Mais de dois milhões de britânicos querem segundo referendo
Governo recusa federalismo mas defende "melhor Europa"
A secretária de Estado Margarida Marques
| Paulo Alexandrino / Global Imagens)
A palavra "federalismo" é uma das interditas na União Europeia, diz a secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros
Se
há alguém em Portugal que conhece bem os corredores do poder em
Bruxelas é a atual secretária de Estado dos Assuntos Europeus. De 2005 a
2011, Margarida Marques, de 62 anos, chefiou a representação em Lisboa
da Comissão Europeia. E foi funcionária da instituição de 1994 a 2015 -
saindo para integrar o atual governo, que representa no Conselho de
Assuntos Gerais, o conselho onde estão os responsáveis governamentais da
UE com a pasta dos Assuntos Europeus.
Margarida
Marques não tem dúvidas. "Há palavras que se tornaram interditas na
UE." "Federalismo" é uma dessas palavras. As outras duas são palavras
associadas ao federalismo: "Tratado Constitucional" e "mais integração".
"Pode-se - diz a secretária de Estado - até ser favorável ao conteúdo
mas não se pode pronunciar a palavra." Assim, o que defende é aquilo a
que em "europês" se chama "better Europe" - uma "Europa melhor", que
corrija os erros de "imposição excessiva de Bruxelas nas políticas
nacionais". E isto porque - reconhece - "tem havido uma excessiva
intromissão da Comissão Europeia", através, por exemplo, do semestre
europeu (verificação da compatibilidade dos orçamentos nacionais com os
objetivos europeus. E além do mais "é preciso dizer mil vezes que o
Eurogrupo não existe". "Criou-se a sensação de que, por imposição de
Bruxelas, as políticas nacionais passaram a ser sempre iguais, mesmo que
protagonizadas por partidos diferentes. E isto fez emergir os
populismos. O que é preciso é reforçar o mercado interno na economia
digital e no setor da energia e reforçar políticas comuns, por exemplo
na defesa e segurança."
"É preciso dizer mil vezes que o Eurogrupo não existe"
Mais
à esquerda no PS, o histórico Manuel Alegre - que até há relativamente
pouco tempo era uma voz socialista isolada em termos de euroceticismo -
carrega nas tintas e diz que depois do brexit há duas tentações que,
confirmando-se (ou uma ou outra) representarão "um salto no abismo": uma
delas é a assunção do diretório franco-germânico como entidade de
comando e controlo da UE; e a outra é o federalismo.
"Perguntar
se é preciso mais federalismo mostra bem que não se aprendeu nada", diz
o histórico socialista ao DN. No seu entender, "o referendo foi um ato
de liberdade e uma lição que só uma grande nação como o Reino Unido
podia dar". E "a grande lição" a retirar "é que não se faz Europa contra
a identidade e as tradições nacionais". "É preciso voltar aos velhos
princípios: a Europa como um projeto de paz e liberdade entre nações
iguais" onde "é preciso mais democracia e menos tecnocracia e menos
arrogância". Porque "a UE não é um projeto místico ou mítico - haverá
sempre Europa mesmo que não exista União Europeia e haverá Portugal
mesmo que fora da União Europeia, é isso sim um projeto político e
pragmático e foi essa a visão de Mário Soares e dos que o apoiaram
quando Portugal pediu a adesão".
À
direita, a recusa do federalismo marca também as respostas obtidas pelo
DN. Em 1992, Manuel Monteiro conquistou a liderança do CDS e fez o
partido rodar 180 graus na sua doutrina europeia. Do euroentusiasmo de
Lucas Pires passou-se para um eurocetiscimo muito vincado que nos tempos
iniciais da sua liderança se manifestou, por exemplo, pela rejeição do
Tratado de Maastricht, o tratado que lançou as bases do euro.
"Continuo
a ser completamente contra a perspetiva federal, mas reconheço que
estas meias-tintas a que a UE está sujeita são explosivas. Ou se caminha
para um lado ou para o outro. Continuo a defender uma Europa
intergovernamental com planos comunitários", disse ao DN.
Prosseguindo:
"Em determinado momento, aquando do debate sobre o Tratado de
Maastrich, existiam dois grupos, os comunitaristas e os soberanistas
[grupo no qual se incluía] e nunca os soberanistas defenderam a saída da
UE. Os comunitaristas não sossegaram enquanto não extinguiram os
soberanistas, aos quais chamavam radicais e antieuropeus. Agora há um
vazio muito grave, porque entre os partidos de centro e os de
extrema-direita não existem outras forças. Agora a UE confronta-se com
um problema danado porque tem independentistas e radicais, o que explica
que um partido xenófobo esteja à frente nas sondagens na Holanda."
Agora - conclui - "há que regressar a esse debate sobre o federalismo,
se deve ou não haver uma tendência federal na UE" mas só para que isso
"possibilite o surgimento de movimentos soberanistas que defendem a UE
mas que não alinham pelo federalismo".
No
PSD, Miguel Morgado, deputado, afirma que "o federalismo é imprudente e
indesejável como projeto político" - "seria um salto no escuro que
revelaria uma fraqueza das forças europeístas".
Para
o deputado, "neste momento há problemas concretos na UE e para os povos
europeus, que requerem consensos difíceis: a conclusão da União
Bancária e o mecanismo de garantia dos depósitos", que são "matérias que
exigem negociações difíceis e trabalho técnico". Ora, "com uma eventual
revisão dos tratados essas negociações ficariam dispersas" e além disso
"há outros problemas como a proteção das fronteiras externas da UE, as
migrações, a falta de resposta da UE na estabilização de sociedades como
a Líbia, a Síria e a Ucrânia".
Portanto,
"se vamos lançar discursos estéreis para rever os tratados serão os
cidadãos europeus a ver os seus problemas adiados". O que importa é
fazer "uma aprendizagem autêntica das lições do passado", por exemplo
com "as falhas na implementação do euro, feita sem todos os alicerces". E
insistir agora evoluindo para um "super-Estado federal" mostraria
"falta de imaginação política". "Apontar cegamente para o caminho do
federalismo é pedir mais sarilhos dos que tivemos até agora."
copiado http://www.dn.pt/portugal/interior/governo-recusa-federalismo-mas-defende-melhor-europa-5249582.html
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