Jerusalém
E se encontrassem o corpo de Jesus? "Podia abalar fé de milhões"
Equipa de cientistas anda a escavar no Santo Sepulcro. A descoberta de um corpo podia "abalar a fé de milhões"
A
pretexto de trabalhos de restauro, uma equipa de cientistas da National
Geographic está a revelar, pela primeira vez em séculos, a superfície
do Santo Sepulcro, localizado no interior da igreja com o mesmo nome, na
cidade velha de Jerusalém. É o local onde se acredita que tenha sido
depositado o corpo de Jesus Cristo depois de ter sido crucificado, há
mais de dois mil anos, e de onde - acreditam os cristãos - ressuscitou
para a vida eterna.
Na imprensa
internacional cria-se a expectativa e lança-se a pergunta crucial: e se
encontrassem o corpo de Jesus Cristo no interior do túmulo? Estaria o
Cristianismo em causa?
A eventual
descoberta dos restos mortais de Cristo podia "abalar a fé de milhões de
pessoas", reconhece o padre e teólogo Carreira das Neves, professor
jubilado da Universidade Católica. "Não abalaria a minha fé, mesmo que
aparecessem os ossos de Jesus. Para mim, a Ressurreição está acima da
ideia de reanimação do corpo. Mas decerto abalaria a fé de milhões de
cristãos porque a posição oficial da Igreja é a de que a Ressurreição é a
reanimação do corpo, da matéria".
O
túmulo de Jesus Cristo tem estado coberto com uma placa de mármore pelo
menos desde 1555, e, muito provavelmente, alguns séculos antes disso. "O
mármore que cobre a sepultura foi puxado e fomos surpreendidos pela
quantidade de material que ainda existe por debaixo", afirmou, à revista
National Geographic, o arqueólogo Fredrik Hiebert, integrado na equipa
de restauro. De acordo com a tradição cristã, o corpo de Jesus foi
depositado numa "cama sepulcral" talhada de lado, numa caverna de pedra
calcária, após a sua crucificação pelos romanos no ano 30 ou 33.
A
fé cristã assenta no fundamento de que Cristo ressuscitou depois de
morto. As mulheres que vieram velar o seu corpo três dias depois do
enterro declararam que não havia restos mortais no local.
Não haveria como identificar
O
padre e teólogo Anselmo Borges elenca em três pontos as suas dúvidas
quanto à possibilidade de se encontrarem as ossadas de Jesus no interior
do túmulo. "Ponto um, mesmo que encontrassem os restos mortais de
Cristo, como é que se ia proceder à identificação de que se tratava de
Jesus? Não haveria qualquer base de ADN para comparar". Depois, tendo
Cristo sido crucificado ao lado de criminosos comuns da época, "não é
impossível que Jesus tenha sido atirado para uma vala comum".
Finalmente, em terceiro lugar, "a fé cristã não seria afetada porque o
núcleo do cristianismo é a vida espiritual. Aquilo em que acreditamos,
quando falamos em ressurreição, não é na reanimação do cadáver". Anselmo
Borges reconhece, no entanto, que os primeiros cristãos, para darem
"realismo" à sua fé, materializaram o conceito de ressurreição. "Mas o
núcleo da fé cristã é que o ser humano não morre para o nada mas para a
plenitude de uma vida em Deus".
O padre
Carreira das Neves frisa a importância de escavações arqueológicas
anteriores, que serviram para "descobrir o local da morte de Jesus". O
Calvário "era um cemitério de crucificados. Alguns diziam que Cristo não
tinha sido enterrado naquele local mas as grandes descobertas
arqueológicas de há 70 anos atestaram que foi ali".
Para
o teólogo Carreira das Neves, que se deslocou muitas vezes ao Santo
Sepulcro, a eventual descoberta de um corpo nunca atingiria a sua fé.
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