pôr um travão
ao que classificam de grave crise social e humana e libertar os países
do peso dos juros cobrados sob pressão dos mercados para fazer mais
investimentos. Apesar de tudo, Varoufakis, que no seu curriculum vitae de
13 páginas diz que já supervisionou mais de 300 teses e dissertações de
mestrado em cinco países ao longo das últimas três décadas, reconhece
no seu blogue: "Estas propostas não têm nenhuma hipótese, compreendo
agora, a menos que sejam postas em cima da mesa do Eurogrupo, do Ecofin e
do Conselho Europeu." Esse será o teste que ele e Alexis Tsipras
enfrentarão já na próxima semana, em Bruxelas, depois do périplo inicial
que fizeram. O ministro que se descreve como "um economista acidental"
confessa, mais uma vez, no seu blogue: "O meu maior medo, agora que
aceitei o desafio, é que possa transformar--me num político." Mas,
recuperando algo que em 2001 foi feito por Dick Cheney nos EUA, garante:
"Como antídoto para esse vírus, vou escrever a minha carta de demissão e
guardá-la no bolso, pronta para ser entregue assim que eu sinta
sintomas de que estou a faltar ao compromisso de dizer a verdade."
copiado http://www.dn.pt/inicio/globo/
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