Carlos Alberto Fernandes Filgueiras, o empresário que levava Teori
Zavascki para uma de suas propriedades em Parati – ele não tinha apenas
o hotel, mas outras, mais discretas – era réu no Supremo Tribunal...
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Fernando Brito · 19/01/2017
Carlos Alberto Fernandes Filgueiras, o empresário que levava Teori
Zavascki para uma de suas propriedades em Parati – ele não tinha apenas o
hotel, mas outras, mais discretas – era réu no Supremo Tribunal
Federal.
Mês passado seu pedido para trancar uma ação penal por crime ambiental foi negado pelo Ministro Luís Edson Fachin.
É o
habeas corpus 138.523, originário do Rio de Janeiro, impetrado contra decisão do Superior Tribunal de Justiça.
Trechos da decisão:
“2.2. No caso concreto, o paciente é
acusado de causar dano ambiental ao promover ilicitamente edificação na
Ilha das Almas (ou Castelinho), que integra a Área de Preservação
Ambiental (APA) Cairuçu, situada em Paraty/RJ, criada pelo Decreto
Federal 89.242/83.
Em resumo, descreve a denúncia:
“DOS FATOS
As ações delituosas apuradas no presente inquérito policial tiveram
como palco a ILHA DAS ALMAS, ilha costeira pertencente a União inserida
na Área de Proteção Ambiental de Cairuçu – APA CAIRUÇU unidade do
conservação federal de uso sustentável, situada no município de Paraty e
criada pelo Decreto Federal nº 89.242/1983.
O decreto que criou a APA Cairuçu estabeleceu uma Zona de Vida
Silvestre com a finalidade específica de proteger a biota, razão pela
qual proibiu que nestes locais fossem construídas edificações exceto as
destinadas a realização de pesquisa , bem como fosse realizada qualquer
atividade degradadora ou potencialmente causadora de degradação
ambiental
Na ZONA DE VIDA SILVESTRE – ZVS foram incluídos , os manguezais, os
costões e as áreas de topografias mais acidentadas, as ilhas ,
excetuando as Ilhas do Araújo e do Algodão (do sul), o que foi
ratificado pelo Plano de Manejo da unidade, consoante Portaria nº 28,
datada do ano de 2005.
Como se vê, a ILHA DAS ALMAS, também conhecida como Ilha do
Castelinho, encontra-se inserida na Zona de Vida Silvestre, porquanto
integra a parte insular da APA Cairuçu.
Conclui-se, pois, que desde a criado (sic) da APA Cairuçu, que se
deu em 1983, qualquer edificação ou atividade degradadora na ILHA DAS
ALMAS se encontra vedada.
Não obstante as rígidas restrições ambientais previstas no decreto
de criação da APA Cairuçu, constatou-se que o denunciado CARLOS AIBERTO
FERNANDES FILGUEIRAS, na figura de sócio diretor da segunda denunciada
J. FILGUEIRAS EMPREENDIMENTOS E NEGÓCIOS LTDA., de forma livre e
voluntária, com o pleno conhecimento do caráter ilícito de sua conduta,
causou danos diretos e indiretos a referida unidade de conservação
federal, o empreender ações que trouxeram prejuízos significativos a
biota da ILHA DAS AlMAS.
O infortúnio da ilha das Almas o por que não dizer da própria
natureza começou quando J. FILGUEIRAS EMPREENDIMENTOS E NFGOCIOS LTDA.
por intermédio de seu sócio diretor CARLOS AlBERTO FERNANDES FILGUEIRAS,
adquiriu em 29 de agosto de 2002 : de Alains Jean Costilhes e Monique
Costilhes Kaplan, o s direitos sobre a referida ilha costeira (fls.
32/34).
Agindo ao arrepio da lei e á mingua de qualquer licenciamento e/ou
autorização ambiental seja de qualquer esfera do Poder Público os
denunciados deram início a consecução de varias ações ilícitas na Ilha
das Almas as quais passamos a discorrer.
A primeira constatação das ações deletérias ao ecossistema da ilha
das Alma- se deu em 05 de outubro de 2007 quando uma equipe de policiais
federais esteve no local e aferiu algumas irregularidades, dentre as
quais edificação avançando sobre o arco praia praia resultante de
dragagem artificial, alem de dificuldades impostas pelo proprietário
para impedir o acesso público a ilha, como a presença de cães. Por tal
razão, foi determinada a intimação do denunciado CARIOS ALBERTO
FERNANDES FILGUEIRAS para comparecer a DPF/Angra dos Reis e prestar
esclarecimentos (fls. 04). As fotos colacionadas às fls O5/11 bem
retratam as modificações empreendidas na ilha.
Em 14 novembro de 2008, peritos criminais federais estiveram na Ilha
das Almas e elaboraram laudo de exame de meio ambiente. Dentre as
principais constatações, os peritos puderam observar a existência de
construções sobre áreas de preservação permanente (arco praial), a
inserção de vegetação exótica na ilha, a existência de grandes áreas
desmatadas e a descaracterização do cenário paisagístico natural, com
danos a paisagem natural (fls. lt.9/183).
Por sua vez, analistas ambientais da APA Cairuçu estiveram na Ilha
das Almas no dia 25/10/2011, tendo sido confeccionado minucioso parecer
técnico, do qual extraímos os principais excertos (fls 388/403).
(…)
Além de dimensionar as construções e intervenções efetuadas na Ilha
das Almas, assim como os danos ambientais resultantes destas condutas, o
laudo foi capaz de traçar com bastante clareza uma ordem cronológica
das ações antrópicas empreendidas na referida porção insular, tornando
induvidosa a responsabilidade dos denunciados pelo cometimento dos
crimes.
Na imagem de satélite acostada as fls. 389, percebe-se claramente
que. no ano de 1987, o ecossistema da Ilha das Almas encontrava-se
intacto, sem a presença de construções e sem praias naturais nas faces
norte e noroeste.
Na imagem acostada às fls. 390, que retrata o ano de 2001, ainda não são observadas quaisquer construções na Ilha das Almas.
Verifica-se que, no ano de 2002 , havia sido edificado uma pequena
construção com cobertura de sapê , próximo ao local onde atualmente
existe o 3º modulo da construção principal. Não são observadas outras
construções na ilha (fls. 391).
Na imagem que retrata a Ilha das Almas em 18 de fevereiro de 2003,
ou seja, quando os denunciados já haviam adquirido os direitos sobre a
referida ilha, é possível observar a presença da mesma construção
anteriormente relatada. Significa dizer que, ao adquirirem a ilha, não
existiam quaisquer edificações no local, com exceção de uma pequena
construção com cobertura de sapê, com características típicas de uma
moradia caiçara (fls. 392)
Na imagem de satélite acostada as tis. 393, captada no dia 28 de
junho de 2008 , toma-se possível observar a realização de desmatamento
de mata atlântica e alteração nos locais onde, atualmente, existem as
benfeitorias erigidas na ilha. Verifica- se, ainda, a formação
artificial de praias na face norte, noroeste e sudoeste da ilha.
Por fim, na imagem de satélite captada em 27 de janeiro de 2011 ,
finalmente é possível constatar a construção de edificações de grande
porte, com relevante impacto na paisagem natural, e a formação de praias
artificiais nas faces norte, noroeste e sudoeste da ilha (fls. 394)
Desta feita, cumpre assinalar que o denunciado CARLOS ALBERTO
FERNANDES FILGUEIRAS, ao prestar declarações as fls. 259/250, acabou
faltando com a verdade, ao aduzir que “desde a data em que adquiriu o
imóvel não realizou qualquer acréscimo de área construída e que teria
apenas construído um fogão a lenha coberto, localizado entre das duas
casas do imóvel da ilha”.
Com a devida vênia, à época em que os denunciados adquiriram os
direitos sobre a ilha, somente existia construído no local uma pequena
casa. Desta forma, todas as construções atualmente existentes na Ilha
das Almas foram edificadas pelos denunciados após sua aquisição. Nem
mesmo a antiga residência permanece edificada no local, tendo sido,
provavelmente, demolida para dar lugar a uma nova construção com
dimensões e estilo totalmente diferentes.
Alias, tais fatos são confirmados a partir da leitura dos autos da
ação de reintegração de posse nº 1993.041.000044-9, cujas cópias compõe o
apenso 1. Trata-se de ação ajuizada perante a Justiça Estadual de
Paratv, movida pelos proprietários anteriores da Ilha das Almas, em face
de um antigo pescador caiçara que então ocupava a referida ilha.
Dentre os documentos que formaram a ação, encontra-se o auto de
reintegração de posse (fls. 225/227), cujo cumprimento se deu em 22 de
novembro de 2003 e no qual é caracterizado o único imóvel existente na
Ilha das Almas, qual seja, um imóvel que mede 8m x 6m de estuque com
cobertura em eternit, em péssimo estado de conservação.
As fotos colacionadas às fls. 341/351, extraídas de processo apenso
os autos da reintegração de posse, atestam as características do imóvel
edificado à época, na Ilha das Almas.
Provavelmente, a construção acima definida é a mesma retratada nas imagens de satélite do ano de 2002 e 2003.
A partir destas constatações, tem-se a confirmação de que os
denunciados repaginaram o ecossistema da Ilhas das Almas, quando nem
mesmo eram permitidas edificações ou atividades degradadoras no local.
Revestida da mais absoluta ilegalidade e clandestinidade, os
denunciados não só edificaram no local, como também construíram praias
artificiais, o que causou drásticas modificações na biota local.
Desta forma, conclui-se que em data incerta, porem anterior a 28 de
julho de 2008, os denunciados construíram praia artificial na Ilha das
Almas. Não bastasse, também em data incerta, mas compreendida entre o
dia 28 de julho de 2008 e 27 de janeiro de 2011, os denunciados
promoveram diversas edificações no local, em especial as residências de
grande porte.
Se por um lado, os denunciados tornaram a ilha mais aprazível para o
deleite particular, por outro lado, atentaram contra a higidez daquele
frágil local, erigido à Zona de Vida Silvestre, exatamente para se ver
imune a este tipo de atividade antrópica.
2.3. Registro que a defesa questiona, a partir do Decreto Federal
89.242/83, a abrangência da proibição de construção no local. A despeito
da controvérsia acerca do regramento geral da APA, observo que referida
norma é expressa ao dispensar tratamento especial à Zona de Vida
Silvestre, na qual se incluem as ilhas:
“Art. 5º. Fica estabelecida, na APA de Cairuçu, uma Zona de Vida
Silvestre, destinada prioritariamente à salvaguarda da biota ,
abrangendo os manguezais, as ilhas , os costões, as áreas de topografias
mais acidentadas, bem como as mencionadas no artigo 18, da Lei nº
6.938, de 31 de agosto de 1981.
§ 1º Visando à proteção da biota, não serão permitida, na Zona de
Vida Silvestre, a construção de edificações, exceto as destinadas à
realização de pesquisas.”
Além disso, conforme reconhecido pelo impetrante, a Portaria IBAMA
28/2005, que aprovou o Plano de Manejo da APA em comento, regulamentou o
uso da área e a utilização dos respectivos recursos naturais, inclusive
a implantação de estruturas físicas, ratificando as disposições do
decreto de criação. O Plano de Manejo, inclusive, é expresso ao
enunciar:
“Podemos considerar o conjunto das ilhas de Paraty como o setor mais ameaçado e vulnerável da APA de Cairuçu.
As espécies vegetais que colonizam estas ilhas formam quase que um
ecossistema insular específico, composto de cactáceas, bromeliáceas e
orquidáceas cuja disposição protege ninhos e filhotes criando uma
paisagem preciosa e única, de prioridade máxima para proteção.
Outro aspecto importantíssimo é a alta concentração de espécies de
aves e da fauna marinha que encontram nos ambientes insulares condições
ideais e exclusivas para abrigo, alimentação e reprodução.
Embora algumas delas façam parte da Estação Ecológica de Tamoios12, e
todas as 62 ilhas do município de Paraty estejam inseridas na Zona de
Vida Silvestre da APA desde sua criação em 1983, foram contadas 178
edificações nestas ilhas em dezembro de 2001, desde barracos até
mansões, bares, restaurantes e pousadas.
(…)
Considerando que pelo decreto da APA todas as ilhas são de
preservação permanente, com exceção da Ilha do Araújo e Ilha do Algodão,
é lamentável o tipo de ocupação existente, principalmente na ilha do
Breu e a ilha “Kontik”(Duas Irmãs do Sul), ambas totalmente ocupadas por
bar/restaurante de dimensões absolutamente incompatíveis, onde as
construções mal permitem visualizar a ilha.
A paisagem da baia de Paraty, da qual as ilhas e ilhotas são o
expoente máximo, além de sua importância ambiental, é também parte do
“capital” paisagístico e turístico atualmente em processo de
reconhecimento como Patrimônio Mundial pela UNESCO, pertencendo por
tanto a toda a humanidade, e não a indivíduos que constroem verdadeiras
aberrações como caixotes de vidro e lajes ou chalés no estilo suíço em
território pertencente à União. ”
(http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/imgs-unidadescoservacao/apa_cairucur.pdf,
disponível em 23.11.2016, grifei)
Fachin indefere o pedido de trancamento da açãi mas, como em toda decisão monocrática, cabe recurso.
O ministro Teori desconhecia a situação de seu amigo e anfitrião?
PS. A matéria era exclusiva do Tijolaço. Mas meu bom amigo
Fernando Molica, agora na CBN, tem mesmo espírito de repórter e achou. Está lá, muito bem apurado, em parceria com o repórter Leandro Resende. Parabéns, Molica, é bom saber que tem mais gente que fareja as encrencas.
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