Resultado de imagem para Policial matador na ditadura vira pastor e diz que hoje não combateria a esquerda Cláudio Guerra, ex-delegado do Dops, é tema de documentário gravado em 2015Policial matador na ditadura vira pastor e diz que hoje não combateria a esquerda

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 O PASTOR MATADOR  Anna Virginia Balloussier
RIO DE JANEIRO
“Fiz algumas coisas que não foram boas”, diz o pastor Cláudio Guerra à Folha, pelo telefone. A voz é de um senhor de 78 anos, e o tom, monocórdio.
Assim o ex-delegado do Dops (Departamento de Ordem Político Social)do Espírito Santo se refere ao período em que matou ou ajudou a dar sumiço em corpos de militantes de esquerda, tudo a mando da ditadura militar brasileira, para a qual serviu como fiel agente nos anos 1970 e 1980.
Pastor Cláudio Guerra, que foi delegado do Dops (Departamento de Ordem Político Social) do Espírito Santo
Pastor Cláudio Guerra, que foi delegado do Dops (Departamento de Ordem Político Social) do Espírito Santo – Gabriel Lordello/Mosaico Imagem/Folhapress
A imagem desse senhor reagindo a nomes que lhe são jogados é uma das mais fortes de “Pastor Cláudio”, documentário de Beth Formagginigravado em 2015 e em cartaz desde o dia 14. Muitos desses nomes eram do PCB (Partido Comunista Brasileiro). “Esse aí eu matei” ou “esse eu incinerei”, diz, no filme.
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Cláudio não é muito fã do resultado, baseado numa conversa sua com um ativista de direitos humanos, um depoimento que faz questão de dar com uma Bíblia nas mãos. Também ficou “muito triste” com reportagens sobre o filme, que, para ele, deixaram de lado o homem de Deus que hoje diz ser.
“Vi quando me chamam de assassino. Destilam ódio e, enquanto for assim, o objetivo de termos uma nova sociedade em que se perdoa os erros que foram cometidos… Teve vítimas fatais dos dois lados.”
O pastor da Assembleia de Deus que agora se diz arrependido pelos feitos do passado ainda chama de “revolução” o golpe de 1964 e é entusiasta do discurso nacionalista de Jair Bolsonaro (PSL), o capitão reformado que virou presidente, e tem uma bandeira do Brasil como foto em seu perfil no WhatsApp.
“Hoje eu não combateria a esquerda, embora não concorde com o comunismo. Hoje eu quero paz”, afirma.
Paz não era sua prioridade nos tempos que, em suas próprias palavras, “eram minha época de bobo”. Dias em que matou e não foi pouco. O agora pastor e ex-agente da repressão vai elencando: de execução mesmo, uma ou duas pessoas no Rio, três em São Paulo, teve uma no Recife e o Nestor Vera, até hoje dado como desaparecido político, em Belo Horizonte.
E tem os cadáveres que incinerou a pedido de oficiais da ditadura, ao menos 12 deles em fornos de uma usina de açúcar em Campos de Goytacazes (RJ). Tudo isso ele relatou em 2014, em depoimento à Comissão Nacional da Verdade, que investigou crimes cometidos no regime militar, e, dois anos antes, em “Memórias de uma Guerra Suja”, livro com suas recordações sobre a tal “época de bobo”.
Da ditadura ganhava carros (quando um Chevette dele queimou acidentalmente na usina, ganhou um zero km de presente) e ordens orais para assassinar fulano ou sicrano. Estas em geral partiam do coronel Perdigão, diz o agora pastor.
Fala do coronel Freddie Perdigão, apontado como o responsável da Casa da Morte em Petrópolis, centro clandestino onde a repressão matou e torturou, e autor do atentado do Riocentro, quando um sargento e um capitão explodiram sem querer dentro de seu carro Puma, antes da hora, uma bomba planejada para o Dia do Trabalhador no pavilhão carioca.
Isso em 1981, como parte de um plano maior para gerar caos social e boicotar a abertura do àquela altura trôpego regime militar.
Cláudio diz que nunca participou de tortura. Também conta que pegava os corpos a serem “desaparecidos” com a equipe de Perdigão, e ele e os colegas encarregados de queimá-los não resistiam: abriam os sacos plásticos pretos para dar “uma espiadinha, por curiosidade”.
Em um deles viu uma mulher com “sinais físicos” de estupro. Em outro, um cadáver sem braço. Acha que era o de José Roman, um corretor de imóveis do PCB, o Partidão.
O ex-delegado lembra do humor daqueles dias, como ao descrever um coronel que passou a lutar contra a ditadura como melancia, “verde por fora e vermelho por dentro”. No filme de Beth, sorri ao se desculpar por não reconhecer quem são algumas das pessoas em fotos mostradas a ele, vítimas do regime. Está com a memória cansada por causa da idade, diz.

VIDA NOVA NA IGREJA

Já a conversão ao Evangelho, conta à Folha, ele não esquece.
Foi em 2006. Cláudio Guerra estava preso, e pela segunda vez —duas condenações que nada tinham a ver com suas práticas no período militar.
Na primeira, o ex-delegado foi acusado de “colocar bomba no carro de uma pessoa”. Não diz o nome, mas era um bicheiro, Jonas Bulamarques, que saiu mutilado do atentado de 1982 e acabou assassinado meses depois.
Na segunda, pela morte de duas mulheres, a esposa e a cunhada, ambas encontradas em 1980 num lixão com 19 e 11 tiros, respectivamente. Guerra nega a autoria dos dois crimes. Foi preso mesmo assim.
Pastor Cláudio Guerra, que foi delegado do Dops (Departamento de Ordem Político Social) do Espírito Santo
Pastor Cláudio Guerra, que foi delegado do Dops (Departamento de Ordem Político Social) do Espírito Santo – Gabriel Lordello/Mosaico Imagem/Folhapress
A primeira fase como penitenciário foi “uma prisão light”, pois o ambiente era “amigável” a ex-delegados como ele, afirma. Já a segunda foi o oposto. Já era um sexagenário quando voltou à cadeia, com presos comuns, e passou “um inferno”, diz. “Aqueles gritos de ‘delegado safado’, uma tortura psicológica medonha.”
“Não tinha amigo mais, poder nenhum mais. Num belo dia, uma senhora, a irmã Santinha, começou a falar de Jesus pra mim. Eu falava que não tinha jeito, fiz muita coisa errada. Na minha cabeça não existia perdão.”
Ela o convenceu que estava errado citando uma passagem bíblica que diziam que, caso se arrependesse, “ainda que os vossos pecados sejam como a escarlata, eles se tornarão brancos como a neve”.
O pastor Cláudio não ora por suas vítimas. “A palavra me ensina que tenho que orar pela família. Pela pessoa que morre nada você tem a fazer, ela vai dormir até o julgamento final.”
Mora numa “casinha humilde” em Vila Velha, município vizinho à Vitória, nada comparável ao casarão que tinha quando estava a serviço da ditadura e “dava festas para mais de 100 pessoas, coisa de ostentação mesmo”.
O ex-delegado conta que, cumprindo regime aberto, dá aulas para presidiários e acha que a vida foi boa com ele. “Tenho 12 netos, 9 filhos, 3 bisnetos, olha como Deus tem misericórdia e gosta de mim.”

55 ANOS DA DITADURA Planalto distribui vídeo em defesa do golpe militar de 1964 Comemorar 64 é provocação, dizem manifestantes Ato em Brasília lembra vítimas do pau de arara

Evaristo Sa/AFP

PLANALTO DISTRIBUI VÍDEO EM DEFESA DO GOLPE MILITAR DE 1964

Planalto distribui vídeo em defesa do golpe militar de 1964
55 ANOS DA DITADURA

Planalto distribui vídeo em defesa do golpe militar de 1964

Planalto distribui vídeo em defesa do golpe militar de 1964


Luci Ribeiro
Brasília
31/03/2019 14h28
O Palácio do Planalto distribuiu neste domingo, 31, um vídeo que faz uma defesa do golpe militar de 1964. O material descreve os acontecimentos do dia 31 de março de maneira semelhante à forma como o presidente Jair Bolsonaroe alguns ministros tratam do assunto. Para eles, a derrubada de João Goulart do poder, que marcou o início do período de 21 anos de ditadura militar no Brasil, foi um movimento para conter o avanço do comunismo no País.
"O Exército nos salvou. O Exército nos salvou. Não há como negar. E tudo isso aconteceu num dia comum de hoje, um 31 de março. Não dá para mudar a história", diz o apresentador do vídeo. Hoje, o golpe completa 55 anos.
A peça, que tem pouco menos de dois minutos e não traz a indicação de quem seria seu autor, foi distribuída por um número oficial de WhatsApp do Planalto, usado pela Secretaria de Comunicação da Presidência para o envio de mensagens de utilidade pública, notícias e serviços do governo federal. Para receber os conteúdos, os jornalistas precisam ser cadastrados no sistema.
A assessoria de imprensa do Planalto foi procurada e, como resposta, disse que o Planalto não irá se pronunciar. A equipe também confirmou que o canal usado para disparar o vídeo é mesmo oficial. "Sobre o vídeo a respeito do dia 31 de março, ele foi divulgado por meio de nosso canal oficial do governo federal no WhatsApp. O Palácio do Planalto não irá se pronunciar". r".

O mesmo vídeo foi compartilhado hoje mais cedo no Twitter pelo deputado federal e filho do presidente, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). "Num dia como o de hoje o Brasil foi liberto. Obrigado militares de 64! Duvida? Pergunte aos seus pais ou avós que viveram aquela época como foi?", diz Eduardo no post que anuncia o vídeo.
Um dos trechos do material afirma que "era, sim, um tempo de medo e ameaças, ameaças daquilo que os comunistas faziam onde era imposto sem exceção, prendiam e matavam seus próprios compatriotas" e "que havia, sim, muito medo no ar, greve nas fábricas, insegurança em todos os lugares".
Diante disso, conta o apresentador, o Exército foi "conclamado" pelo povo e precisou agir. "Foi aí que, conclamado por jornais, rádios, TVs e, principalmente, pelo povo na rua, povo de verdade, pais, mães, igreja que o Brasil lembrou que possuía um Exército Nacional e apelou a ele. Foi só aí que a escuridão, graças a Deus, foi passando, passando, e fez-se a luz".
O apresentador convida as pessoas a conhecer essa verdade buscando mais detalhes e depoimentos nos jornais, revistas e filmes da época. Na parte final, o vídeo é concluído sob o Hino Nacional, e um outro narrador, agora apenas com voz e sem imagem, diz: "O Exército não quer palmas nem homenagens. O Exército apenas cumpriu o seu papel".
Celebrações
No sábado, a Justiça Federal cassou liminar que proibia o governo de promover os eventos alusivos ao golpe de 1964. A decisão foi da desembargadora de plantão no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, Maria do Carmo Cardoso. Apesar de "reconhecer a sensibilidade do tema em análise", ela decidiu que a recomendação do presidente Bolsonaro para comemorar a data se insere no âmbito do poder administrador.
"Não visualizo, de outra parte, violação ao princípio da legalidade, tampouco violação a direitos humanos, mormente se considerado o fato de que houve manifestações similares nas unidades militares nos anos anteriores, sem nenhum reflexo negativo na coletividade", escreveu a magistrada.
A liminar havia sido concedida na noite de sexta-feira, 29, pela juíza Ivani Silva da Luz, da 6ª Vara da Justiça Federal em Brasília, atendendo a um pedido da Defensoria Pública da União. A Advocacia-Geral da União (AGU) recorreu ainda na sexta e, na manhã de sábado, saiu a sentença da desembargadora.
Antecipando-se à data, o Exército realizou na semana passada no Comando Militar do Planalto, em Brasília, cerimônia para relembrar o 31 de março. Na solenidade, em que esteve presente o comandante da Força, general Edson Leal Pujol, o episódio foi tratado como "movimento cívico-militar". Os oito comandos do Exército também já realizaram semana passada cerimônias alusivas ao 31 de março.
Conforme revelou o Estadão, Bolsonaro orientou os quartéis a celebrarem a data histórica, que havia sido retirada do calendário de comemorações das Forças Armadas desde 2011, no governo de Dilma Rousseff. A determinação de Bolsonaro foi para que na data as unidades militares fizessem "as comemorações devidas".

Uma manifestação na manhã de hoje em Brasília marcou o repúdio ao golpe de 1964. O ato foi uma reação à proposta do presidente Jair Bolsonaro (PSL)de que o aniversário do golpe fosse comemorado.
Posteriormente, Bolsonaro recuou e disse que havia proposto apenas "rememorar" os fatos que levaram à ditadura que se estendeu no país por 21 anos.
Os manifestantes levaram flores e fotografias de vítimas da ditadura. Gritos de "ditadura nunca mais" e "fora, Bolsonaro" marcaram a passeata que percorreu um trecho da pista do Eixo Rodoviário de Brasília, fechado para automóveis aos domingos.
Os organizadores calcularam em cerca de 600 pessoas o público que compareceu ao ato. Policiais militares que acompanharam a manifestação disseram estimar o público em 400 a 500 pessoas. A SSP-DF (Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal) não divulgou uma estimativa oficial de quantas pessoas foram ao protesto.
Hoje, é esperada a realização de atos semelhantes em outras cidades do país, como Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte.
O golpe militar de 1964 foi deflagrado em 31 de março daquele ano e deu início a um período de exceção marcado por censura, torturas a adversários políticos, cassação de direitos e fechamento do Congresso Nacional.
A ditadura, que se estendeu até 1985, foi marcada por um período sem eleições diretas para presidente da República, o que só foi retomado em 1989, após a Constituição Federal de 1988.
Para o diretor da CUT (Central Única dos Trabalhadores) Yuri Soares, a ideia de celebrar o golpe de 64 soa como uma "provocação" àqueles que perderam direitos ou até mesmo a vida no período.
"O presidente vem com essa provocação, e para nós é importante relembrar esse período para que ele nunca mais aconteça", diz. "Num momento em que o presidente não sabe governar o Brasil de 2019, ele fica se remetendo a um dos piores períodos da história do país", afirma o sindicalista.
Carregando uma flor branca e a fotografia de um tio morto pela ditadura, a professora aposentada Jodete Amorim, 75 anos, afirma considerar "surreal" a ideia de comemorar o golpe e o fato de Bolsonaro ter sido eleito com um discurso favorável ao regime militar que governou o país.
"Quando a gente tem um presidente que quer comemorar a ditadura, se a gente não se mexer [para protestar]", diz. "É surreal imaginar que 50 milhões de brasileiros votaram numa figura dessa", afirma a professora.
Nas eleições de 2018 Bolsonaro foi eleito no segundo turno com 57 milhões de votos, o que representou 55% dos votos válidos. Seu adversário, Fernando Haddad (PT), teve 47 milhões de votos (44%).
A manifestação em Brasília foi organizada por partidos e entidades como a CUT, o PT, PCdoB, PSOL, PSB, PDT, Frente Brasil Popular e CMP (Central de Movimentos Populares).
No ato também trouxe cartazes e gritos de "Lula, livre", numa crítica à prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

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