Harvard Business Review
O que fazer quando o CV fica manchado por um escândalo?
Tem-se sentido insatisfeito
com o seu emprego e quer mudar. A sua antiga associação a uma
empresa-escândalo não constituirá problema — certo?
Harvard Business Review
O que fazer quando o seu CV fica manchado por uma empresa-escândalo?
Tem-se sentido insatisfeito com o seu emprego e quer mudar. A sua antiga associação a uma empresa-escândalo não constituirá problema — certo?
Imagine que trabalhava para a Volkswagen antes de serem instalados os novos controlos de emissões, e que nunca trabalhou nos departamentos que criaram os programas enganosos. Ultimamente, tem-se sentido insatisfeito com o seu emprego e quer mudar. A sua antiga associação à VW não constituirá problema — certo?
Não seria maravilhoso ser a pessoa que salvou o Lehman Brothers?”
Errado. A nossa pesquisa
demonstra que os executivos que têm no currículo empresas manchadas por
escândalos pagam um preço alto no mercado de trabalho, mesmo que não
estivessem envolvidos no problema.
Como o efeito do escândalo é duradouro, mesmo uma empresa para a qual já deixou de trabalhar há muito tempo pode ter impacto na sua mobilidade profissional, atual e futura.
Em termos gerais, estes executivos são pagos cerca de 4% menos
que os seus congéneres. Dado que essa compensação inicial influencia
fortemente a compensação futura, a diferença pode tornar-se
significativa ao longo de uma carreira.
Como o efeito do escândalo é duradouro, mesmo
uma empresa para a qual já deixou de trabalhar há muito tempo pode ter
impacto na sua mobilidade profissional, atual e futura. Não é possível
controlar esse risco, mas é possível fazer planos para ultrapassar as consequências.
ESTIGMA ORGANIZACIONAL
As empresas manchadas pelo escândalo sofrem
de estigma como se fossem pessoas. As outras organizações podem cortar
relações com elas ou tentar aproveitar-se financeiramente da situação. E
o estigma organizacional é contagioso, não apenas para os empregados
mas por vezes também para outras empresas do mesmo sector.
Por que razão o estigma é tão difícil de combater e tão fácil de transferir? Há três razões.
— O ESTIGMA NEM SEMPRE É RACIONAL.
A psicologia experimental oferece bastantes evidências de que os nossos
juízos de valor relativamente a outras pessoas são muitas vezes
baseados, não tanto numa avaliação racional, mas numa espécie de pensamento mágico que procura evitar o contágio moral ou físico.
— É DIFÍCIL JULGAR COM EXATIDÃO AS OUTRAS PESSOAS.
Os responsáveis pelas contratações usam muitas vezes atalhos
cognitivos, heurística e estereótipos — consciente ou inconscientemente —
para avaliar candidatos. A informação negativa e os estereótipos têm
uma influência desproporcional.
— EXISTEM MOTIVOS PARA SE SER CONSERVADOR.
O estigma organizacional resulta de juízos de valor de múltiplos
grupos, a quem os investigadores chamam “árbitros”. Estes incluem
agências reguladoras, tribunais, jornalistas e a comunidade empresarial,
incluindo empresas de colocação de executivos e empresas que estão a
contratar.
Os árbitros são responsáveis por investigar
os escândalos corporativos e lidar com as suas consequências. E, como a
sua própria credibilidade está em jogo, os árbitros tendem a ser
conservadores.
Então, o que pode ajudar os executivos das empresas envolvidas em escândalos a recuperar?
FATORES DIFERENTES, EFEITOS DIFERENTES
Várias considerações determinam se, e quanto,
um escândalo empresarial vai afetar a carreira de um empregado inocente
ou anterior ao escândalo.
— CULTURA NACIONAL. As
consequências negativas de um escândalo são mais pronunciadas em países
com sistemas reguladores e de governo mais fortes, como os Estados
Unidos e a Dinamarca, onde os executivos das firmas envolvidas em
escândalos chegam a receber uma compensação inferior em 6% aos outros
executivos. Em países com leis mais fracas, como a Rússia, a Espanha, a
Colômbia e o Bahrain, as diferenças de remuneração não são
estatisticamente significativas.
— POSTO DE TRABALHO. Os
prejuízos causados pelos escândalos financeiros são mais pronunciados
entre os profissionais das carreiras financeiras. Executivos que
trabalharam anteriormente nestas empresas recebem uma compensação
inicial quase 10% inferior à de outros executivos financeiros, e a diferença acentua-se ao longo do tempo.
— SENIORIDADE. O fardo de
uma anterior associação a uma empresa envolvida num escândalo pode ser
mais pesado para quem se encontrava em posições seniores, cuja
compensação é mais de 6,5 % inferior à dos executivos sem essa
associação. Para os executivos juniores, os efeitos são variados.
— GÉNERO. As mulheres são mais prejudicadas do que os homens pelo efeito do escândalo: recebem 7% menos,
ao passo que os homens recebem apenas 3% menos. A maior visibilidade
das mulheres líderes pode ser uma justificação. As mulheres de empresas
associadas a escândalos também podem sentir que abordam a mesa das
negociações em posição desvantajosa e não negoceiam a compensação com o
mesmo vigor com que o fariam noutras condições.
— EDUCAÇÃO. Elementos das
empresas envolvidas em escândalos que foram alunos das universidades da
Ivy League receberam ofertas moderadamente inferiores (2%) às dos seus
pares sem empresas problemáticas no currículo, enquanto os licenciados
por outras universidades tinham ofertas quase 4% inferiores.
Os consultores de contratação de executivos sugerem que os seguintes fatores também podem ter influência:
— CULTURA DO SECTOR. Alguns
sectores são mais tolerantes acerca do que merece estigma
organizacional. A bancarrota pode destruir a reputação de uma
instituição financeira mas não de uma empresa de software, pelo menos no
século XXI. Quando um sector completo foi atingido por múltiplos
escândalos ou falências, como aconteceu com a Banca, a reação das
empresas que sobrevivem pode ser diversificada.
— SUBGRUPOS NO INTERIOR DA EMPRESA ESTIGMATIZADA.
Se um escândalo for claramente produto de uma pessoa, grupo ou divisão
da empresa, pode ser mais fácil para os empregados de outras partes da
organização escaparem ao estigma.
— CAPACIDADES DE NICHO. Os
especialistas de nicho têm duas vantagens fundamentais: não são
facilmente substituíveis e — mais importante — têm mais probabilidade de
serem conhecidos pessoais dos responsáveis pelas contratações.
RECUPERAÇÃO
Como se pode sobreviver a um escândalo corporativo? As conclusões da nossa pesquisa sugerem três passos:
— FRONTALIDADE. A
transparência é fundamental. Os recrutadores afirmaram-nos que os
empregados de uma empresa envolvida em escândalo têm de ser os primeiros
a levantar o assunto.
— REPUTAÇÃO. A melhor coisa a
fazer é “tomar de empréstimo” a reputação e legitimidade de outra
pessoa. Os gestores que têm amplas redes de conhecimentos externas, ou
que estão em campos que enfatizam as reputações individuais, podem
conseguir essa cobertura através de relações existentes.
Para muitos outros, as empresas de colocação
de executivos podem ser ao mesmo tempo a referência e o patrocinador.
São contratadas por outras empresas e não investirão numa grande análise
de currículo a não ser que já acreditem na inocência e no valor do
candidato no mercado de trabalho.
— REABILITAÇÃO. Depois de
provar a sua inocência e estabelecer relações com pessoas que possam
atestar o seu caráter, o passo final poderá ser aceitar um “emprego de
reabilitação”. O objetivo deste, represente ou não um passo atrás em
termos de compensação ou responsabilidade, é criar uma história
persuasiva que possa competir com a narrativa do escândalo. O objetivo é
que este emprego de reabilitação seja a primeira informação que as
pessoas associam ao profissional.
As táticas para sobreviver a um escândalo
organizacional dependem de múltiplos fatores, mas a estratégia básica é a
mesma: colocar os factos em cima da mesa, tomar de empréstimo o bom
nome de outra pessoa e aceitar um emprego que lhe permita voltar a dar
provas. O efeito do escândalo nem sempre pode ser previsto ou
controlado, mas é possível sobreviver-lhe.
Resumo da Ideia
A CONCLUSÃO
Executivos com empresas manchadas por
escândalos nos seus currículos pagam uma fatura maior no mercado de
trabalho — mesmo que não tenham tido nada a ver com o comportamento
incorreto.
A RAZÃO
O estigma causado pelo escândalo tem grande
influência nas decisões de contratação porque é difícil julgar os outros
com exatidão e porque os responsáveis pelas contratações tendem a ser
conservadores.
A RESPOSTA
Se tiver uma empresa manchada pelo escândalo
no seu currículo, deve lidar com o assunto com frontalidade, estabelecer
relações com pessoas que possam atestar o seu caráter e considerar a
hipótese de aceitar um “emprego de reabilitação”.
Começar a trabalhar numa “empresa-escândalo”
Quando as empresas estigmatizadas contratam
gestores, o equilíbrio de poder inclina-se para o lado do indivíduo.
Aqueles que pretendam juntar-se a uma empresa envolvida num escândalo,
podem receber um bónus por o fazerem.
“Quando as empresas-escândalo sobrevivem”, diz-nos um headhunter,
“as pessoas que entram para os seus quadros são compensadas mais
positivamente do que as que estavam lá antes”. Contudo, a compensação é
uma solução rápida e os consultores procurarão, provavelmente,
candidatos cujas capacidades ou experiência os tornem adequados a estas
circunstâncias particulares.
Aceitar um emprego numa empresa-escândalo pode ser uma atitude proveitosa num estágio inicial ou final da carreira de líder.
“As empresas que passaram por algum género de
publicidade negativa têm de, sem dúvida, realizar um pouco de
remuneração de risco”, reconheceu um recrutador, “embora não se trate
apenas de “olhem, vocês têm de pagar 40% mais. Digamos que eu conheço
alguém que já viveu na Europa e sua família quer muito voltar para lá;
isso pode ser usado a nosso favor”.
Um recrutador salientou que aceitar um emprego numa empresa-escândalo
pode ser uma atitude proveitosa num estágio inicial ou final da
carreira de líder — ou seja, alguém que funciona a curto prazo e tem um
alto nível de tolerância ao risco.
“Alguns jovens talentosos e muito agressivos
podem aceitar um emprego destes por quererem uma oportunidade de ser CEO
— se correr bem, parecerão fantásticos. Se correr mal, a culpa não é
deles, pelo que poderão recuperar — ou, mais provavelmente, alguém numa
fase final de carreira ou cuja empresa tenha sido vendida, não havendo
portanto grande risco pessoal.
Alguns candidatos podem sentir-se atraídos
pelo desafio de gerirem uma reviravolta. Um recrutador falou da “mistura
de ego e humildade” que leva um executivo a entrar para uma firma
envolvida em escândalo: “É um reconhecimento da extensão do problema e
da necessidade de auditoria muito superior ao habitual. E é o desejo,
por parte da empresa que contrata, de ter abertura para resolver a
totalidade do problema. A pessoa que o fizer, será marcada como
especial. Não seria maravilhoso ser a pessoa que salvou o Lehman Brothers?”
Sobre a pesquisa
Usando dados de uma empresa global de
colocação de executivos, juntamente com historiais de carreira
pormenorizados, analisámos 2034 mudanças de emprego de executivos
através de múltiplas funções, sectores, níveis de senioridade e
geografias, entre 2004 e 2011.
Para cada uma das mudanças, registámos a
geografia, o título profissional, o sector, os nomes das empresas, os
atributos individuais, como o género e a instrução, e os níveis de
compensação das posições anteriores e da colocação. Cerca de metade das
colocações foram em posições diferentes de executivos de alto nível,
presidentes ou vice-presidentes.
Os empregos prévios e as colocações
posteriores tinham uma compensação média total de 294 mil e 331 mil
dólares, respetivamente. Em média, os executivos tinham quase 19 anos de
experiência profissional. Dos executivos colocados, 18% eram mulheres
(uma proporção notavelmente superior à de conjuntos de dados apenas para
executivos de alto nível).
Dos executivos estudados, 18% tinham
trabalhado numa empresa marcada por declarações de rendimentos
enganosas, descobertas quer pelo órgão de auditoria do governo americano
(GAO) quer pelos Accounting and Auditing Enforcement Releases (AAER)
da Comissão de Valores Mobiliários (SEC). A base de dados do GAO
regista apenas revisões de declarações enquanto a dos AAER regista ações
executórias da SEC que foram identificadas com uma designação AAER. O
emprego destes executivos, claramente, é anterior às condutas
fraudulentas e eles nunca estiveram legalmente implicados num escândalo.
Medimos o impacto da compensação total do
primeiro ano quando um executivo com uma empresa-escândalo no seu
currículo era colocado por uma empresa de colocação de executivos. Cada
executivo foi comparado com a compensação do ano anterior na empresa
anterior.
copiado http://www.dn.pt
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