Delação premiada ou corrupção premiada? Por Helena Sthephanowitz
Reproduzo o texto, sempre muito claro, da Helena Sthephanowitz,
em seu blog. É uma reflexão, com ótimos argumentos, sobre o que se gerou
com a onda de delações premiadas, transformadas em “arroz de festa”
pelo...
Reproduzo o texto, sempre muito claro, da Helena Sthephanowitz, em seu blog. É uma reflexão, com ótimos argumentos, sobre o que se gerou com a onda de delações premiadas, transformadas em “arroz de festa” pelo Ministério Público e pelo Judiciário.
É tema que volta e meia tenho abordado aqui e que Helena sistematiza e exemplifica: troca-se a investigação pela “deduragem” e, claro, as “verdades passam a ser definidas e limitadas pela vontade das partes: a quem e o que se quer delatar e a quem se quer que delate.
Prático, simples, injusto e ineficiente.
E os ladrões, em troca disso, como estamos assistindo sem qualquer “indignação” da mídia, livres para fruir de vidas confortáveis – quando não faustosas – com, no máximo, alguns meses de tornozeleira.
Mal usada, delação premiada
Delação premiada ou corrupção premiada? Por Helena Sthephanowitz
Reproduzo o texto, sempre muito claro, da Helena Sthephanowitz, em seu blog. É uma reflexão, com ótimos argumentos, sobre o que se gerou com a onda de delações premiadas, transformadas em “arroz de festa” pelo Ministério Público e pelo Judiciário.
É tema que volta e meia tenho abordado aqui e que Helena sistematiza e exemplifica: troca-se a investigação pela “deduragem” e, claro, as “verdades passam a ser definidas e limitadas pela vontade das partes: a quem e o que se quer delatar e a quem se quer que delate.
Prático, simples, injusto e ineficiente.
E os ladrões, em troca disso, como estamos assistindo sem qualquer “indignação” da mídia, livres para fruir de vidas confortáveis – quando não faustosas – com, no máximo, alguns meses de tornozeleira.
Mal usada, delação premiada
vira incentivo ao crime de corrupção
Helena Sthephanowitz
Há algo de
disfuncional na Justiça brasileira quando oscila entre dois extremos no
trato dos crimes de corrupção. De um lado o engavetamento – omitindo-se
de investigar – e do outro, a banalização da prisão preventiva seguida
de delação premiada como atalho para as investigações.
Ambas as medidas
trazem grande risco de erro. E os erros vão além da violação de direitos
individuais, pois prejudica a própria redução da criminalidade, uma vez
que o Judiciário, sem querer, está indicando um caminho de redução de
riscos para a atividade criminosa.
Se um criminoso que
ainda não foi pego tem a quem delatar como carta na manga, o risco de
vira a ser punido fica reduzido com a jurisprudência da delação. E isto é
um incentivo para ele continuar perpetrando seus crimes, ao invés de
fazê-lo parar.
Afinal, se não for
pego fica com tudo o que roubou. Se for pego e ainda que perca parte do
amealhou em seus crimes, a pena pela sua condenação – reclusão
domiciliar com tornozeleira eletrônica – é equiparável à aposentadoria
em um “resort” de luxo. A delação tornou-se um “plano B” de
aposentadoria para um criminoso do colarinho branco e sem escrúpulos.
A banalização das
prisões preventivas com apelo midiático sacia a opinião pública de quem
já tem escrúpulos, mas para mentes criminosas a alternativa da delação
torna sua atividade de crimes menos arriscada e mais recompensadora. O
resultado, no conjunto da obra, mais cedo ou mais tarde, será o aumento
da corrupção, obviamente com métodos aperfeiçoados, diferentes dos já
descobertos.
A sociedade
ganharia mais se a Justiça fizesse o óbvio pelo caminho do equilíbrio:
engavetasse menos, investigasse sem delongas para obter provas materiais
de forma a levar à condenação de criminosos milionários sem o estímulo
da “aposentadoria” em uma vida de luxo, via delação.
Peguemos o exemplo do senador Aécio Neves (PSDB-MG), um dos que mais citados em delações premiadas.
A chamada Lista de
Furnas é escândalo público e notório desde 2005. Está nas gavetas até
hoje. Onze anos depois, aparecem vários delatores confirmando a lista, o
esquema, os envolvidos, tudo. Se tivessem investigado a sério desde
2005 já haveria gente condenada e nem teria o que delatar sobre este
fato em 2016. Haveria menos impunidade com menos criminosos premiados.
Quando estourou o
mensalão, em 2005, Aécio era governador e estava no ar a campanha
publicitária “Déficit Zero” do governo de Minas feita pela agência de
publicidade de Marcos Valério. Parece até provocação – ou certeza de
impunidade – o governo tucano de Aécio trazer de volta à publicidade
governamental mineira os mesmos empresários que já respondiam processo
de improbidade administrativa pelo mensalão tucano de 1998.
E parece cegueira
dos ministérios públicos estadual e federal não terem visto e
investigado discrepâncias na contabilidade do Banco Rural fornecida à
CPI dos Correios diferente da que deve ter o Banco Central e que,
segundo delação do ex-senador Delcídio do Amaral 11 anos depois,
comprometeria o senador Aécio Neves e o ex-senador Clésio Andrade.
O próprio Marcos
Valério, na iminência de nova condenação pelo mensalão tucano de 1998,
só agora em 2016 negocia delação premiada incriminando políticos
tucanos, antes poupados. Houvesse mais investigação e menos
engavetamento em todos esses anos, o que ele tem a delatar já seria do
conhecimento dos investigadores há muito tempo.
A sensação de
impunidade de 1998 e 2005 incentivou novos casos de corrupção nos anos
seguintes. No último domingo (26), o jornal Folha de S. Paulo trouxe a
manchete “Sócio da OAS relata propina a tesoureiro informal de Aécio”. O
sócio é o empreiteiro Leo Pinheiro. A propina seria de 3% sobre a
principal obra da gestão do tucano no governo de Minas, um faraônico
palácio de governo chamado de Cidade Administrativa. O tesoureiro
informal citado na manchete é Oswaldo Borges da Costa Filho, do círculo
familiar do tucano, e dono do jatinho particular usado pelo senador.
Quando Aécio era
governador, nomeou Oswaldo presidente presidente da Companhia de
Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig), estatal mineira com
orçamento bilionário que custeou a obra. A confirmar a delação, Oswaldo
seria uma espécie de Sérgio Machado do Aécio e desempenharia na Codemig
papel semelhante ao que Dimas Toledo teria desempenhado em Furnas.
Essa delação não
surpreende quem acompanha veículos de imprensa alternativos e blogs que
não blindam tucanos, pois evidências de malfeitos em torno da obra foram
publicadas há mais de seis anos.
A própria licitação
da Cidade Administrativa deixa suspeitas claras de combinação para
evitar concorrência. Para construir os três prédios, conciliou nove
empreiteiras vencedoras (pelo menos seis delas envolvidas na Lava Jato),
organizadas em três consórcios. Cada consórcio construiu um dos
prédios. Nenhuma empreiteira se repete, nenhuma ganhou a concorrência no
lote da outra.
Causa mais
estranheza a construção de dois prédios iguais (com a mesma técnica
construtiva e os mesmos materiais) ter sido dividida em dois lotes: um
consórcio de três empreiteiras ganhou a construção de um prédio, e outro
consórcio (também de três empreiteiras) ganhou a construção do outro
prédio, e ambos ficaram praticamente igualzinhos.
Ora, se um
consórcio ganhou um dos prédios com preço menor, teria de construir os
dois, pois nada justifica pagar mais caro pelo outro praticamente igual.
Se os preços foram iguais, a caracterização de formação de cartel fica
muito evidente.
A oposição aos
tucanos em Minas chegou a denunciar o fato, blogs publicaram e um
inquérito chegou a ser aberto em Minas. Mas a necessária investigação
fica nas gavetas durante anos sem se aprofundar. De novo o sistema
judiciário se move apenas por atos extremos: ou engavetamento ou
delação.
Deixando Aécio de
lado, lembremos do caso Sanguessuga de 2006. Provas robustas, dezenas de
parlamentares e prefeitos indiciados, parte denunciados. Mas cadê a
condenação? Muitos deputados daquele escândalo estão aí até hoje
reeleitos, inclusive votando no impeachment. Um exemplo recente é o
deputado Nilson Leitão (PSDB-MT). Quando a aceitação da denúncia foi a
julgamento, nem chegou a se tornar réu, pois já estava prescrito.
A política estaria
mais decente, o Congresso Nacional estaria mais limpo, e os governantes
honestos livres de achaques, se o sistema judiciário trocasse o excesso
de prisões preventivas que ao longo do tempo não traz maiores
consequências na redução de crimes, por investigações efetivas e
condenações definitivas, com menos engavetamento. E corruptores e
corruptos teriam mais medo de descumprir a lei se as delações não fossem
tão premiadas como têm sido.
Hoje virou heresia
criticar excessos de delações e prisões preventivas. Mas será que a
opinião pública continuará aplaudindo quando a revista Caras fizer uma
edição sobre a doce vida de delatores milionários presos a suas
tornozeleiras eletrônicas? Isso enquanto o cidadão trabalhador honesto é
condenado a levar uma vida de privações, por políticas de combate a
corrupção tão disfuncionais que levaram Michel Temer ao poder para impor
“austeridade” à classe média e aos mais pobres, enquanto as grandes
fortunas, inclusive com tornozeleiras, continuam não sendo tributadas.
copiado http://www.tijolaco.com.br/blog
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