TCU aponta indícios de ilegalidade em decreto de Temer sobre portos Ministério Público investiga se presidente recebeu propina para beneficiar empresa.



Relatório

Relatório interno do TCU aponta ilegalidades no decreto de Portos, assinado por Temer


Por Andréia Sadi e Marcelo Parreira
O presidente Michel Temer (Foto: Evaristo Sa/AFP) O presidente Michel Temer (Foto: Evaristo Sa/AFP)
O presidente Michel Temer (Foto: Evaristo Sa/AFP




 
Um relatório interno elaborado por técnicos do Tribunal de Contas da União coloca em dúvida o principal argumento de defesa do presidente Michel Temer no chamado inquérito dos Portos, que apura se ele beneficiou empresas do setor de portos, como a Rodrimar, com a edição de um decreto em 2017.
O processo no TCU está classificado como acesso restrito e a TV Globo/GloboNews conseguiu as informações junto a fontes no tribunal. No último dia 20, o delegado Cleyber Malta Lopes, que investiga Temer no inquérito dos Portos, solicitou ao tribunal cópia deste processo.
Procurada, a Rodrimar disse que não vai se manifestar. O Ministério dos Transportes, que respondeu pelo governo, disse que a empresa Rodrimar não foi beneficiada pelo decreto.
"Diante de todos os fatos apontados, e principalmente sobre a vedação expressa do Decreto acerca da possibilidade de adaptação aos contratos anteriores firmados à lei 8630/93, resta clara a impossibilidade da empresa Rodrimar ser beneficiária do Decreto", afirmou o ministério em nota.
O documento do tribunal afirma que o Decreto 9.048/2017, o chamado Decreto dos Portos, cria um contexto que poderia, no futuro, beneficiar empresas com contratos anteriores a 1993. É o caso da Rodrimar. O relatório vai de encontro à defesa do presidente porque o principal argumento de Temer sobre o tema, até agora, é o de que a Rodrimar não poderia se beneficiar das regras que entraram em vigor em maio do ano passado.
Segundo fontes do tribunal, originalmente, a investigação do TCU sobre o decreto estava apenas na secretaria que cuida de transportes. Mas, nos últimos dias, a investigação ganhou o reforço de uma secretaria do tribunal – de combate à corrupção – que faz a articulação com a Polícia Federal e com o Ministério Público Federal.
Hoje, os auditores trabalham em uma linha de investigação: a de que o decreto extrapola o que a lei diz para beneficiar as empresas que administram portos. Os auditores discutem, ainda, se vão investigar se houve ação de integrantes do Planalto na edição do decreto. Isso criaria um segundo furo no decreto: desvio de finalidade. Os técnicos discutem se vão solicitar ao ministro Bruno Dantas, do TCU, que encaminhe ofício ao ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, com essas informações.

Benefícios no futuro

Um dos contratos de concessão da Rodrimar é anterior a uma lei que regulamentava o tema, editada em 1993. De acordo com o Palácio do Planalto, o decreto não incluiu, como queriam as empresas do setor, a possibilidade de que os contratos nesta situação pudessem se beneficiar das mudanças nas regras de concessão. Mas os técnicos do TCU, que fizeram críticas ao decreto, entendem que o decreto dá margem para que novos decretos beneficiem empresas como a Rodrimar no futuro.
Para os técnicos da Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Portuária e Ferroviária (Seinfra) do TCU, existe um "forte indício de infração aos princípios da isonomia, da vinculação ao instrumento convocatório e da seleção da proposta mais vantajosa pelo Decreto 9.048/2017".
Para eles, o decreto "contempla disposições normativas com fortes indícios de ilegalidade (...) e com base nas novas regras trazidas pela norma infralegal poderão ser assinados mais de cem termos aditivos a contratos de arrendamentos portuários, cristalizando direitos e trazendo novas relações jurídicas viciadas do ponto de vista da legalidade".
As conclusões fazem parte de um pedido feito em novembro do ano passado para que o TCU determinasse a suspensão de todos os processos que envolvessem as regras alteradas pelo decreto. O ministro Bruno Dantas, relator do caso no TCU, negou o pedido da Seinfra porque o governo enviou ofícios se comprometendo a não dar andamento aos processos enquanto o TCU não analisasse o caso.

Antes de 1993

Os técnicos do TCU pediram informações sobre o processo de elaboração do decreto e análises do Ministério dos Transportes, da Casa Civil e da Agência Nacional de Transportes Aquaviários, a Antaq. Após analisar as respostas enviadas pelo governo, a Seinfra manteve seu entendimento de que as mudanças podem permitir alterações nos contratos que descumprem as leis que regulam o setor.

Para os analistas, o decreto daria hipoteticamente ao presidente a possibilidade de prolongar contratos em desacordo com as regras da época em que foram assinados. E isso poderia incluir até os contratos anteriores à lei de 1993, como o da Rodrimar.
"Aceitar que regulamentações vindouras possam alterar cláusulas essenciais de contratos administrativos em vigor pode levar a um quadro de total insegurança jurídica e regulatória no setor portuário. Considerando que, em tese, sobrevenha novo Decreto que reduza o prazo máximo permitido da concessão, é esperado que os detentores de contratos já firmados aleguem o princípio do pacta sunt servanda para não se submeterem à limitação. Continuando o exercício hipotético, nada obstaria futuros alargamentos de vigência contratual via edição de atos unipessoais do chefe do Poder Executivo, o que acarretaria, na prática, a existência de contratos administrativos com prazo indeterminado, o que é vedado pela legislação. No mesmo raciocínio, também não haveria óbice para que as extensões de prazo fossem autorizadas aos arrendatários de terminais concedidos antes da Lei 8.630/1993", diz o relatório.
A análise feita pelos técnicos do TCU se opõe ao entendimento do governo e do presidente Michel Temer sobre o alcance do decreto. Em resposta a uma questão da Polícia Federal sobre a possibilidade do decreto beneficiar a Rodrimar, o presidente Michel Temer disse que "as empresas do Grupo Rodrimar não foram beneficiadas com a edição do Decreto nº 9.048/2017, conforme demonstram os documentos do Ministério dos Transportes constantes dos autos de investigação" e que "deve-se realçar que as empresas que já possuíam a concessão antes de 1993 não foram beneficiadas pela prorrogação."

Inclusão no inquérito

O trabalho dos técnicos do TCU vai ajudar a embasar as investigações da Polícia Federal. No último dia 20 de março, o delegado responsável pelo caso, Cleyber Malta Lopes, pediu ao TCU acesso ao processo sigiloso que trata dos efeitos do decreto. O delegado também pede acesso à relação das empresas que pediram a prorrogação de contratos com base no decreto, cópias de processos do TCU relacionados às empresas do grupo Rodrimar e informações sobre o TCU estar analisando pedido da Rodrimar de adaptação do contrato celebrado pela empresa em 1993.

Procurado pelo blog, o ministro Bruno Dantas disse que não se pronunciaria sobre processos ainda não concluídos.
O inquérito dos Portos está sob a relatoria do ministro Luis Roberto Barroso, no STF. Barroso autorizou recentemente a quebra de sigilo bancário de Temer na investigação. Além deste inquérito, o presidente é alvo do inquérito da Odebrecht, que investiga se a construtora pagou propina na Secretaria de Aviação Civil.
Além deste inquérito, o presidente é alvo do inquérito da Odebrecht, que investiga se a construtora pagou propina na Secretaria de Aviação Civil no período do MDB à frente da pasta. 
copiado  https://g1.globo.com/politica/

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