Dilma: “O primeiro que vou fazer é restabelecer o direito de todos”
Emir SaderReencontrei a Dilma pela primeira vez desde que o golpe a afastou da presidência. Pudemos conversar ontem, quarta-feira 27, por duas horas, no Palácio da Alvorada, a sós, conversa solta, sobre passado, presente e futuro. Quando lhe perguntei qual será a primeira coisa que ela vai fazer voltando a assumir plenamente a Presidência da Republica, e ela não hesitou:
"Vou restabelecer os direitos de todos, que estão sendo tirados". É a decisão coerente com suas declarações nas distintas manifestações e entrevistas em que ela tem participado.
Quando lhe perguntei como ela se sente mais discriminada: como mulher, como esquerdista ou como mulher não casada, cuja família é composta por ela, a filha e os netos, ela tampouco vacilou: "Como mulher, embora os outros aspectos possam acentuar essa discriminação".
Esse aspecto se reflete mais diretamente no grande apoio político, com enorme carga afetiva, que ela tem recebido do povo em geral, mas das mulheres em particular, e das mulheres jovens, em especial, o que a tem emocionado muito.
Eu conheci a Dilma ainda na clandestinidade, nos anos 1960, na Polop, onde militávamos juntos. Era uma primeira imagem dela, jovem, super militante, hiper dinâmica, característica que ela nunca deixou de ter.
Só voltei a retomar contato com ela já como secretária do governo do PT, no Rio Grande do Sul, na época dos Fórum Social Mundial. Não é que fosse outra, mas tinha outra fisionomia, como provavelmente também eu. Era uma super competente secretária, super profissional executiva, característica que ela incorporou para sempre.
Depois ja foi cruzar com a Dilma como ministra do Lula, coordenadora do governo como chefe da Casa Civil, colocando em prática toda sua competência e exigência no cumprimento das tarefas, aquelas qualidades que a levaram a ser escolhida pelo Lula para sucedê-lo.
Ai voltei a cruzar mais vezes com ela, naquele momento de ter sido escolhida, mas ainda uma incógnita se sua candidatura vingaria ou não. Depois foi a campanha, a virada sensacional, incluindo o ato com os intelectuais e artistas que eu organizei no Teatro Casa Grande, como um dos momentos que marcariam aquela virada.
Nos últimos meses foram muitos os encontros, pela mobilização popular contra o golpe, sempre marcados pela tensão que a crise tem provocado em todos nós. Não sabia como a encontraria agora.
Ela chegou, simpática como sempre, nos acomodamos na sala em que ela recebe as pessoas e logo retomamos a conversa pelo passado, que necessariamente passa pelas referências a meu irmão, o Eder, com quem ela recordava os pontos de encontro que teve, em Pinheiros, quando ele lhe passou um pacote de documentos e depois os discutiu com ela.
Falamos de algumas características da Polop, da referencia teórica central à Rosa Luxemburgo, da admiração que mantivemos por ela, e da forma terrível em que ela morreu – pelas mãos da polícia da social democracia alemã.
A conversa se aproximou do presente, com a América Latina como tema recorrente – Cristina, Pepe Mujica, Rafael Correa, Evo Morales, Hugo Chavez, Maduro -, mas também dos Brics. Ela ressaltou a ausência sumamente significativa dos presidentes dos Brics, o principal eixo de rearticulação da geopolítica mundial, em que seu governo nos incluiu. Dilma expressou a relação muito próxima que ela mantem com o Putin, assim como com o governo da China. Fica claro que, voltando à Presidência, vai ser um objetivo central do seu governo.
Dilma faz uma lista das principais atrocidades que o governo interino está cometendo, a que se somam todo dia iniciativas negativas novas, como a retirada do FGTS da Caixa Econômica para dar mais um presente para os bancos privados.
A principal dimensão que a Dilma incorporou na crise, foi a prática constante da palavra – nos discursos, nas entrevistas, nas reuniões públicas com representantes de movimentos, com parlamentares e com intelectuais e artistas. Ela, que era, sobretudo, uma dirigente que coloca em prática os programas do governo, se deu conta do papel indispensável do convencimento das palavras, da reiteração dos argumentos.
Uma Dilma otimista, bem disposta, pronta para retomar a Presidência do Brasil, consciente de que a derrota desta iniciativa do golpe não terminará a ofensiva da direita contra ela. Mas que as próximas ofensivas serão enfrentadas em condições muito menos favoráveis para a direita e com a democracia brasileira muito mais forte.
A referência permanente, mais importante, em quem também para ela, repousam as maiores esperanças sobre o futuro do pais, é o Lula, o eterno presidente e líder de todos
Terminamos a conversa, depois dela folhear o livro e inteirar-se dos seus temas e autores, quando chegou a hora dela sair para acupuntura. Eu saí muito contente do encontro e da longa conversa, mais confiante ainda de que derrotaremos o golpe.
copiado http://www.brasil247.com/pt/
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