Conselho Federal de Economistas critica “política econômica” do Governo Temer
A bem dizer, o Brasil não tem uma política econômica. Tem uma
política. Política que, distorcida pela necessidade de legitimação do
presidente que chegou ao poder sem voto e que depende de um “agradar...
Nota de conjuntura sobre
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A bem dizer, o Brasil não tem uma política econômica.
Tem uma política. Política que, distorcida
pela necessidade de legitimação do presidente que chegou ao poder sem
voto e que depende de um “agradar um pouco a todos e muito a alguns, que
são decisivos para o impeachment”, que determina uma confusa e já algo desgastada confusão na economia.
Por isso, vive uma contradição entre as
declarações de intenção de corte de gastos e os gestos de expansão das
despesas, sem que estes sejam focados no que é a causa de nossa penúria
fiscal: a retração da receita por conta da retração da economia e por
uma paralisia total nas soluções tributárias que poderiam, ao menos,
amenizá-las e ajudar a fazer a travessia de saída da crise.
O “tudo está melhorando e tudo vai
melhorar”, embora signifique uma reversão positiva para a economia
diante daquele “o Brasil vai se acabar” com que o país foi bombardeado
nos últimos dois anos, é insuficiente.
Expansão dos gastos correntes sem foco,
contínua retração nos investimentos e um arremedo de política
anitiinflacionária pela via cambial, com um efeito perverso sobre a
indústria, a ameaçar o setor exportador, o único que vem se mostrando
com resultado positivo, tudo isso forma um conjunto que não se vai
resolver com “wishful thinking”, pensamento positivo.
Um exemplo, bem concreto. Hoje, a manchete
da Folha é que a “Indústria dá sinais de retomada após dois anos”.
Vê-se, na matéria, que os “sinais de retomada” são de que ela ficou
igual em maio ao mês de abril e isso graças a um crescimento de 4,6% no
setor automotivo.
No mesmo jornal noticia-se que, em junho, o
setor teve um crescimento de 2,7% sobre maio, mas que o número diário
de veículos emplacados no Brasil caiu, na média diária, de 7.578
veículos, ante os 7.734 de maio. Só o que se sustentava era a produção
para a exportação, que se previa alcançar uma expansão de 20% no ano.
Com um aumento de 10% no preço, causado pela apreciação do real no mês,
será difícil que o alcance.
Tudo isso faz parte das advertências feitas hoje pelos conselheiros do Conselho Federal de Economia, que reproduzo abaixo.
Nota de conjuntura sobre
política macroeconômica brasileira
Passados 50 dias de governo interino,
já é possível identificar os rumos propostos para a superação da grave
crise econômica vivida pelo País, razão pela qual o Conselho Federal de
Economia emite a seguinte apreciação sobre as principais ações de
Política Econômica em curso ou propostas.
1. Política Fiscal: O Cofecon
entende que a busca do equilíbrio fiscal é importante, todavia, o
governo interino, ao estabelecer teto apenas para as despesas correntes
não financeiras, secundariza o principal componente dos gastos públicos,
que são as despesas correntes financeiras (pagamento de juros da dívida
pública), estimadas este ano em 8% do PIB. Ademais, o Cofecon julga
tecnicamente equivocada a indexação desses tetos anuais pela variação do
IPCA, considerando que o deflator implícito do Produto tem evoluído
historicamente em patamar inferior ao IPCA. O mais adequado seria
ancorar o crescimento da despesa à variação do PIB nominal. Igualmente,
dever-se-ia manter fora desse limite as despesas de capital, de modo a
viabilizar um patamar de investimento público adequado ao País.
Por outro lado, na medida em que se
reconhece o engessamento dos gastos públicos com pessoal e custeio, e o
pequeno espaço de redução adicional além dos cortes já efetuados em
2015, a medida acima proposta permitiria o crescimento das despesas em
bases controladas, refletindo a preocupação com a manutenção dos
programas sociais, notadamente nas áreas de educação e saúde.
Não obstante a sinalização do
compromisso de perseguir uma disciplina fiscal o Cofecon entende que a
principal razão do crescimento do déficit primário não foi a elevação
dos gastos, mas a forte contração da receita, em decorrência da retração
econômica e da elevação da elisão e sonegação fiscais.
2. Política Tributária: A
posição do governo interino sobre Política Tributária não traz nenhuma
alteração em relação à do governo anterior. Discute-se a possibilidade
de retorno da CPMF, de redução das isenções e desonerações concedidas e
acena com a necessidade de uma reforma tributária absolutamente genérica
e imprecisa, de fato, sem alterar fundamentalmente a estrutura de
financiamento do Estado.
O Cofecon enfatiza sua compreensão de
que o Brasil precisa de uma mudança em seu modelo tributário,
fortemente regressivo, com 72% da arrecadação de tributos se dando sobre
o consumo (56%) e sobre a renda do trabalho (16%), ficando a tributação
sobre a renda do capital e a riqueza com apenas 28%, na contramão do
restante do mundo. Na média dos países da OCDE, por exemplo, a
tributação sobre a renda do capital representa 67% do total dos tributos
arrecadados, restando apenas 33% sobre consumo e renda do trabalho.
Igual atenção deve ser dada também ao combate à sonegação, em especial
sobre as receitas previdenciárias.
3. Política Monetária:
Há uma clara perspectiva de manutenção da Política Monetária do governo
anterior, na medida em que o Banco Central aponta que aguarda uma
sinalização de admissão da tendência de queda da inflação para iniciar o
processo de redução da taxa básica de juros (Selic), subordinando a
condução da Política Monetária ao gerenciamento de expectativas do
mercado.
O Cofecon reafirma sua posição de que
a tendência já está clara, que os fatores que implicaram na elevação da
taxa de inflação no primeiro semestre de 2015 não se fazem mais
presentes (forte correção dos preços administrados e repasse cambial),
que o quadro recessivo elimina qualquer pressão de demanda e que a taxa
básica de juros, portanto, já devia estar em queda desde o segundo
semestre de 2015.
Apoiamos a importância que tem sido
dada pelo Banco Central ao controle da inflação, mas a política adotada
tem trazido perdas exageradas – em termos de investimento, crescimento,
empregos e elevação da dívida pública –, parcialmente evitáveis. O uso
de um único instrumento, a taxa básica de juros, assim como metas para
inflação com horizonte de apenas um ano-calendário, exigem níveis
extremamente altos daquela taxa. Instrumentos adicionais, bem como a
adoção de um horizonte mais longo para cumprimento das metas, que
facilitasse a acomodação de choques de oferta, permitiriam uma
suavização da política monetária, com a consequente redução das
referidas perdas.
Outro aspecto importante é referente à
discussão que tramita no Congresso Nacional sobre o papel do Banco
Central e a ampliação de sua autonomia. O Banco Central do Brasil tem
como missão institucional a estabilidade do poder de compra da moeda e a
solidez do sistema financeiro, e nos posicionamos que sua missão
deveria visar também o crescimento econômico e a preservação do nível de
emprego, como o fazem bancos centrais de países como os EUA e a
Inglaterra. Quanto à ampliação da autonomia, entendemos que a existente
já é adequada e que a ação do Banco Central tem que estar em sintonia e
coerente com as das demais autoridades econômicas do governo, inclusive
com a coincidência dos períodos de mandatos.
4. Política Cambial: Um dos
aspectos mais preocupantes da atual conjuntura relaciona-se à trajetória
da taxa de câmbio. A rápida valorização observada nas últimas semanas é
funcional para a queda da inflação, mas novamente deverá colocar em
cheque a indústria doméstica, dificultando a reversão do elevado
desemprego.
O regime de câmbio flutuante puro não
se adequa à economia brasileira. Em um cenário de elevadas taxas de
juros reais e queda acentuada do déficit de transações correntes, estão
dadas as condições para uma indesejável sobrevalorização do câmbio, que
favorecerá o retorno de grandes desequilíbrios externos e volatilidade
na taxa de câmbio em futuro não muito distante.
O Cofecon chama a atenção para a
necessidade de praticar uma política cambial ativa, que propicie
melhores condições para a expansão das exportações e da produção
doméstica de bens comercializáveis, em linha com a retomada do
crescimento econômico e a reversão do processo de desindustrialização do
País.
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