“O Brasil tem as condições para zerar o desmatamento em 15 anos”
Marina Rossi
São Paulo
Segundo o cientista Carlos Nobre, o país tem de desatrelar a expansão
da agricultura do desmatamento, reduzir a emissão de CO2, e investir em
energias renováveis“O Brasil tem condições de zerar o desmatamento em 15 anos”
Segundo o cientista Carlos Nobre, o país terá de desatrelar a expansão da agricultura do desmatamento, reduzir a emissão de CO2, e investir em energias renováveis
Marina Rossi
São Paulo
21 DIC 2014 - 10:55 BRST
Carlos Nobre, cientista climático e secretário de Políticas de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, MCTI,
acredita que há uma leitura muito severa sobre o papel do Brasil no
âmbito do meio ambiente. Doutor em meteorologia pelo Massachusetts
Institute of Technology (MIT) e membro da Sociedade Brasileira para o
Progresso da Ciência (SBPC), Nobre tem pesquisas feitas, desde os anos
1980, os impactos do clima sobre o desmatamento da Amazônia e seus
ecossistemas. Para ele, o Brasil já vem trabalhando pela redução das
emissões de gás carbônico (CO2), até mais do que outros países e tem
plenas condições de casar preservação e desenvolvimento da agricultura.
Seu irmão, Antonio Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, se notabilizou este ano por um estudo mostrando o impacto do desmatamento para a seca de São Paulo, por exemplo. Para este problema, Carlos Nobre acredita que só é possível avançar com a redução do consumo de água.
Pergunta. Qual é o balanço que o senhor faz da COP20? O que o senhor acha sobre inserir os países emergentes no mesmo bloco que os países ricos no acordo para a redução de CO2?
Resposta. Se a gente considerar a COP15 (Copenhagen, 2009), que foi um grande fracasso, e depois a tentativa de reerguer as negociações nas conferências seguintes, a COP20 foi a melhor até agora. O que derrubou Copenhagen foi a falta de acordo, e isso frustrou todos os participantes, porque os Estados Unidos e a China estavam cada um falando uma língua diferente. A COP20 apresentou esse pré-acordo [de redução de CO2], que ainda precisa se materializar, mas pelo menos ele aconteceu. Se não houvesse esse acordo, hoje estaríamos bem mais frustrados. Sobre incluir os emergentes no mesmo bloco que os países desenvolvidos, não é bem assim. No documento, há uma frase que diz “respeitando as peculiaridades de cada país”. E essa última frase muda todo o espírito. Quando o tempo passa, as coisas mudam. Em 1992, por exemplo, a Coreia do Sul ainda era um país considerado em desenvolvimento. Em 2014, já é um país desenvolvido. Você tem que ter um mecanismo para que os países que vão avançando, assumindo condições tecnológicas e financeiras, possam desempenhar um papel importante.
P. Como será 2015 para o Brasil? Quais serão os principais desafios ambientais?
R. São três grandes desafios: acelerar a introdução
de energias renováveis na matriz energética, reduzir o desmatamento e
melhorar a produtividade da agricultura. O Brasil deve continuar sendo o
protagonista e tem de continuar nessa trajetória de redução das
emissões [de CO2]. Nos últimos anos, o único país grande em
desenvolvimento que diminuiu [a emissão de gases de efeito estufa] foi o
Brasil. Tem condições de, em dez,15 anos, zerar o desmatamento. Porque é
possível aumentar a produção agrícola sem ter que expandir a fronteira
agrícola. O Brasil tem a faca e o queijo na mão para zerar o
desmatamento. Para isso, é preciso investir na agricultura e a pressão
de expansão da fronteira agrícola em cima das florestas, do cerrado e da
caatinga tem que zerar. E é preciso que os mecanismos de incentivos
foquem na recuperação de áreas degradadas no sentido de plantar
floresta. Isso não é nada fora do que é exequível para o Brasil.
O terceiro é a energia, que tem uma correlação muito grande com o crescimento econômico e demográfico. A única maneira de mudar essa curva é alterando a matriz enérgica. É preciso que haja investimento do setor, incentivos de iniciativa pública com energias renováveis. O Brasil tem o maior potencial de energia renováveis do mundo por quilômetro quadrado. Nem os Estados Unidos e nem a China têm esse potencial.
P. O Governo está atento a essa importância do investimento na energia renováveis?
R. Como política pública sim. A energia eólica avançou muito porque o setor privado viu que havia um potencial muito grande. O Governo cria mecanismo para incentivar a geração de energias renováveis. Mas é preciso que exista um capital privado interessado em explorar esse potencial que o país tem.
P. Recentemente, Gustavo Fonseca, do Fundo Global para o Meio Ambiente, disse que o Brasil tem que reassumir o papel de protagonista na negociação ambiental. Você concorda? Por que perdemos esse protagonismo?
R. Não acho que o Brasil perdeu esse papel. É dificílimo diminuir a emissão [de CO2] com o desmatamento. A questão é mudar o padrão de desenvolvimento. É um aspecto cultural, que existe desde que os portugueses chegaram aqui em 1500. Eu não concordo, acho incompleta essa afirmação e fraca como análise transversal da dificuldade que é a redução de emissões. Nós reduzimos, enquanto os EUA aumentaram no ano passado, o que é muito preocupante.
O que alguns analistas equivocadamente acreditam é que o Brasil deveria ter o papel de convencer a China a reduzir as emissões, por exemplo. Essa ideia de que o protagonismo do Brasil é ser um país que convença todos os países a reduzir é inocente. Deixa o Papa fazer isso. O protagonismo nosso é resolver os nossos problemas.
P. Como o senhor vê a seca que está afetando a região sudeste do país? Qual é a nossa responsabilidade em relação a ela?
R. Eu não sou especialista em uso da água. Mas a Academia Brasileira de Ciências reuniu, nos dias 21 e 22 de novembro, os melhores especialistas em recursos hídricos do Brasil para discutir o tema. De modo geral, o que recomendamos é a redução drástica de consumo. A não ser que ocorra um dilúvio, ainda assim, era preciso que tivesse um dilúvio de hoje, o início do verão, até março. E mesmo que chova de hoje até o fim da estação chuvosa uma quantidade na média, teremos um problema no próximo inverno até mais severo do que tivemos até agora, porque praticamente não há mais água no Cantareira e nem nos outros reservatórios. Nos próximos anos é preciso tomar medidas que combinem saneamento – melhorar a qualidade da água disponível – e consumo racional. Enquanto perdurar a crise, o consumo tem que diminuir. Além disso, as bacias estão muito degradadas. É preciso replantar as florestas para melhorar a vazão dos reservatórios e melhorar a qualidade da água.
copiado http://brasil.elpais.com/brasil/
Seu irmão, Antonio Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, se notabilizou este ano por um estudo mostrando o impacto do desmatamento para a seca de São Paulo, por exemplo. Para este problema, Carlos Nobre acredita que só é possível avançar com a redução do consumo de água.
Pergunta. Qual é o balanço que o senhor faz da COP20? O que o senhor acha sobre inserir os países emergentes no mesmo bloco que os países ricos no acordo para a redução de CO2?
Resposta. Se a gente considerar a COP15 (Copenhagen, 2009), que foi um grande fracasso, e depois a tentativa de reerguer as negociações nas conferências seguintes, a COP20 foi a melhor até agora. O que derrubou Copenhagen foi a falta de acordo, e isso frustrou todos os participantes, porque os Estados Unidos e a China estavam cada um falando uma língua diferente. A COP20 apresentou esse pré-acordo [de redução de CO2], que ainda precisa se materializar, mas pelo menos ele aconteceu. Se não houvesse esse acordo, hoje estaríamos bem mais frustrados. Sobre incluir os emergentes no mesmo bloco que os países desenvolvidos, não é bem assim. No documento, há uma frase que diz “respeitando as peculiaridades de cada país”. E essa última frase muda todo o espírito. Quando o tempo passa, as coisas mudam. Em 1992, por exemplo, a Coreia do Sul ainda era um país considerado em desenvolvimento. Em 2014, já é um país desenvolvido. Você tem que ter um mecanismo para que os países que vão avançando, assumindo condições tecnológicas e financeiras, possam desempenhar um papel importante.
P. Como será 2015 para o Brasil? Quais serão os principais desafios ambientais?
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O terceiro é a energia, que tem uma correlação muito grande com o crescimento econômico e demográfico. A única maneira de mudar essa curva é alterando a matriz enérgica. É preciso que haja investimento do setor, incentivos de iniciativa pública com energias renováveis. O Brasil tem o maior potencial de energia renováveis do mundo por quilômetro quadrado. Nem os Estados Unidos e nem a China têm esse potencial.
P. O Governo está atento a essa importância do investimento na energia renováveis?
R. Como política pública sim. A energia eólica avançou muito porque o setor privado viu que havia um potencial muito grande. O Governo cria mecanismo para incentivar a geração de energias renováveis. Mas é preciso que exista um capital privado interessado em explorar esse potencial que o país tem.
P. Recentemente, Gustavo Fonseca, do Fundo Global para o Meio Ambiente, disse que o Brasil tem que reassumir o papel de protagonista na negociação ambiental. Você concorda? Por que perdemos esse protagonismo?
R. Não acho que o Brasil perdeu esse papel. É dificílimo diminuir a emissão [de CO2] com o desmatamento. A questão é mudar o padrão de desenvolvimento. É um aspecto cultural, que existe desde que os portugueses chegaram aqui em 1500. Eu não concordo, acho incompleta essa afirmação e fraca como análise transversal da dificuldade que é a redução de emissões. Nós reduzimos, enquanto os EUA aumentaram no ano passado, o que é muito preocupante.
O que alguns analistas equivocadamente acreditam é que o Brasil deveria ter o papel de convencer a China a reduzir as emissões, por exemplo. Essa ideia de que o protagonismo do Brasil é ser um país que convença todos os países a reduzir é inocente. Deixa o Papa fazer isso. O protagonismo nosso é resolver os nossos problemas.
P. Como o senhor vê a seca que está afetando a região sudeste do país? Qual é a nossa responsabilidade em relação a ela?
R. Eu não sou especialista em uso da água. Mas a Academia Brasileira de Ciências reuniu, nos dias 21 e 22 de novembro, os melhores especialistas em recursos hídricos do Brasil para discutir o tema. De modo geral, o que recomendamos é a redução drástica de consumo. A não ser que ocorra um dilúvio, ainda assim, era preciso que tivesse um dilúvio de hoje, o início do verão, até março. E mesmo que chova de hoje até o fim da estação chuvosa uma quantidade na média, teremos um problema no próximo inverno até mais severo do que tivemos até agora, porque praticamente não há mais água no Cantareira e nem nos outros reservatórios. Nos próximos anos é preciso tomar medidas que combinem saneamento – melhorar a qualidade da água disponível – e consumo racional. Enquanto perdurar a crise, o consumo tem que diminuir. Além disso, as bacias estão muito degradadas. É preciso replantar as florestas para melhorar a vazão dos reservatórios e melhorar a qualidade da água.
copiado http://brasil.elpais.com/brasil/
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