Prepotência e orgulho ferido ajudam a revelar o arbítrio da Lava Jato
m Marcelo Auler
No sábado (24/09), o jornalista André Singer foi direto no ponto que interessa, na sua coluna na Folha de S. Paulo – É hora de barrar o arbítrio:“O juiz Sergio Moro colocou nesta quinta (22/09) a gota d’água no copo da escalada de arbítrio em curso no país. Curiosamente, o fez ao liberar, por razões humanitárias, o ex-ministro Guido Mantega depois de algumas horas na Polícia Federal de São Paulo, e não ao mandá-lo para a prisão por cinco dias ou dez dias, como havia decidido de início. Pois, se era possível soltá-lo, não havia necessidade de prendê-lo, e a arbitrariedade da detenção ficou evidente.”
Na verdade, no que pese o constrangimento, dor de cabeça e aborrecimento – talvez nenhuma dessas seja a expressão exata para definir o que ele passou – impostos a Guido Mantega, a sua prisão serviu para demonstrar como a Força Tarefa da Lava Jato age desde o início, em março de 2014. E a história se repete no episódio da prisão de Antonio Palocci, nesta segunda-feira (26/09), que por nós é abordada na postagem O viés político da Lava Jato, cada vez mais escancarado.
Sem freios – O mais grave, porém, é que todos estes fatos demonstram os abusos de uma operação aplaudida pela sociedade enquanto não se vislumbrava nela nenhum fim eleitoral. Tais desvirtuamentos só acontecem por não funcionar o sistema de “checks and balances” (freios e contrapesos) entre os órgãos dos três poderes – Polícia Federal, Ministério Público Federal e o Judiciário – envolvidos na persecução penal. Tal e qual o subprocurador-geral da República, Eugênio Aragão, falou no artigo publicado aqui no blog, sexta-feira (23/09): Lula e Genoino: vítimas do Castelo Teórico do MPF.
Uma prova dessa falta de freios e contrapesos veio do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) ao admitir, por 13 votos a um, que “a operação “Lava Jato” não precisa seguir as regras dos processos comuns”, como noticiou a revista eletrônica Consultor Jurídico. Ou seja, os desembargadores deram um cheque em branco à primeira instância. Leia mais
Prepotência e orgulho ferido ajudam a revelar o arbítrio da Lava Jato
m Marcelo Auler
No sábado (24/09), o jornalista André Singer foi direto no ponto que interessa, na sua coluna na Folha de S. Paulo – É hora de barrar o arbítrio:“O juiz Sergio Moro colocou nesta quinta (22/09) a gota d’água no copo da escalada de arbítrio em curso no país. Curiosamente, o fez ao liberar, por razões humanitárias, o ex-ministro Guido Mantega depois de algumas horas na Polícia Federal de São Paulo, e não ao mandá-lo para a prisão por cinco dias ou dez dias, como havia decidido de início. Pois, se era possível soltá-lo, não havia necessidade de prendê-lo, e a arbitrariedade da detenção ficou evidente.”
Na verdade, no que pese o constrangimento, dor de cabeça e aborrecimento – talvez nenhuma dessas seja a expressão exata para definir o que ele passou – impostos a Guido Mantega, a sua prisão serviu para demonstrar como a Força Tarefa da Lava Jato age desde o início, em março de 2014. E a história se repete no episódio da prisão de Antonio Palocci, nesta segunda-feira (26/09), que por nós é abordada na postagem O viés político da Lava Jato, cada vez mais escancarado.
Sem freios – O mais grave, porém, é que todos estes fatos demonstram os abusos de uma operação aplaudida pela sociedade enquanto não se vislumbrava nela nenhum fim eleitoral. Tais desvirtuamentos só acontecem por não funcionar o sistema de “checks and balances” (freios e contrapesos) entre os órgãos dos três poderes – Polícia Federal, Ministério Público Federal e o Judiciário – envolvidos na persecução penal. Tal e qual o subprocurador-geral da República, Eugênio Aragão, falou no artigo publicado aqui no blog, sexta-feira (23/09): Lula e Genoino: vítimas do Castelo Teórico do MPF.
Uma prova dessa falta de freios e contrapesos veio do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) ao admitir, por 13 votos a um, que “a operação “Lava Jato” não precisa seguir as regras dos processos comuns”, como noticiou a revista eletrônica Consultor Jurídico. Ou seja, os desembargadores deram um cheque em branco à primeira instância.
A prisão de Mantega, em poucas horas,
ajudou a desmontar o discurso do procurador Deltan Dallagnol, na
entrevista em que anunciou a denúncia contra Luiz Inácio Lula da Silva. A
mesma na qual eles admitiram que “não temos prova, mas temos
convicção”. Logo no início, um pouco depois do segundo minuto da
coletiva, o procurador que chefia a Força Tarefa da Lava Jato garantiu
que “as prisões estão sendo de modo parcimonioso”. Pode-se dizer que foi
isso o que aconteceu com Mantega?
Aliás, será Dallagnol o jovem inquisidor de que fala Marcio Tavares D’Amaral na postagem “O que aconteceu??”, espanta-se o jovem Inquisidor”. Quem será?
O episódio no Hospital Albert Einstein,
onde o ex-ministro acompanhava a mulher, Eliane Berger, que passa por
tratamento contra um câncer, o que é público, mas a Força Tarefa da Lava
Jato diz que desconhecia, esconde desentendimentos nos bastidores da
“República de Curitiba”.
Esqueceram de mim –
Os pedidos de prisões apresentados pelo Ministério Publico Federal em
agosto foram atendido, na sua quase totalidade (ele rejeitou dois) por
Moro, no dia 16 daquele mês. Como a Consultor Jurídico divulgou – Moro esqueceu de Mantega em primeira decisão que determinou prisão. No
seu primeiro despacho autorizando as prisões não constava o nome do
ex-ministro, apenas dos outros sete alvos: Luiz Cláudio Machado Ribeiro,
Ruben Maciel da Cossta Val, Luiz Eduardo Carneiro, Danilo Souza
Baptista, Francisco Corrales Kindelan, Luiz Eduardo Neto Tachard e Júlio
César Oliveira Silva.
Orgulho ferido -
Não foi nada grave, uma distração. O chamado erro material no
inquérito. Prontamente consertado. Distração maior, ou talvez nem tenha
sido realmente distração, foi a polícia federal não participar da
discussão sobre esta fase da Operação. A Força Tarefa, pelo jeito,
funcionou a meia-bomba.Da decisão sobre as prisões da 34ª fase da Lava Jato, delegados e agentes da polícia federal foram alijados. Souberam delas para cumprir os mandados de busca e apreensão e os de prisões. Sentiram-se escanteados. Com o orgulho ferido.
Com isso, ninguém tratou de monitorar/acompanhar os alvos. Não foi incompetência, pois os federais cansaram de fazê-lo nas fases anteriores, tal como em outras operações. Basta lembrar que, no sábado, 15 de março de 2014, dois dias antes de oficialmente deflagrada a Lava Jato, prenderam Nelma Kodama ao tentar embarcar para Milão com dinheiro escondido na calcinha. A diferença é que a ela monitoram, com escuta telefônica e tudo mais. Com Mantega nada foi feito. Pelo jeito, nem o noticiário acompanharam.
É uma praxe da polícia, desde que as grandes operações foram criadas na gestão de Paulo Lacerda, diretor-geral, e Zulmar Pimentel, diretor-executivo, acompanhar previamente os chamados “alvos”. Visa, justamente evitar surpresa. Aliás, independe de uma operação, basta ter um mandado de prisão a cumprir que a praxe deve ser adotada, lembrou um experiente delegado federal que nos orienta anonimamente.
“Sempre que existe uma ordem de prisão a ser cumprida, os policiais realizam levantamento prévio de endereços onde pode estar residindo. Ainda mais em se tratando de um ex-ministro. No caso saberiam as circunstâncias de saúde dele ou da esposa”.
Só que, com Mantega, não fizeram. Como a polícia não participou da decisão, há, dentro da própria superintendência do DPF em Curitiba, quem fale que houve corpo mole. Algo do tipo, “Ah, o MPF decidiu? então ele que cuide”.
Fica difícil acreditar que não soubessem que a esposa do ex-ministro estava em tratamento. Se for verdade, é sinal de que nem acompanharam o noticiário, ainda que fosse pelo Face Book, que repetiu exaustivamente o vídeo acima, no qual ele parece sendo destratado na lanchonete do Albert Einstein, em 19 de fevereiro.
Escolha do momento - O fato de os mandados estarem prontos e assinados desde 16 de agosto e a operação só ter sido executada em 22 de setembro, aumenta as suspeitas de que o juiz Sérgio Moro, com o controle efetivo de toda a operação – o que deveria ser da Polícia Federal e do MPF – pode estar definindo o momento adequado de deflagrar cada uma das suas fases. Dificilmente esta demora ocorreu sem o seu conhecimento/consentimento.
Na entrevista do Power Point e do “não temos prova, mas convicção”, responsabilizaram os Jogos Olímpicos e Para-olímpicos, no Rio, pela demora na deflagração da 34ª fase. O efetivo do DPF estava desfalcado, alegaram.
Foi conversa para boi dormir. Basta visitar o site da Polícia Federal que se verifica a quantidade de operações realizadas a parti de 16 de agosto. Entre elas a Operação Greenfield, no dia 5 de setembro, voltada para combater fraudes junto a fundos de pensão expressivos. Ela ocorreu em sete estados e no Distrito Federal, envolvendo 560 policiais federais, além de 12 inspetores e quatro procuradores federais da Comissão de Valores Mobiliários, oito 8 auditores da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC) e sete procuradores da República.
Ainda é possível listar: Operação Contumácia II (06/09, PA); Operação Caldeirão (09/09, GO e DF); Operação Véu Protetor (09/09, MG, DF e SC); Operação Manager (12/09, PE); Operação Clístenes (13/09, RS, DF, PI e GO); Operação Nenhures (14/09, MG e BA); Operação Nenhures (14/09, MG e BA); Operação Lupus Agnus (14/09, AM); Operação Fratello (14/09, CE); Operação SALUS (15/09, ES); Operação Acrônimo (15/09 SP, RJ, MG e DF).
Logo, não foi por falta de efetivo. Até porque a 34ª fase da Lava Jato mobilizou 180 policiais federais (menos de um terço dos empregados na Operação Greenfield) e 30 auditores fiscais no cumprimento de 50 ordens judiciais – 33 mandados de busca e apreensão, nove mandados de prisão temporária e oito mandados de condução coercitiva – em cinco estados (SP, RJ, RS, MG, BA) e o Distrito Federal. Soa muito mais razoável a opção pela escolha do momento político adequado.
Sendo assim, é possível suspeitar que ela – a demora – tenha razões diferentes das alegadas oficialmente. Vale lembrar que, quanto mais próximo de uma eleição a misancene pode render melhores frutos. Eleitorais, é claro. Porque o resultado prático para a investigação será o mesmo. Isso pode também explicar a prisão de Palocci a seis dias do pleito municipal (Leia matéria acima).
De alguém que conhece bem o funcionamento da “República de Curitiba” o blog ouviu, ainda na semana passada, antes de o ministro da Justiça antecipar a 35ª fase:
“O Moro têm um cronograma da operação mais ou menos pronto. Eles não vão deixar a operação sair da mídia. Ele não vai deixar a peteca cair. É o Moro que impõe as datas prováveis da deflagração da operação. Não duvido que eles já tenham os mandados da próximas fases”.
A prepotência revelou o “esquema” – A confusão que a fonte faz quando usa o singular (ele) e o plural (eles) é a mesma feita em público, que tem no juiz Moro o chefe da Operação quando, na verdade, ele deveria ocupar um papel à parte, de distanciamento. Tal fato, inclusive, leva as defesas dos réus, questionarem a sua isenção, como determina a lei.
Parecia que os desacertos da prisão de Mantega, a enxurrada de críticas à desastrada entrevista de Dallagnol, e à própria denúncia contra Lula na base do “não temos provas, mas temos convicções” levariam os operadores da Lava Jato e o próprio juiz a reverem os planos. Agirem com mais cautelas. Mas, a prisão de Pallocci mostrou que eles não se incomodaram com as críticas e nem com o anúncio antecipado do ministro da Justiça.
Esses últimos episódios da Lava Jato demonstram a prepotência de seus operadores. Alimentados desde março de 2014 pelo apoio conquistado junto à opinião pública, via vazamentos de informações e ajuda explícita da chamada mídia tradicional, juiz, procuradores e delegados federais parecem se sobrepor a qualquer fator que tente barrar seus objetivos. Ou mesmo colocá-los em dúvida. A recente decisão do TRF-4, relatada acima, é um exemplo de que eles têm como certo que conquistaram o espaço que queriam.
Só que, a alto confiança gerou desgastes
com os quais não contavam. Agora, some-se ainda a irresponsabilidade do
ministro da Justiça. Se o episódio da condução coercitiva de Lula, em 4
de março, assim como a divulgação das conversas telefônicas dele com a
presidente Dilma Rousseff, pareciam superados, até porque o máximo que
ele rendeu foi um ~”puxão de orelha”- nem tão forte assim – do ministro
Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo, no juiz Moro. E ficou
tudo por isso mesmo, como se uma violação de competência não tivesse
ocorrido.
Estes episódios, porém, voltaram à tona com as recentes
“barbeiragens” cometidas, notadamente a entrevista de Dallagnol. Quem,
em sã consciência, imaginaria alguns meses atrás que os procuradores da
Lava Jato tivessem que vir a público, por meio de nota oficial, tentar
desmentir reportagens de jornais até então aliados?Tudo ainda por conta da entrevista em que sobressaiu o “não temos prova, mas termos convicção”. Parte da imprensa foi checar as informações e o que revelou não agradou aos operadores da Força Tarefa. O desmentido, porém, foi para a Folha de S. Paulo, edição do domingo, dia 18/09. Em matéria assinada justamente pelo repórter que sempre visto circulando com desenvoltura na Superintendência do DPF do Paraná, Mário César Carvalho, acusou procuradores do uso na denúncia contra Lula de uma delação premiada cancelada.
Por que razão não contestaram a brilhante reportagem de Cíntia Alves, do Jornal GGN, que demonstrou a falta de embasamento do que os procuradores denunciaram com o que consta nos depoimentos das testemunhas ouvidas pelos investigadores, Esta tudo lá, na reportagem É provável, ouvi o boato, não comprou mas é dono: as pérolas da Lava Jato no caso triplex
No episódio Mantega ficou evidente, como mostrou Singer, que a prisão era totalmente desnecessária. Afinal, aos justificá-la, o juiz alegou:
1 – Risco à investigação e à instrução: justificando que os réus para os quais que determinou as prisões poderiam “falsificar documentos para acobertar crimes” o que “coloca em risco a integridade da instrução e investigação, havendo risco da produção de novos documentos falsos para conferir suporte a contratos simulados ou superfaturados”
2 – Risco à ordem pública: “O contexto não é do envolvimento episódico em crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro, mas de atuação profissional, longa e sofisticada, no pagamento de propinas em contratos públicos, com utilização de expedientes de ocultação e dissimulação relativamente complexos. inclusive com o emprego de contas em nome de off-shores no exterior para repasse de propinas, utilização de empresas de fachadas e simulação de contratos de prestação de serviços simulados ou superfaturados”.
Em ambos os casos soa estranha a
justificativa ao se levar em conta que Mantega já não estava no governo
ou em qualquer órgão público desde janeiro de 2015.
Moro também sugeriu que Mantega pudesse
atrapalhar a busca e apreensão,k justificando a prisão como medida para
“prevenir qualquer afetação das provas, como produção de documentos
falsos, ou supressão de documentos”. E aí citou o exemplo os familiares
de Paulo Roberto Costa e da doleira Nelma Kodama, que teriam
desaparecido com papeis depois da prisão de ambos.
Pelo relato feito pelo próprio Moro,
Mantega é acusado de, em dezembro de 2012, ter solicitado a Eike
Batista, recursos para saldar dívidas de campanha do PT. Em seguida ele
foi procurado por Monica Regina Cunha Moura, as esposa do publicitário
João Santana.
Foram repassados, segundo o próprio Eike,
USD 2,350 milhões em uma conta no exterior que beneficiava um off shore
de propriedade de Monica e João Santana. Quando questionado pelo
Ministério Público Federal, Eike – que esteve no MPF por conta própria,
revelando os fatos e apresentando documentos – “negou que o depósito de
USD 2,350 milhões tivesse relação com o contrato obtido pelo Consórcio
Integra (N da R.: formado pela Mendes Júnior e OSX, de Eike), tratando-se de doação eleitoral”, relata o próprio Moro na decisão que determinou as prisões.
É óbvio que nenhum empresário fará doação a partido político sem
qualquer interesse. Muito menos, milhões de dólares. Ninguém pode, de
forma peremptória, afastar a possibilidade de que a doação tenha relação
com este ou aquele contrato. Isto, por óbvio, as investigações, com
cruzamento de dados e de datas, terão que levantar.A questão, porém, é o motivo real que justificasse a prisão de Mantega se a ele foi atribuído um pedido e não há mais nenhuma referencia de que tenha participado da decisão de facilitar contrato do consórcio Integra com a Petrobras. Logo, surge pergunta: que documentos ele poderia querer fraudar e/ou esconder, a esta altura da situação? Qual o risco que sua liberdade provocaria à opinião pública? como ele, que estava no hospital – ou mesmo se estivesse em casa – poderia, na frente dos policiais federais, desaparecer com provas?
O que transparece, principalmente como disse Singer, pela rapidez que Moro – por uma questão humanitária, não prevista nos Códigos de Processo ou Penal – reviu sua decisão, que na verdade o objetivo dela era outro. O mais provável, constranger o ex- ministro, uma vez que não se imagina que tentassem pressioná-lo para delações premiadas. Mas, o certo é que, independentemente do motivo, o que sobressaiu foi o arbítrio da decisão, denunciado pela forma como ela foi revista.
Tal fato, porém, decorreu sem dúvida da prepotência de uns, que acham que podem prender sem respaldo legal, como forma de pressão, e o orgulho ferido de outros, que sequer levantaram a real situação do alvo. Prejudicaram Mantega, sem dúvida, mas também prejudicaram a própria imagem do trabalho que fazem. Que já não é tão boa como era antes.
copiado http://www.marceloauler.com.br/
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