Ministro Fux errou: Flávio Bolsonaro quer fugir da força da lei
"O STF limitou o foro privilegiado para crimes ocorridos durante o mandato ou relacionados com ele. Fux, acertadamente, votou pela limitação do foro privilegiado e agora decidiu algo contrário ao seu voto"
Roubar o Brasil acima de tudo. Queiroz acima de todos. Essa é a percepção da população em relação à decisão do ministro Fux que mandou suspender temporariamente a investigação de Queiroz, a pedido do senador Flávio Bolsonaro, que se valeu do “foro privilegiado” para escapar provisoriamente da lei. Não importa a ideologia nem o partido, a lei tem que valer contra todos (“erga omnes”). Lei e Ordem acima de todos e Ética Humanista acima de tudo.
E se a confiança for embora? Sarney e o seu “é dando que se recebe”. Collor com seu Fiat Elba e contas no Uruguai. FHC com a emenda da reeleição e as privatizações corruptas, que reforçaram o patrimonialismo do Estado gigante. Lula com o mensalão e o Petrolão, que acabou chegando na Dilma. Temer com suas relações promíscuas com JBS e o Porto de Santos. O novo governo está começando com Queiroz. Ou tudo isso se esclarece ou a credibilidade vai embora.
Cupins da República. Jair Bolsonaro, eu e tantos outros colegas do Parlamento fomos eleitos para destruir esses cupins da República. Não podemos frustrar o povo brasileiro, muito menos nossos eleitores.
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Onde foi que Fux errou? A investigação do Queiroz pelo Ministério Público do Rio de Janeiro versa sobre fatos ocorridos em 2016 e 2017. No máximo, até dezembro de 2018, quando explodiu o escândalo Queiroz. É de se supor que neste instante as propinas apropriadas dos funcionários tenham sido cessadas.
São fatos ocorridos antes do exercício do mandato de senador de Flávio Bolsonaro. Pela Constituição brasileira (art. 53), a partir da diplomação (que ocorreu em 18/12/18), Flávio já desfruta de foro privilegiado no STF. Isso não se discute. Um parêntese: temos que acabar com essa excrescência do foro privilegiado, que Jair Bolsonaro chamou de “porcaria”, o mais rápido possível.
Se os crimes teriam ocorrido antes do início do mandato (o mandato vai começar dia 1/2/19, com a posse), o STF não tem competência para apreciá-los. Foi aí que o ministro Fux errou! O STF limitou o foro privilegiado para crimes ocorridos durante o mandato ou relacionados com ele. Fux, acertadamente, votou pela limitação do foro privilegiado e agora decidiu algo contrário ao seu voto. Agiu fora da lei, ou seja, fora da jurisprudência do STF. Isso constitui um ato típico do estado de exceção, que é o oposto (o avesso) do Estado de Direito. Daí a sensação de que o Judiciário muitas vezes participa (consciente ou inconscientemente) da impunidade das roubalheiras dos pactos oligárquicos, que são diabólicos para a nação.
Crimes anteriores ao exercício do mandato não tem foro privilegiado. Na AP 937-QO o STF decidiu (em maio de 2018) que o foro privilegiado só vale para crimes cometidos durante o mandato ou relacionados a ele (em razão dele). Ora, se os crimes que possam eventualmente ser imputados a Flávio Bolsonaro são anteriores ao início do exercício do mandato de senador, é claro que eles não são da competência do STF.
Análise de cada caso concreto. Na AP 937 citada o STF deixou claro, no entanto, que tudo depende de cada caso concreto. A análise de cada caso é que decifra a questão do foro. Ora, isso só vale para crimes ocorridos durante o mandato ou relacionados a ele (em razão dele). Se se trata de crime anterior, é evidente que está fora da competência do STF. Foi por força de um salto triplo carpado (bem elaborado, diga-se de passagem) que Flávio Bolsonaro chegou no STF, violando a sua jurisprudência clara (crimes anteriores ao mandato não são da competência do STF).
Competência do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Como Flávio era deputado estadual na época dos fatos, a competência (por esses fatos anteriores ao exercício do mandato de senador) seria do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (jamais do STF). Por isso que o caso não podia ter chegado no STF. Por isso que a decisão do ministro Fux foi equivocada. Ele está usurpando função de outro tribunal. Mandou parar uma investigação (contra Queiroz e outras pessoas) sem ter competência para isso.
Informações do Coaf não significam quebra do sigilo bancário. Em outro equívoco incorreu o ministro Fux. Ele afirmou que suspendia a investigação porque o MP pediu informações ao Coaf relacionadas com Flávio Bolsonaro. O MP tem poderes para isso. O pedido de informações ao Coaf não é, ainda, ato investigativo. Daí a desnecessidade de ordem judicial. Flávio Bolsonaro ainda não está sendo investigado pelo MP. Só houve um pedido de informações ao Coaf. O Coaf é obrigado a prestar informações sobre operações bancárias suspeitas (artigo 1º, parágrafo 3º, inciso IV, da Lei 9.613/1998). Para se obter essas informações não é preciso ordem judicial, diz a jurisprudência do STJ (RMS 52.677). O MP não precisava de ordem judicial para pedir as informações ao Coaf. A colheita dessas informações não significa ato investigativo, sim, é ato preparatório para uma possível investigação. Relatórios do Coaf são “fontes de prova”, não prova. Quando alguma investigação for feita a partir dessas informações preliminares, ou seja, se for necessário quebrar algum sigilo bancário, aí sim impõe-se a autorização judicial. Não se pode confundir quebra do sigilo bancário com simples informações do Coaf. Também nesse equívoco incorreu o ministro Fux.
O que está envolvido no caso Queiroz? O seguinte: uma das tramoias das elites do poder consiste em alguns políticos se apropriarem do dinheiro público dos seus funcionários. Esquema “rachid” ou “pedágio”. Essa é a acusação que pesa contra vários deputados do Rio de Janeiro assim como contra Queiroz, que era assessor de Flávio Bolsonaro. Entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, R$ 1,2 milhão passou pelas suas contas bancárias de forma suspeita, segundo relatório do Coaf – órgão de fiscalização bancária do Estado. O Ministério Público está tentando passar tudo a limpo (o MP tem poderes investigatórios desde 2015, conforme o STF), mas Queiroz, sua família e Flávio não foram depor. Deram entrevistas para televisão, mas não foram prestar contas sobre a acusação. Um depósito do Queiroz foi feito em favor de Michelle Bolsonaro. O general Heleno diz que “falta algo de consistência” nas explicações.
Proteja o homem do império da Justiça e da Lei, porque tudo pode ir por água abaixo. No Brasil os grandes pactos oligárquicos da roubalheira são feitos ou entre agentes públicos ou entre estes e os privados (gente do Estado e gente do Mercado: setores da burocracia, da política e do mundo empresarial e financeiro). Assim se faz o saque diabólico dos cofres públicos. Frequentemente a impunidade dessa pilhagem generalizada da nação conta com a conivência, voluntária ou involuntária, consciente ou inconsciente (cada caso é um caso), do STF ou outros tribunais.
A impunidade faz parte dos seus “direitos adquiridos” desde 1500. “Em terra onde todos são barões não é possível acordo coletivo durável, a não ser por uma força exterior [da lei] respeitável e temida” (Sérgio Buarque de Holanda, Raízes do Brasil). A lei no Brasil, diante da velha ordem colonialista da rapina, nem é respeitável nem é temida pelos donos do poder.
Lei impessoal “versus” construção social diabólica. Neste país as elites do poder, as oligarquias, fazem de tudo para não serem investigadas. Queiroz, sua família e o próprio senador deram entrevistas para televisão ou redes sociais, mas recusaram ser ouvidos pelo Ministério Público. A lei impessoal (do Estado de Direito) quase sempre sucumbe diante da construção social diabólica oculta que domina a nação (via estado de exceção).
Ministro Marco Aurélio. Compete ao ministro Marco Aurélio, o relator do caso, logo no princípio de fevereiro, revogar a suspensão das investigações, dando andamento à atividade estatal de apurar os delitos de todos, seja senador ou assessor de deputado.
Jogo arriscado. A “carteirada” do senador Bolsonaro (que tem vídeo abominando o foro privilegiado) para impedir a investigação dos fatos deu a sensação de “confissão de sua participação” e vai prolongar o desgaste do atual governo, que veio para combater duramente a corrupção.
O foro privilegiado é uma indecência. Na Câmara dos Deputados temos que aprovar o fim dessa indecência imediatamente. Vou lutar por isso no Parlamento. O projeto do senador Álvaro Dias, já aprovado no senado, está pronto para ir ao Plenário da Câmara. Vamos acelerar o fim dessa indecência, que vem servindo de escudo para a impunidade dos barões ladrões, que por força das suas máfias ou dos seus pactos oligárquicos estão saqueando sem piedade a nação brasileira.
copiado https://congressoemfoco.uol.com.br/justica/
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